O que vale para um, não vale para outro? Por que casos idênticos tiveram decisões completamente opostas no STF? Após a Suprema Corte manter a nomeação de Moreira Franco, advogados de Lula pedem julgamento colegiado por reparação ao dano histórico
Após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, manter a nomeação de Moreira Franco, acusado de receber R$ 3 milhões em propinas em 2014 e um dos principais alvos das delações da Odebrecht, os advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediram à Corte um julgamento colegiado por reparação ao dano histórico.
Isso porque o pedido de barrar o posto que dá ao aliado de Michel Temer foro privilegiado tinha como base o caso do ex-presidente Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff. Durante o seu governo, em 18 de março de 2016, Gilmar Mendes decidiu que Lula não poderia ser ministro de Dilma na Casa Civil, porque significava, segundo ele, uma tentativa de obstruir a Operação Lava Jato.
A interpretação de Gilmar foi de que, com o avanço das medidas determinadas desde a primeira instância, na Vara Federal de Curitiba, recaindo cada dia mais sobre Lula, a nomeação serviria para conceder a ele foro privilegiado e, portanto, dentro da equipe ministerial teria seus processos julgados pela última instância, o STF.
Moreira Franco foi acusado de receber R$ 4 milhões de propinas, em 2014, quando era ministro da Aviação Civil. A informação faz parte de depoimento do ex-superintendente da Odebrecht, Claudio Melo Filho.
A nomeação por Temer coincide com o avanço das delações dos 77 executivos e ex-funcionários da Odebrecht no STF, já homologadas por Cármen Lúcia e nas mãos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para solicitar medidas, como buscas e apreensões e prisões preventivas.
Entretanto, Celso de Mello considerou que os dois mandados de segurança protocolados pela Rede Sustentabilidade e pelo PSOL não se sustentam. Disse que não apenas a nomeação de Moreira não pode ser encarada como obstrução de Justiça, como também certificou e garantiu que o foro privilegiado é sim consequência da posse.
“A nomeação de alguém para o cargo de ministro de Estado, desde que preenchidos os requisitos previstos no Artigo 87 da Constituição da República, não configura, por si só, hipótese de desvio de finalidade. Eis que a prerrogativa de foro – que traduz consequência natural e necessária decorrente da investidura no cargo de ministro de Estado não importa em obstrução e, muito menos, em paralisação dos atos de investigação criminal ou de persecução penal”, decidiu o ministro do Supremo.
Diversos juristas questionaram a decisão de Celso de Mello, apontando não o erro da tomada, mas o abuso de Gilmar Mendes, em março do último ano. “A decisão me parece correta, de acordo com a ordem constitucional. Só lamento que não tenha sido esta a decisão no caso passado da nomeação do Lula”, disse o jurista Pedro Estevam Serrano ao site Justificando.
A decisão de Gilmar “revela o quão oportunista foi a liminar de Gilmar Mendes. Essa sim, uma decisão sem qualquer fundamento legal, mudando as regras do jogo politico. Pelo visto, a decisão de Mendes sobre Lula ficará na história como a exceção das exceções, como a aberração jurídica usada para desestabilizar o governo de Dilma à época”, disse a coordenadora do curso de Direito da FGV/SP, Eloísa Machado, ao mesmo veículo.
Nessa linha, os advogados Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira entraram com uma petição na Suprema Corte para que o plenário faça uma revisão da decisão de Gilmar contra Lula, no último ano.
“Esse pedido foi motivado pela decisão também proferida nesta data pelo Ministro Celso de Mello, que não impôs qualquer obstáculo à nomeação do Sr. Wellington Moreira Franco, valendo-se para tanto dos mesmos fundamentos que apresentamos ao STF para reverter as decisões proferidas contra Lula. Ou seja, para uma situação em tudo e por tudo idêntica, foram utilizados diferentes critérios”, explicou a defesa.
“Lula preenchia todos os requisitos previstos no artigo 87 da Constituição Federal para o cargo de Ministro de Estado, além de estar em pleno exercício de seus direitos políticos. Ele não era indiciado ou réu naquele momento. Nada justifica o impedimento imposto, que teve graves efeitos não só em relação à honra e à imagem de Lula, mas também para a democracia do País”, lembrou, em nota.