Michel Temer propõe fim de proteção a 350 mil hectares de floresta. Principais beneficiados serão grileiros e posseiros que atuam na extração ilegal de madeira e no garimpo
O governo de Michel Temer enviou para o Congresso Nacional o Projeto de Lei 8.107 (PL), propondo a retirada de 349 mil hectares da Floresta Nacional do Jamanxim, localizada no município de Novo Progresso, no Pará, transformando o novo território em Área de Preservação Ambiental (APA). Apesar do nome aparentemente protetivo, a APA é a categoria mais frágil dentre as 12 categorias de unidades de conservação existentes no Brasil.
O PL enviado na última quinta-feira (13), dias antes do recesso parlamentar de julho, é consequência da Medida Provisória 756, aprovada recentemente pelo Congresso Nacional. Na ocasião, a MP previa originalmente a diminuição da Floresta em 304 mil hectares, mas os congressistas ampliaram o corte para 486 mil. Diante da péssima repercussão, principalmente em nível internacional, Temer recuou e vetou a MP em junho. Apesar do “passo para trás” dado no mês passado, o novo PL simboliza o compromisso do governo em agradar a bancada ruralista paraense.
“Embora tenha um bom nome, a Área de Preservação Ambiental é bem menos restritiva. Ela permite o uso residencial intenso, pode ter mineração e indústria. É a categoria mais frágil dentre as unidades de preservação. O nome engana bastante”, explica Silvia Futada, integrante do grupo de monitoramento do Instituto Socioambiental.
“Muitas APAs têm pouquíssima floresta em pé ou cursos d’água ainda intactos ou bem conservados. Muitas vezes é uma forma de governos dizerem que criam áreas protegidas quando, na verdade, não há gestão diferenciada para aquele território.”
Elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente, o projeto de lei argumenta que a redução da Floresta Nacional do Jamanxim é necessária para “pacificar” a região, território dominado por conflitos oriundos da extração ilegal de madeira. Segundo o texto do PL, o corte só irá abranger ocupações existentes antes de 2006, ano em que a Floresta foi criada por decreto.
De acordo com Silvia Futada, a justificativa do governo, entretanto, não se sustenta. “Ao olhar para a área que está se propondo alterar, mais de 25% do desmatamento ali existente ocorreu nos últimos três anos. Isso deixa muito claro que essas pessoas não estavam lá antes de 2006. É uma ocupação de território público criminosa. O governo está passando a mensagem de que o crime compensa, é uma questão de tempo para a situação ilegal se regularizar”, afirma.
Silvia reconhece que há, no histórico de criação de unidades de conservação no Brasil, pessoas que moravam ali antes, mas salienta que é preciso diferenciar a situação e “agir com justiça”, porque há casos de invasores e grileiros que usam tais oportunidades como meio de angariar mais terra.
No caso específico da Floresta Nacional do Jamanxim, parecer do Instituto Chico Mendes de 2009 recomendava o corte de 35 mil hectares da floresta para “atender a demandas justas de posse”. A área então delimitada pelo órgão federal de unidades de conservação era dez vezes menor do que a atual proposta do governo Temer.
Legalizando o crime
Assinada pelo ministro do Meio Ambiente Sarney Filho, a justificativa apresentada no texto do PL para reduzir a Floresta Nacional é uma pérola. Tal como na reforma trabalhista, em que o governo argumentou que apenas estava regularizando práticas já existentes no mercado – práticas ilegais, diga-se – o mesmo acontece na floresta do Pará. O governo admite que parte da área foi grilada e desmatada ilegalmente, mas ao invés de combater o crime praticado, prefere regularizá-lo.
“A área onde se localiza a Floresta Nacional do Jamanxim tem sido palco de recorrentes conflitos fundiários e de atividades ilegais de extração de madeira e de garimpo associados a grilagem de terra e a ausência de regramento ambiental. Com reflexos na escalada da criminalidade e da violência contra agentes públicos, sendo necessária a implantação de políticas de governo adequadas para enfrentar essas questões”, diz o texto do PL.
Para Silvia Futada, integrante do grupo de monitoramento do Instituto Socioambiental, decisões semelhantes já ocorreram em outros locais e o resultado, com o passar dos anos, foi que o desmatamento e o conflito “caminhou” para as outras áreas protegidas. “Na verdade, é uma questão temporal, o conflito não acabou. Na sequência, o desmatamento avança sobre as áreas protegidas”, pondera.
Ela espera que se repita sobre o projeto de lei a mesma pressão exercida por personalidades e entidades ambientalistas do Brasil e do exterior durante a tramitação da medida provisória, depois vetada por Temer. “Naquele momento contou muito o acompanhamento internacional, porque o governo se preocupa pouco com a opinião pública nacional”, define.
Membro da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, o deputado Beto Faro (PT-PA) afirmou nesta segunda-feira (17), no Dia Nacional de Proteção à Floresta, que a proposta de mudança na Floresta Nacional do Jamanxim é muito ruim, “principalmente neste momento de um governo ilegítimo e fraco, o que possibilita a abertura de tudo e que haja mais desmatamento”.
Para o parlamentar, o veto de Temer da medida provisória que cortaria 486 mil hectares da floresta foi um ato “oportunista”, praticado em função da viagem que o presidente faria dias depois à Rússia e a Noruega.
“Na realidade, os vetos tiveram outras motivações políticas e não passaram de um blefe. Tiveram o objetivo de gerar a falsa ilusão, às vésperas da viagem do presidente, das preocupações ambientais do governo, na ingênua expectativa de evitar as previsíveis críticas por parte do governo da Noruega, principal financiador do Fundo Amazônia, contra o atual ciclo expansivo do desflorestamento na região. Isso, sem falar em tentar agradar artistas e a modelo Gisele Bündchen, envolvidos contra o desmatamento das florestas”, afirmou Faro.
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