Redação Pragmatismo
Governo 02/Ago/2017 às 08:32 COMENTÁRIOS
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Quanto custa ao Brasil a tentativa de salvar Michel Temer

Publicado em 02 Ago, 2017 às 08h32

A poucas horas de enfrentar a sessão na Câmara dos Deputados que pode definir o futuro do seu governo, o presidente Michel Temer tem usado sem cerimônia a máquina federal para conquistar votos de deputados

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Jean-Philip Struck, DW

A poucas horas de enfrentar a sessão na Câmara dos Deputados que pode definir o futuro do seu governo, marcada para esta quarta-feira (2), o presidente Michel Temer tem usado sem cerimônia a máquina federal para conquistar votos de deputados.

Sua “campanha” inclui a promessa de bilhões de reais para emendas parlamentares e projetos em municípios e Estados, criação de cargos comissionados e atendimento de demandas específicas de bancadas.

As medidas contrastam com o discurso de “sacrifício” que Temer evocou ao assumir o governo em 2016. Para se salvar de uma eventual admissão pela Câmara da denúncia criminal por suspeita de corrupção, o presidente pode gastar mais de R$ 17 bilhões apenas em emendas parlamentares e verbas destinadas para governos e prefeituras.

Ao ceder em projetos dispendiosos de deputados e criar mais cargos, Temer parece também estar jogando uma pá de cal na política de ajuste fiscal prometida no início do governo.

Emendas

Entre as medidas para convencer os deputados a ficarem ao lado do governo, a mais explícita tem sido o direcionamento de verbas para emendas – recursos pedidos pelos deputados que normalmente são gastos em suas bases eleitorais.

Entre o início de junho e o final de julho, período em que o escândalo da JBS veio à tona, o governo destinou R$ 4,1 bilhões para esse fim. No acumulado do ano até maio – antes do caso JBS –, o governo havia empenhado apenas 102,5 milhões de reais.

Pelas regras, parlamentares governistas ou da oposição são contemplados com a mesma cota, só que o governo é que estabelece o ritmo da distribuição.

De acordo com a ONG Contas Abertas, parlamentares que declaram abertamente apoio ao governo Temer receberam em média a promessa de R$ 1 milhão a mais do que os deputados que vão votar pela aprovação da denúncia.

A estratégia das emendas foi usada pela antecessora de Temer, Dilma Rousseff. Nas semanas anteriores à votação de seu impeachment pela Câmara, a presidente anunciou a distribuição de R$ 3,2 bilhões.

No caso de Temer, o laboratório para a tática foi a votação da denúncia pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, que fez a análise preliminar da denúncia na primeira quinzena de julho.

Trinta e seis dos quarenta deputados que votaram a favor do presidente foram contemplados com R$ 134 milhões, segundo a Contas Abertas. O campeão foi justamente o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), que apresentou o novo relatório favorável ao presidente. No total, ele deve receber R$ 5,1 milhões.

Deputados da oposição vêm criticando a distribuição de recursos. Segundo Chico Alencar (PSOL-RJ), a destinação de tantas verbas para emendas “caracterizam evidente compra de votos, com consequências de obstrução à Justiça”.

Mais verbas e cargos

A distribuição de recursos não passa só pelo Legislativo. Após atravessar 2016 falando duro com Estados da federação que estão atolados em dívidas, o governo parece ter mudado de ideia após o escândalo da JBS.

No dia 12 de julho, o Planalto anunciou a liberação de R$ 11,7 bilhões para apoiar o financiamento de obras e concessões de infraestrutura em estados e municípios. No dia seguinte, foi a vez de o Ministério da Saúde anunciar um investimento de R$ 1,7 bilhão para a rede de atenção básica no país, incluindo a compra de ambulâncias para 1787 municípios. As duas medidas foram anunciadas horas antes da votação da denúncia pela CCJ.

Além de direcionar recursos, o governo também abandonou sua propagandeada política inicial de reduzir o número de cargos comissionados. Segundo a Contas Abertas, entre maio e junho, o governo criou mais de 500 funções do tipo na administração federal, elevando o total para 20.321.

A liberação das verbas e criação de cargos também ocorre em um momento em que o governo prevê um rombo de R$ 139 bilhões nas contas públicas.

Segundo o Ministério do Planejamento, tanto o envio de recursos para estados e municípios é um “procedimento absolutamente normal”. Já o empenho das emendas, segundo a pasta, é “um procedimento obrigatório previsto na Constituição e na legislação orçamentária”.

Ajuste fiscal em risco

A União tem a receber cerca R$ 300 bilhões em dívidas. Para tentar convencer os devedores – empresas e pessoas físicas – a quitarem os débitos, o Planalto pretende passar um projeto de lei para criar mais um programa de refinanciamento, ou Refis.

Na versão originalmente promovida pelo Planalto, o Refis de 2017 pretendia arrecadar pelo menos R$ 13,3 bilhões ainda neste ano. Só que, precisando de apoio, o governo pouco fez para impedir em 17 de julho a aprovação por uma comissão mista de um novo relatório que prevê descontos no Refis que podem chegar a 99%.

A iniciativa partiu de um deputado do próprio partido do presidente: Newton Cardoso (PMDB-MG). O texto ainda precisa ser votado no plenário da Câmara. Caso a medida passe, nem R$ 500 milhões devem chegar aos cofres do governo.

Nesta segunda-feira (31), o jornal “Folha de S.Paulo” informou que os ministérios da Fazenda e do Planejamento já cogitam ter que rever a meta fiscal e aumentar a previsão de déficit em 2017. Não se sabe se Temer pretende usar o veto para confrontar os deputados, que têm em suas mãos o futuro da Presidência.

Pelo menos 76 deles parecem diretamente interessados na aprovação de um Refis mais generoso. Empresas ligadas a eles devem R$ 217,8 milhões, segundo o jornal “O Estado de S.Paulo”.

Outros 29 deputados têm R$ 18,9 milhões de débitos inscritos em seus próprios CPFs. Até mesmo o relator Cardoso é um devedor. Empresas ligadas a ele devem R$ 51 milhões.

Reivindicações das bancadas

Sentindo o enfraquecimento do governo, bancadas da Câmara têm pressionado o Planalto para que suas demandas sejam atendidas. Em julho, a bancada ruralista conseguiu do governo a sanção da “medida provisória da grilagem” – como foi chamada por ambientalistas –, que prevê a legalização em massa de terras públicas invadidas. Dias depois, o presidente aprovou um parecer da AGU (Advocacia-Geral da União) que prevê que um entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a criação da reserva indígena Raposa Serra do Sol passe a valer para todas as demarcações.

Pelo entendimento do STF, só são terras indígenas as ocupadas por índios na data da promulgação da Constituição de 1988. A decisão do STF não tinha efeito vinculante, mas a bancada convenceu o presidente do contrário. O Ministério Público Federal classificou a medida como um retrocesso para a causa indígena no Brasil.

O deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), coordenador da Frente Parlamentar Mista da Agricultura, já disse que vai votar a favor do presidente. “É inegável que com Temer muitas pautas históricas defendidas pela bancada foram atendidas”, disse Leitão ao “Estado de S.Paulo”.

Já a Frente Parlamentar Evangélica conseguiu do governo em junho que o Ministério da Educação ordenasse o recolhimento de 93 mil exemplares de um livro de contos. A temática de incesto de um dos contos – que narrava a história de um rei que deseja se casar com uma de suas filhas – revoltou os evangélicos que compõem a Comissão de Educação da Câmara.

A resposta do ministério mostrou que o governo vem cedendo para o grupo. Segundo um levantamento de “O Estado de S.Paulo”, 80% dos 213 parlamentares que não divulgaram até agora como vão votar na sessão que vai analisar a denúncia contra Temer fazem parte de uma das bancadas “BBB” (boi, bala e bíblia).

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