Depois de Fernando Holiday, que elegeu-se vereador, MBL agora usa missionária angolana para “rebater” o pensamento do “mimimi do negro vitimista”. É nitroglicerina pura. Enquanto isso, os tubarões se refestelam com milhões de visualizações de seus peixes teleguiados e morrem de rir dos tolos indignados
Cidinha Silva*, DCM
O MBL utiliza estratégia manjada de marketing para tensionar a temática racial e produzir um pensamento negro de direita. Primeiro, elegeu com milhares de votos na cidade de São Paulo, um vereador negro e gay, veiculador de discurso anti-negro e anti-gay.
Esse vereador, Fernando Holiday, no campo institucional da Câmara Municipal da maior cidade da América Latina, empunha todas as bandeiras do retrocesso de pequenas conquistas negras no campo das ações afirmativas, além de emitir voz contrária a tudo o que tenha sido conquistado pelos negros como resultado de luta política.
Desse modo, o movimento de rua para sustentação do golpe produziu uma marionete negra que cumpre três funções principais: referenda e vulgariza a ideologia do grupo; agrega e inspira pensamento similar e, por fim, alimenta o pensamento racista em busca de legitimação negra para seus pressupostos.
O segundo passo da estratégia foi eleger os canais de TV pessoais da Web para alavancar personas negras que veiculem esse pensamento negro de direita, tais como Ruth Catala, jovem missionária angolana residente em Curitiba e “Preto Opressor”, um youtuber auto-intitulado negro, homossexual e pobre.
A força e o alcance dos youtubers, como se sabe, cresce assustadoramente entre adolescentes e jovens. Assistimos semanas atrás à contratação de dois youtubers, feita pelo governo ilegítimo de Temer para inocular nos seguidores daqueles jovens as vantagens inexistentes da reforma do Ensino Médio.
Uma proposta que diminui o período letivo para desenvolver conteúdos básicos exigidos pelo ENEM e vestibulares; enfraquece a formação humanista, política e cidadã desempenhada por disciplinas como História, Filosofia e Sociologia; aumenta a carga horária diurna e quer extinguir os cursos noturnos. Além de tudo, destina-se apenas às escolas públicas, ou seja, arma o circo para que os estudantes das boas escolas particulares voltem a ser o público hegemônico das boas universidades, públicas e particulares.
Quem trabalha a formação de leitores, costuma ouvir como resposta à pergunta “o que você gosta de ler” feita a adolescentes, “eu gosto de livro de youtuber”. Isso significa que eles assistem as intervenções nos canais da Web e depois compram e lêem os livros impressos por aqueles narradores.
Em terceiro lugar, a cereja do bolo, a impulsão do discurso reacionário da jovem missionária angolana negra por meio da chamada: “Angolana destrói Movimento Negro vitimista” e do “Preto Opressor” que alardeia total oposição “à esquerda, ao Movimento Negro, ao Movimento LGBT e ao PT, de um modo geral”.
A missionária, por sua vez, dirige-se às pessoas negras repreendendo-lhes “exageros, vitimismo e mimimi” e conclama a todos a “lutarem com dignidade e amor pelo bem da humanidade”.
É nitroglicerina pura! Trata-se de repertório discursivo que por ser dito por mulher negra africana e homem negro, gay e pobre, evoca a legitimidade da experiência para desconstruir movimentos sociais que lutam pelos direitos de pessoas atingidas pelo racismo, pelo sexismo, pela LGBTfobia.
Reafirmam estereótipos, estigmas e mantêm as pessoas negras em lugares de subalternidade, ao tempo em que instigam a revolta contra peixes pequenos. Enquanto isso, os tubarões se refestelam com milhões de visualizações de seus peixes teleguiados e morrem de rir dos tolos indignados.
*Cidinha da Silva, mineira de Belo Horizonte, é escritora. Autora de “Racismo no Brasil e afetos correlatos” (2013) e “Africanidades e relações raciais: insumos para políticas públicas na área do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Brasil” (2014), entre outros.
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