Alberto Saraiva, fundador do Habib’s, é conhecido por falar muito. De economia, de política, de família. No entanto, mantém um silêncio ignominioso no caso do menino João Victor, de 13 anos, morto numa de suas filiais
Kiko Nogueira, DCM
Alberto Saraiva, o fundador do Habib’s, pode ser acusado de qualquer coisa, menos de ser low profile.
Alberto fala. Muito. De economia, política, marketing, família — o que o entrevistador quiser.
No entanto, mantém um silêncio ignominioso no caso do menino João Victor, de 13 anos, morto numa de suas filiais depois de levar um soco e ser perseguido por seus funcionários, segundo testemunhas.
O vídeo do garoto sendo arrastado pelo gerente e outro homem viralizou. Choca pela vileza e pela desumanidade.
Sairava, misteriosamente, acha que não é com ele.
Uma nota burocrática, duas semanas após a tragédia, foi divulgada. “A Rede informa que continua apurando os fatos da lamentável ocorrência em uma de suas unidades franqueadas”, lê-se.
O dedo é apontado para João Victor: “A conduta do menor estava incontrolável, ameaçando o patrimônio físico da loja e dos clientes.”
O Habib’s é um conglomerado de fast-food com 450 unidades, divididas em três marcas. São mais de 20 mil empregados. Concorre diretamente com McDonald’s e Burger King em sua política de preços baixos.
Em 2015, faturou 2,2 bilhões de reais. A Operação Flex Food, da Polícia Federal, investigava a empresa num esquema de sonegação fiscal que se estendia por cinco estados.
Self made man, Saraiva frequenta há muito tempo a imprensa especializada.
Veio com a família de Portugal quando bebê. Criado no Paraná, migrou para São Paulo para cursar medicina. Trancou o curso depois que o pai foi morto em sua padaria e ele se viu obrigado a assumir o negócio. Formou-se mais tarde.
O primeiro Habib’s é de 1988 e ficava na rua Cerro Corá, no bairro paulistano da Lapa. “O assassinato do meu pai mudou minha vida”, afirma.
É um homem vaidoso e conta com a ajuda dos amigos na mídia para esconder a idade. As matérias simplesmente não contêm essa informação. Não consta nem no verbete da Wikipedia.
Ao longo do processo do impeachment, Alberto tagarelou ininterruptamente. Foi capa da Istoé Dinheiro numa reportagem chamada “Fome de Mudança”.
“Não posso me amedrontar, me calar e me recolher diante de um momento histórico do País, que está agonizando com tanta corrupção e pessimismo”, declarou, corajoso.
Jactava-se da campanha publicitária “Caiu!”, que usava o preço das esfihas de frango para fazer uma alusão ao governo Dilma.
Nos protestos de rua de 2016, o Habib’s patrocinou a distribuição de cartazes com slogans como “Quem espera nunca alcança” e “Quero meu País de volta”.
“A crise exige que o marketing seja extremamente agressivo. Nós nunca tínhamos feito filmes como esses”, falou à Veja em janeiro. “Eles despertaram a atenção do público, e isso virou comentário, boca a boca. Nossa marca cresceu”.
Na mesma entrevista, elogiou Temer: “Eu vejo esse governo extremamente bem-intencionado, colocando a mão onde deveria colocar, como no controle de gastos”. Saraiva é palestrante e escreveu o livro “25 Verbos para Construir sua Vida”.
Desculpas de CEOs são comuns no mundo corporativo. Para ficar em casos recentes, Oscar Muñoz, da United Airlines, rogou perdão pelo tratamento dispensado aos passageiros. Mary Barra, da GM, admitiu os erros de um recall. A Volkswagen veio a público se lamentar por vender carros com software ilegal para disfarçar a emissão de poluentes.
Quando empresas e seus líderes tomam essa atitude, estão não apenas dando satisfação às pessoas que foram prejudicadas e à sociedade de forma geral, mas também a seus funcionários, acionistas e executivos.
Steve Jobs pediu desculpas. O papa Francisco quase não faz outra coisa com relação à Igreja.
Mas não Alberto Saraiva.
Pagará caro por tratar João Victor como carne moída.
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