João da Silva*, Pragmatismo Político
Não seria necessária uma lupa para constatar que movimentos conservadores e reacionários têm espalhados os seus tentáculos sobre a educação brasileira, com o intuito de reconstruí-la de formas perniciosas. No último sábado (9), vimos em Ponta Grossa (PR) mais um capítulo dessa caminhada de duran. Ocorreu nesse dia na câmara pública da cidade a audiência pública “Ideologia de gênero”, na qual foi defendida a tese fantasiosa de que existe um “grande plano comunista”, supostamente coordenado pelo movimento LGBTTQ.
Com argumentos sem fundamentos e fontes sem referência, procuraram demonstrar as “doutrinações” que supostamente ocorrem em sala de aula. O MEC, para esse grupo, é concebido como uma entidade comunista subversiva que quer destruir os preceitos morais da família brasileira e os seus valores cristãos.
Durante longas exposições, foi sendo apresentando um discurso de ódio, fantasioso e delirante totalmente contrário a qualquer proposição séria de inclusão dos estudos de gênero nas escolas e muito aquém da universalidade e diversidade do debate científico inerente ao tema gênero nas escolas.
Assim, com o respaldo de falsos “aparatos científicos”, os dom-quixotes intimam jovens e velhos de mãos desarmadas, por medo das palavras de uma gente que não faz o jogo sujo dos poderosos e que não lambe as botas de duran. Por tudo isso e muito mais, a audiência prestou um grande desserviço à sociedade, atacando a liberdade ideológica, de expressão e sexual, determinada pela Constituição – e que está sendo solapada na prática do dia a dia por ações como essa.
O mais curioso é que essa patrulha de histéricos “inteligentinhos”, de temperamento autoritário, aparentam crer serem moderninhos, na “vibe” do “prafrentex” simulando de forma afetada uma tolerância que simplesmente não possuem. Portam-se como paladinos salvadores da pátria combatendo cavalos de troia que supõe existirem. Talvez seria de bom grado lembrar a turma que perdeu a noção do ridículo que não se combate o que não existe.
Trata-se de mais um acontecimento lamentável ocorrido na cidade que ficou conhecida como a capital da “Reaçolândia”. Ponta Grossa é a mesma cidade onde a sua Associação Comercial, Industrial e Empresarial, no início de outubro, publicou num jornal de grande circulação na região uma carta de apoio ao general Antonio de Hamilton Mourão, o qual falou na possibilidade de uma intervenção militar no Brasil.
No ano passado, a mesma entidade patrocinou uma chuva de ovos sobre um cartaz do deputado federal da cidade que votou contra o impeachment de Dilma Rousseff, na esquina mais movimentada do centro da cidade. A entidade é a mesma que, em 2014, defendeu que beneficiários do Bolsa Família não deveriam ter direito ao voto nas eleições.
Mais recentemente, houve outra demonstração de reacionarismo: um vereador-pastor ameaçou prender a cantora Pabllo Vittar se ela “inventar de sair nas ruas” da cidade.
E essas são só algumas das manifestações do conservadorismo profundamente incrustado na cidade. A audiência pública foi mais um efeito disso que só serve para incitar o ódio e dar mais um passo nas cruzadas anti-minorias e anticomunista.
Entretanto, a Casa Grande se ilude ao crer que estamos acuados. Todos nós estamos com a cabeça já pelas tabelas por causa da exacerbação do preconceito classista e da amargura provocada pela consciência emergente de injustiça social. Ao trabalhador e a trabalhadora que correm atrás do pão, é humilhação de mais que não cabe neste refrão. Engana-se quem acha que, diante de tudo isso, ficaremos quietos.
*João Da Silva é um morador de Ponta Grossa e revoltado com o conservadorismo da cidade.
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