Delegado diz que filho de PM que descarregou arma de fogo em escola de Goiânia se inspirou em outros ataques. Colega conta que atirador era vítima de bullying. Pai de vítima revela que perdoa atirador
Dois estudantes morreram e outros quatro, com entre 13 e 15 anos de idade, ficaram feridos depois que um colega, aluno do 8º ano, entrou armado com uma pistola Ponto 40 no Colégio Goyases, escola particular de ensino infantil e fundamental, em Goiânia, e disparou ao menos 15 tiros, por volta do meio-dia desta sexta-feira (20).
O delegado Luiz Gonzaga, da Delegacia de Polícia de Apuração de Atos Infracionais (DPAI), afirma que as testemunhas ouvidas relataram que o aluno não dava indícios de agressividade. “Mantinha um bom comportamento no colégio, nada que anunciasse uma tragédia como essa”, afirmou em entrevista à rádio BandNews FM.
O adolescente foi detido por dois homicídios qualificados e quatro tentativas de homicídio. O policial militar, pai do garoto, foi ouvido na tarde desta sexta na Corregedoria da PM para explicar como o filho teve acesso à arma, que seria de propriedade do pai. O Ministério Público irá designar uma avaliação psicológica para decidir o procedimento que será adotado.
Bullying
Uma colega, aluna do 8º ano, relata que o menino era chamado de “fedorento” pelos colegas. “Ele era todo calado, ficava com os colegas lá e eu nunca falei com ele. Chamavam ele de fedorento. Um aluno, acho que foi ele que morreu, levou um desodorante para ele, porque ele não passava”, disse em entrevista à rádio BandNews FM.
O bullying é uma situação que se caracteriza por agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, por um ou mais estudantes contra um ou mais colegas.
“Tinha uma professora do meu lado e ela falou: deve ser experimento, que amanhã tinha um festival de ciências. Mas aí a (outra) professora gritou. É tiro, é tiro, ajuda aqui. Uma menina foi atingida no peito, do lado de trás, um foi atingido no braço, de raspão, outro nas costas de raspão, e tinha um menino caído no chão, com a boca toda sangrando em cima da mochila. Ele (o atirador) estava dentro da sala. Foram seis tiros, acho, provavelmente”, afirma a colega.
“Ela (a professora) falou que chutou o pé dele (atirador) e ele caiu. Aí ela correu. Ela estava atrás dele.”, conta.
Inspiração
O delegado Gonzaga disse à imprensa que o menino se inspirou em outros atentados.
“O adolescente agiu motivado por um bullying que ele sofria de outro adolescente. Segundo informação do próprio adolescente, ele se inspirou em duas tragédias. Uma tragédia que aconteceu [em 1999] nos Estados Unidos, no colégio Columbine, e outra [em 2011] no Realengo, aqui no Brasil. Dessa inspiração fez nascer a ideia nele de matar alguém. Depois, motivado por esse bullying que ele sentia e sofria por parte de um dos seus colegas, ele resolveu executar e matar pessoas”, disse Gonzaga.
Questionado se o adolescente esboçou algum sentimento de culpa, Gonzaga disse que ele não chegou a falar a palavra “desculpas”, mas, pela feição, aparentava estar arrependido “com certeza”.
Os tiros
No momento do ataque, o estudante da 8ª série portava dois carregadores de munição dentro da sala de aula. A professora estava falando e os alunos permaneciam sentados quando o atirador sacou a arma da mochila.
Antes de tirar o objeto escondido, porém, provocou um disparo acidental que não atingiu os colegas. Já com a arma em punho, atirou primeiro no desafeto e depois nos demais, segundo o delegado. O segundo a morrer era amigo do próprio atirador.
Ainda de acordo com o delegado, o adolescente usou toda a munição do primeiro carregador, com 12 balas, e foi contido pela coordenadora da escola quando já usava o segundo, cujas balas não chegaram a ser totalmente descarregadas. A arma pertencia à mãe, que é policial militar, e é de exclusividade das polícias e de alto poder de fogo.
O adolescente disse que começou a pensar em atirar contra os colegas há cerca de dois a três meses, quando “começou a se inteirar” do assunto.
Perdão
João Pedro Calembo, 13, foi uma das vítimas do atirador na escola em Goiânia. O pai dele, Leonardo Calembo, que também é pai de outros dois meninos, disse em entrevista à Folha que seu filho tinha um coração enorme.
“João Pedro é mesmo cristão. Um dia chegou até mim e disse ‘pai, tenho um colega que sofre muito preconceito. Eu disse ‘meu filho, você tem que orar por ele’. Sempre ensinei a respeitar o próximo”, afirmou.
João Pedro sentava na carteira imediatamente atrás da do atirador, no fundo da classe. Foi o primeiro a ser morto.
O pai da vítima nega a versão que o atirador e colegas de turma contaram à polícia, de que João Pedro seria desafeto do menino que efetuou ao menos 11 disparos contra os colegas de classe.
Colegas de escola disseram que o atirador era chamado de “fedorento” e relataram que o atirador chegou a receber um desodorante como provocação.
“Não acredito nessa história de desodorante. Não existe essa história de desafeto. Bullying hoje é o nome novo a uma brincadeira que se faz há tantos anos”, diz o pai, presbítero da Igreja Batista Renascer, frequentada por João Pedro.
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