Juristas

Por que o diálogo entre Moro e Zucolotto nunca foi divulgado?

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Escuta clandestina flagrou conversa de Sergio Moro com o amigo Zucolotto, mas diálogo nunca foi divulgado. Denúncia do advogado Rodrigo Tacla Durán desenterrou um passado incômodo para o juiz federal de Curitiba

Zucolotto e Moro e a ficha de Tacla Duran, réu que denunciou o amigo do juiz

Joaquim de Carvalho, DCM

A denúncia do advogado Rodrigo Tacla Durán, antigo prestador de serviços da Odebrecht, de que um amigo de Moro tentou lhe vender facilidades na Lava Jato desenterrou um passado incômodo para o juiz federal de Curitiba.

A relação de Moro com o advogado Carlos Zucolotto Júnior vai além da amizade. Além de ter dividido um escritório de advocacia com a mulher de Moro, Zucolotto figurou como advogado em um processo no qual Moro era parte — nesse caso, parte mesmo, já que ele foi alvo de escutas telefônicas clandestinas realizada pelo advogado e lobista Roberto Bertholdo.

O passado incômodo foi revelado em dois CDs entregues à jornalista Denise Mello, então na rádio Bandnews de Curitiba. Ali estavam as transcrições das conversas de Moro. Bertholdo divulgou os registros da interceptação clandestina para se defender de um processo em que se encontrava preso, acusado de lavagem de dinheiro e tráfico de influência.

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Na entrevista que concedeu à rádio, de dentro da cadeia, ele contou que o doleiro Alberto Yousseff, solto por Moro num acordo de delação premiada em 2004, estava operando intensamente no mercado paralelo e, com a delação dele, outros doleiros haviam sido presos ou saíram do mercado. Youssef ficou praticamente sozinho no comando do submundo da lavagem de dinheiro.

Segundo Bertholdo, “a delação premiada concedida pela 2.ª Vara Criminal Federal de Curitiba ao doleiro Alberto Youssef tem feito com que ele estabeleça um monopólio do câmbio no Brasil”, conforme registro da entrevista, feito pelo jornal O Estado do Paraná.

A Bandnews, propriedade do grupo J Malucelli, cujo dono é hoje muito amigo de Moro, publicou a entrevista, mas não levou ao ar o conteúdo da interceptação telefônica.

Segundo Denise contou em depoimento à Justiça, a razão foi a origem clandestina das gravações. O depoimento dela foi relatado num processo que tramitou no Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

Denise arrematou, ainda, que, uma vez terminada a entrevista, relatou o ocorrido ao seu coordenador, Gladimir Nascimento. Após deliberarem em conjunto sobre o assunto, levando em conta que os áudios tinham sido obtidos de forma clandestina, resolveram não divulgá-los (sic), motivo pelo qual a entrevista em questão foi ao ar no dia seguinte, 15/03/2006, sem que fosse divulgado ao público o conteúdo das gravações ilícitas.”

Denise Mello já não trabalha mais na Bandnews. Eu a localizei na Banda B, outra emissora de Curitiba.

Pouco antes de entrar no ar, ela falou comigo por telefone. “Lembro vagamente desta história”, contou. Você prestou depoimento à Justiça? “Não lembro, posso ter prestado”. Quando eu li o que a Justiça relatou sobre seu depoimento, ela disse que ocorreu, sim, o depoimento, mas que não havia registrado na memória em razão da falta de notoriedade do Moro à época.

O Moro não era ainda o MORO, entende?”, afirmou. Houve alguma pressão do Malucelli para que as gravações da escuta não fossem divulgadas? “Não, de jeito nenhum. Foi uma decisão minha e do meu chefe na época, Gladimir”, respondeu, e em seguida disse que entraria no ar e que não poderia mais falar.

Em outra ação, apresentada como recurso perante o Superior Tribunal de Justiça, existe o registro de um depoimento de Moro prestado à força-tarefa do Ministério Público Federal na época, da qual fazia parte o procurador da república Carlos Fernando dos Santos Lima. É relatado que, no grampo clandestino, há a gravação de uma conversa entre Moro e o advogado e amigo Zucolotto.

(…) foram ouvidas as conversas referentes às fitas apreendidas e que constam nos autos, podendo o depoente reconhecer sua própria voz e diálogos mantidos com o Delegado de Polícia Federal Paulo Roberto Falcão, com o Procurador da República Vladimir Aras, com a Desembargadora Maria de Fátima Labarrère, com o Promotor de Justiça do Estado do Paraná Cruz (de Maringá), com um amigo de nome Carlos Zucolotto, com familiares (filha e esposa) e, segundo lhe parece, também uma conversa com o DPF Luiz Pontelb” (fls. 11/12 do Apenso I, volume I).

Apenas a partir desse instante (da obtenção dessa prova) é que o Magistrado pôde ser considerado vítima do delito estando, assim, impedido para o julgamento do feito. O MP, na mesma data da oitiva do Julgador, ingressou com a respectiva Exceção (fls. 281/284, do apenso V, volume II). Em 29.08.05, Sérgio Moro acolheu o pleito, dando-se como impedido” (fl. 285 do apenso V, volume II).

O juiz Sérgio Moro se mobilizou para que Roberto Bertholdo fosse condenado por crimes contra a honra. Sua mulher e o amigo Zucolotto atuaram no processo em que o advogado e lobista pretendia que fosse aceita exceção da verdade — isto é, quando a alegada injúria ou difamação são decorrentes de fatos ocorridos efetivamente.

O expediente da exceção da verdade não foi aceito, e as fitas foram colocadas sob segredo de justiça e jamais divulgadas, o que é correto.

Grampos ilegais atentam contra o direito à intimidade e à privacidade, princípio que o juiz Moro, onze anos depois, não respeitaria, ao divulgar conversas privadas e de autoridades com foro por prerrogativa de função ao Jornal Nacional, da TV Globo.

O que faria Moro de 2006 se julgasse Moro de 2016, quando as conversas da presidente Dilma, de ministros e dona Marisa Letícia foram expostas como gasolina atirada a uma fogueira que ardia em praça pública?

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