Finalmente foi lançado, no Brasil, o livro que relata uma realidade sempre ocultada: a expulsão de milhares de palestinos, em 1948, para criar o Estado judeu no Oriente Médio
Reginaldo Nasser, Outras Palavras
Tente se inteirar a respeito da chamada questão Palestina fazendo uma busca nas redes e inserindo a palavra: Ocupação. As informações que você encontrará referem-se, quase que exclusivamente, ao que aconteceu há 50 anos, como consequência da vitória militar de Israel na Guerra dos Seis Dias (1967): a Ocupação da Faixa de Gaza e da Cisjordania. Assim, sob a ótica do Direito Internacional há consenso de que se trata de uma Ocupação Beligerante: territorio ocupado em decorrência do uso da força. A dimensão deste acontecimento fez com que se criasse um falso entendimento que foi nesse momento que se iniciou o conflito entre Israel e palestinos.
Mas, se a partir de 1967, o problema palestino ganhou maior relevância e visibilidade no mundo, por outro lado, permitiu que cada vez mais a Nakba (Catástrofe em árabe) fosse progressivamente relegada ao esquecimento, apesar do testemunho de milhões de palestinos. Na narrativa sionista, o Estado de Israel foi criado, em 1948, em decorrência de uma Guerra de Independência contra os Estados árabes; e o êxodo de milhares de palestinos, uma consequência natural do conflito.
Há aqueles que cingem sua atenção apenas nos episodios agudos dos conflitos bélicos como nas chamadas guerras entre “árabes” e israelenses ou nas “ações armadas dos palestinos sempre qualificadas como terrorismo. Tal percepção esconde mais do que revela a realidade politica economica do colonialismo sionista. Seja porque foram apenas os governos do Egito e Siria que se envolveram mais efetivamente nas ações armadas, e não a comunidade arabe como um todo; seja porque é justamente nesses intervalos de “paz” é que pode consolidar progressivamente uma estrutura socio-economica de dominação.
Por exemplo, em 1950, o Knesset (parlamento de Israel) aprovou a lei do Proprietário Ausente, que concedeu ao Departamento de Assentamento do Fundo Nacional Judaico (FNJ) um estatuto independente de proprietária de terras em nome do estado judeu. Outras regulamentaçoes como Lei de Terras de Israel e a Lei de Autoridade de Terras de Israel aprimoram a medida proibindo o FNJ de vender ou arrendar terras para não judeus. O resultado da aplicação dessas leis durante decadas (até 1967) passou a vigorar para todas as terras estatais (cerca de 90% das terras de Israel). Após o processo de ocupação das terras, a minoria palestina (17% da população total) teve que se contentar com apenas 3% das terras. Eles tinham a permissão para construir e morar em apenas 2% e ter produção agricola em 1%. Ou seja, atualmente 1,5 milhao de palestinos continuam habitando esses mesmos 2%
É fato que o primeiro historiador a ter acesso às fontes militares israelenses, Benny Morris, teve o mérito de mostrar que a “fuga voluntária” dos palestinos era um mito; mas o problema é que tomou esses documentos como verdades absolutas. Isso fez com que, de acordo com Pappe, Morris ignorasse inúmeras atrocidades cometidas pelos judeus. Ilan Pappe também se utiliza dos próprios arquivos militares israelenses. Porém, eles são confrontados com a narrativa palestina marginalizada, o que torna possível demonstrar que houve uma verdadeira operação de limpeza étnica, como resultado de um plano (Dalet), previamente elaborado, com descrição detalhada dos métodos a serem empregados para expulsar o povo palestino de suas terras. A execução do plano teve inicio no dia 10 de Março de 1948. Antes, portanto, do inicio da ação militar dos governos árabes em 15 de maio, o que torna dificil de sustentar a tese de que houve uma guerra de libertação nacional por parte de Israel.
Após a leitura dessa obra, você compreenderá porque há um profundo temor por parte dos sionistas (de direita ou de esquerda) em relação a qualquer debate sobre 1948, pois se trata de criação de um Estado construido a partir de uma limpeza etnica.
RESENHA DE:
A Limpeza étnica da Palestina – Editora Sundermann
De Ilan Pappe, com tradução de Luiz Gustavo Soares
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