Uma corrente de WhatsApp pode atingir todos os brasileiros?
Patrícia Figueiredo, Agência Pública
São frequentes as mensagens virais no aplicativo de mensagens WhatsApp com notícias, muitas vezes falsas, que terminam com pedidos para que o destinatário repasse o texto para diversos amigos. Além do texto acima, o Truco – projeto de checagem de fatos da Agência Pública – localizou outros finalizados com pedidos similares. Saber se essa informação está correta é importante porque mostra como notícias falsas podem se espalhar rapidamente pela rede.
Para verificar se uma corrente de WhatsApp pode de fato chegar a todos os brasileiros, como afirma a frase, a reportagem primeiro foi atrás de dados que permitissem fazer esse cálculo. Apuramos primeiro as estatísticas do setor de telefonia móvel no Brasil. De acordo com informações da Anatel, 243,42 milhões de linhas móveis estavam em operação no país em janeiro de 2017. Depois, levantamos quantas pessoas existem no país. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população brasileira estava estimada em cerca de 207,16 milhões de pessoas em 3 de março de 2017.
O número de linhas móveis é superior à população porque há pessoas que possuem mais de um número ativo, muitas vezes em diferentes operadoras. No entanto, nem todos os assinantes móveis no Brasil fazem uso regular do aplicativo WhatsApp, onde a mensagem verificada foi propagada. Segundo um relatório do fórum global Mobile Ecosystem, que monitora o uso de aplicativos de mensagens em nove países, 76% dos assinantes móveis no Brasil utilizam regularmente o WhatsApp. Portanto, o aplicativo tem cerca de 184,68 milhões de usuários ativos no país.
Consultamos a matemática Simone Batista, doutora pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), para verificar se é matematicamente possível que a mensagem atinja todos os usuários do WhatsApp no Brasil em pouco tempo. “A previsão matemática é que a corrente chegaria, mais cedo ou mais tarde, a todos que possuem WhatsApp”, confirma a professora. Segundo seus cálculos, se todos os destinatários da mensagem de fato repassarem o texto a outras seis pessoas diferentes das que já receberam, em 11 repasses a corrente atingiria 184,68 milhões de pessoas, ou seja, o total de usuários do aplicativo no país. Veja como foram feitas as contas.
A professora, no entanto, ressalta que é improvável que o cálculo reproduza fielmente a realidade. “O maior problema dessa estimativa é que muitos dos que recebem o texto recebem mais de uma vez. Para saber de verdade o resultado desse cálculo teríamos que estimar quantos usuários recebem repetidas vezes e tirar isto da soma, mas não existem dados suficientes para isso”, explica Batista.
Também é difícil estimar quantas pessoas de fato repassam a mensagem recebida. Estudos acadêmicos analisam a propagação de correntes de e-mail, que seguem uma lógica similar à das correntes de WhatsApp, embora tenham caído em desuso nos últimos anos.
Um artigo do programa de pós-graduação da Universidade de Juiz de Fora cita dados de um estudo da pesquisadora australiana Marjorie Kibby, da Universidade de Newcastle. De acordo com Kibby, 50% dos usuários da Internet afirmaram, em 2005, enviar pelo menos um e-mail de corrente por semana a algum familiar ou amigo, ainda que cerca de 44% desses usuários afirmassem ter algum problema com o recebimento de e-mails indesejados. As pesquisas de Kibby concluem ainda que usuários que utilizam o serviço de e-mail há menos tempo são mais propensos a repassar correntes do que usuários antigos. É possível que as mesmas tendências se apliquem hoje em dia em relação às correntes propagadas via aplicativos de mensagem, porém os estudos não fornecem estatísticas suficientes para avaliar quantos dos usuários de fato repassam as mensagens.
Ainda que em teoria pudesse chegar a todos os usuários do WhatsApp no Brasil, como a previsão matemática aponta, a mensagem não atingiria todos os brasileiros, por três motivos. Parte da população não possui linhas móveis. Além disso, nem todos estão dispostos a compartilhar mensagens desse tipo. E muitos assinantes de telefonia celular não fazem uso regular do aplicativo. Ainda assim, as contas mostram que informações erradas podem se espalhar numa velocidade extremamente rápida e atingir uma enorme quantidade de pessoas. Por isso, classificamos a frase como exagerada, já que aponta para uma tendência correta, mas usa dados errados na conclusão.