Attilio Giuseppe*, Pragmatismo Político
Imagine a seguinte situação: Um professor de História contata um engenheiro, para averiguar uma rachadura recém-nascida na sala de casa do docente. Ao examinar, o engenheiro constata ser necessária a colocação de um pilar, pois a estrutura da construção foi abalada após tempestade da última quinta-feira e, assim, apenas uma intervenção retirará a casa do professor de um iminente acidente. Acertam ponteiros, orçamentos, planejamentos, prazos e data de início para a obra.
Posteriormente decidem tomar uma gelada e colocar a conversa em dia. Antes de adentrarem ao bar, deparam-se com um morador de rua implorando ajuda e o engenheiro vira seu rosto e comenta ao pé do ouvido do educador: “não entendo o motivo para estes caras não trabalharem, ao invés de pedir dinheiro! É muita vadiagem!“. Suas interjeições foram prontamente contrapostas pelo professor, que explica algumas situações históricas contribuintes fundamentais para a desigualdade social, disparidade de oportunidades, diferentes condições para formação acadêmica, dentre outras situações, que acabam marginalizando um grande grupo de pessoas e impedindo que elas reingressem na sociedade. Eis que o engenheiro solta a seguinte resposta: “não concordo! É só correr atrás, que qualquer um chega lá”. Depois de algumas argumentações do professor, seu colega afirma com mais rigor, que possui um ponto de vista diferente e discorda completamente das explicações dadas.
Obviamente, esta é uma narrativa fantasiosa e demasiadamente generalista, no entanto, ela retrata um fenômeno realista e atual: o menosprezo às Ciências Humanas. Ninguém questiona um engenheiro, arquiteto, mecânico ou médico (a não ser, um também especialista na área). Talvez, a única carreira de humanas vista com maior dose de reverência seja o Direito, que evidentemente é específica e acaba afastando palpiteiros. Matérias como: Sociologia, História ou Ciências Políticas, por exemplo, não são vistas como ciências pelos leigos, apesar de possuírem exigente rigor metodológico e um conhecimento vasto. São tratadas como “papo de boteco”. Todos possuem “opiniões” e são capazes de discordar de um especialista, mesmo não tendo estudado estas matérias.
Quando se fala em ditadura então, está cheio de pessoas que “viveram” este período e, portanto, se sentem com total respaldo para “opinar”. Enquanto o especialista nestas áreas passou anos estudando, pesquisando e analisando, leigos se apegam ao senso comum e se sentem no direito de questionar, mesmo sem pré-requisitos para tal.
Fundamental entender, que a opinião, para possuir alguma validade e credibilidade exige conhecimentos conceituais, históricos e real compreensão de processos políticos, econômicos e sociais. Não basta acompanhar os noticiários, primeiro, por serem extremamente parciais e segundo, por não transmitirem ensinamentos técnicos, que cada área de estudo exige.
Se uma pessoa não formada em Medicina é incapaz de receitar um remédio, devido à falta de conhecimento quanto ao funcionamento do corpo humano, como opinar sobre política, sem conhecer conceitos básicos?! Até socialismo e comunismo, ideias primárias para os estudantes da área de Humanas, as pessoas pensam saber, mas não cansam de expelir preconceitos pautados em senso comum.
Portanto, a ideia não é eliminar o debate, muito menos excluir dele qualquer um que não seja especialista, todavia é impossível emitir uma visão sem prévias pesquisas e estudos. A área das Ciências Humanas é extremamente complexa, por permitir interpretações e abstrações, mas isto não autoriza o interlocutor falar qualquer coisa e defender-se com a capa da “opinião própria”. Este é o caminho para defender falas preconceituosas, visões distorcidas e ser manipulado pelas tendências midiáticas.
Nestes casos não tem opinião, mas sim, falta de conhecimento.
*Attilio Giuseppe é historiador, professor e colaborou para Pragmatismo Político.
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