Religião

Pai que teve filhas estupradas por padre católico busca Justiça

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"Minha família era perfeita e a Igreja a destruiu". Com uma foto de duas crianças sorridentes na mão, pai definiu, no ano passado, sua grande missão: buscar justiça pela violência sofrida pelas filhas. Depois dos abusos, meninas tiveram fim trágico: morte e deficiências

Por mais de duas décadas, Anthony e Chrissie Foster lutaram por Justiça após estupro de suas filhas Emma e Katie em uma escola católica

`Com uma foto de duas crianças sorridentes na mão, Anthony Foster definiu, no ano passado, sua grande missão.

“Estas são minhas meninas”, disse ele na ocasião, em Roma, às câmeras de TV. “Um padre católico as violentou na época em que esta foto foi tirada e por isso estamos lutando há tanto tempo. Esta era minha família perfeita. Nós a fizemos assim e a Igreja Católica a destruiu.”

A missão de Foster dominou grande parte das duas últimas décadas de sua vida: o australiano trabalhou por mais conscientização da sociedade em relação ao abuso sexual infantil e, como resultado, mais segurança para crianças. Foster, no entanto, pagou um preço alto por anos de batalha.

Ele foi hospitalizado e morreu no final de maio em Melbourne, na Austrália, após sofrer um acidente vascular cerebral. Tinha 64 anos.

Com sua esposa, Chrissie, Foster enfrentou a Igreja em busca de reconhecimento de erros e de esclarecimentos para suas filhas, Emma e Katie, estupradas na escola primária que frequentavam em Melbourne, entre 1988 e 1993.

Os abusos tiveram início quando as meninas tinham entre cinco e seis anos de idade e se repetiram durante anos – deixando profundos traumas na família.

Emma viciou-se em drogas e passou a se automutilar. Em 2008, aos 26 anos, tomou uma dose excessiva de medicamentos e morreu abraçada a um ursinho de pelúcia que havia ganhado em seu primeiro aniversário.

Sua irmã Katie, sofria de alcoolismo e foi atropelada em 1999. Vive hoje com deficiências físicas e mentais que requerem cuidados constantes.

Luta

O casal Foster buscou, durante anos, que a Igreja reconhecesse os crimes e oferecesse respostas. Quem era o homem que abusou de suas filhas? O que a Igreja sabia sobre suas ações?

O criminoso era o padre Kevin O’Donnell, que já em 1958 havia sido acusado de pedofilia. Ele foi preso por atos sexuais contra menores em 1995 e morreu em 1997.

Os Foster também denunciaram o padre mas, dizem que, inicialmente, suas acusações foram ignoradas pela Igreja.

Finalmente, após uma batalha legal de dez anos, o casal recebeu US$ 555 mil como parte de um acordo judicial.

“A Igreja deveria ter vergonha”, disse Foster em entrevista à Fairfax Media em 2010. “Se tivessem sido abertos para ouvir sobre o abuso, Emma poderia estar aqui ainda.”

Além de buscar justiça para suas filhas e para famílias de outras vítimas, os Foster ofereciam cursos para pais e futuros pais sobre como se comunicar com os filhos.

Sua campanha contribuiu para a criação de uma comissão real – a instância mais alta de inquérito público existente na Austrália – para investigar o abuso sexual institucionalizado no país.

Formada em 2013, a comissão deve entregar seu relatório final em dezembro deste ano, após ouvir depoimentos devastadores e encontrar indícios de que 7% dos padres católicos da Austrália cometeram abusos contra crianças entre 1950 e 2010.

No ano passado, o casal Foster viajou para Roma para ouvir o muito esperado depoimento do cardeal George Pell, tesoureiro do Vaticano e mais importante representante da Igreja Católica na Austrália.

Em entrevistas à emissora australiana de rádio 2UE antes da audiência, Anthony Foster disse: “Essas pessoas foram alertadas sobre o homem que estuprou Emma um ano antes de ela entrar na escola – George Pell era o bispo auxiliar na região no ano em que ela entrou na escola.”

Honras de Estado

A morte de Anthony Foster provocou consternação entre grupos ativistas de vítimas de abuso sexual infantil.

Ele recebeu um funeral de Estado e diversas homenagens na Austrália e no mundo.

Os Foster participaram de “centenas de audiências públicas e várias de nossas mesas redondas sobre políticas (de proteção a menores)”, desse o juiz Peter McClellan, presidente da comissão real australiana que investiga os crimes – e que contabilizou 4,4 mil denúncias de abusos contra menores entre 1980 e 2015 no país.

“Com dignidade e gentileza, Anthony e Chrissie apoiaram generosamente inúmeros sobreviventes e suas famílias, apesar de carregarem sua própria dor”, disse o juiz.

“A história registrará que um homem chamado Anthony Foster mudou silenciosa e profundamente a história da Austrália”, disse o governador do Estado australiano de Victoria, Daniel Andrews. “Ele lutou contra atos malignos que, vergonhosamente, foram negados e ocultados.”

Paul Kennedy, jornalista e coautor, ao lado de Chrissie Foster, de Hell on the Way to Heaven (Inferno a Caminho do Paraíso, em tradução livre) – livro que descreve a luta da família por justiça para as filhas -, disse que a nação havia perdido “um gigante”.

A luta dos Fosters se somou a de centenas de outros ativistas em todos os continentes contra abusos sexuais denunciados em instituições católicas e que vieram à tona nos últimos anos.

Um relatório de 2014 do Comitê dos Direitos da Criança da ONU criticou o Vaticano por anos de relutância em admitir a escala dos abusos e em tomar as medidas necessárias para proteger crianças contra clérigos pedófilos.

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BBC Mundo

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