Uma entrevista com um neonazista homossexual
“Não acho que Hitler, pessoalmente, quisesse matar homossexuais”. Não gostam de imigrantes mas gostam de sadomasoquismo homossexual. Uma entrevista com um neonazista gay na Rússia
Nick Chester, Vice
Há uns tempos entrevistamos uma malta da cena neonazi malaia. Todo o conceito de nazismo malaio era confuso, principalmente porque uma das grandes referências nazis é o ódio contra todos aqueles que não sejam arianos, e na Malásia, por norma, ninguém é branco. Ainda assim, isso não foi impedimento para que os nazis malaios andassem por aí com suásticas, fazendo a saudação nazi e dizendo que odeiam os estrangeiros.
Outro grupo de neonazi que não se preocupa em ser coerente com os princípios de Hitler é o grupo de neonazi gay russo. Como se devem lembrar, o Führer e os seus camaradas do Terceiro Reich não amavam os russos nem a homossexualidade. Estima-se que 100 mil homossexuais foram presos entre 1933 e 1945, e cerca de dez mil morreram em campos de concentração.
As coincidências com os malaios podem ser vistas em diferentes detalhes históricos como a perseguição desenfreada e o genocídio que parecem esquecer.
O primeiro grupo com o qual me encontrei chama-se União de Gays Patrióticos Russos, cujos membros defendem teorias estranhas que dizem que apenas os gays podem ser verdadeiros patriotas russos. Também aprendi que há um grupo chamado Socialistas Arianos Nacionais e outro chamado GASH (Grupo Skinhead Ariano Gay). Como este último tinha um nome mais fixe, optei por falar com um dos seus elementos, o Balu, em VK.com, a rede social da Russia que equivale ao Facebook.
Olá, Balu. Podes dizer-nos algo sobre a ideologia por detrás do GASH?
Balu: A nossa ideologia consiste em limpar o planeta das nacionalidades sujas. Lutamos pela pureza do sangue, pela pele branca e por pessoas fortes e belas. Não aceitamos que rapazes e raparigas brancas namorem com pretos. É nojento ver essas relações inter-raciais. Para quê partilhares a tua vida com esses desgraçados quando podes estar com homens brancos saudáveis?
Porque há pessoas saudáveis de todas as raças. Sabes, muitas pessoas não relacionam nazismo e homossexualidade, porque é que achas que isso acontece?
Acho que isso está baseado num estereótipo e, inicialmente, os heterossexuais dominavam o movimiento nacionalista. A opinião pública também chama bárbaros aos nacionaistas, chama-lhes homicidas e sei lá que mais. Talvez por isso as pessoas achem que para se ser nacionalista é necessário ser um guerreiro e não ter medo, mas os gays representam a doçura, a amabilidade e o inofensivo. Na imaginação popular, não faz sentido que os homens que preferem o lado forte e glamoroso da vida possam lutar pelos seus direitos e as suas ideias.
Há quanto tempo é que o GASH existe?
O nosso movimento existe há mais de 20 anos na Rússia. Tem relativamente pouco tempo, mas está muito desenvolvido. Nós estamos a ficar atrás dos restantes países europeus e dos Estados Unidos, mas temos uma forte vontade de lutar pelo bem da causa ariana.
Quer dizer que há movimentos parecidos nos EUA e na Europa?
Sim, claro que há. Eles ajudaram-nos a definir e a dirigir a nossa atividade na direção correta.
O GASH é o único grupo skinhead racista que conheces?
Neste momento, entre os nazis gays, é o movimento mais conhecido. Aquilo que acontece é que a maioria dos skinheads gay não se reúnem em torno do GASH mas usam os mesmos métodos para reafirmar a sua influência. Simplesmente não se focam em atrair a atenção das pessoas. Apesar de não gostarmos de ter demasiada atenção, queremos que todos saibam quem somos e por aquilo que lutamos.
Estás ligado a outros grupos gay?
Cooperamos um bocado com a comunidade gay normal, sim. Algumas vezes odiamos-los, porque cada uma das nossas atuações tem um resultado e eles só conseguem fazer com que a situação entre os homofóbicos e os gays piora.
Achas que a existência do GASH é positivo para a Rússia? E para os direitos dos gays na Rússia?
Não nos consideramos heróis ou personagens particularmente vencedoras. Temos métodos agressivos mas que realmente funcionam. Lutamos por todos, não apenas por nós. Tentamos limpar este mundo daqueles que não interessam e que não são dignos de estar neste planeta.
Wow, ok. O que achas dos skinheads nazis homofóbicos?
Nem todos os nacionalistas heterossexuais são homofóbicos. Muitas vezes até são homossexuais latentes. Lutamos contra os nacionalistas homofóbicos da mesma forma que lutamos contra qualquer outro homofóbico. Não são um grupo especial para nós.
Também lutam contra os grupos de nazis homofóbicos?
Sim, lutamos contra os homofóbicos. Não nos interessa a cor da pele ou a sua nacionalidade. Não entendemos o porquê dos nossos irmãos nos enfrentarem. Depois de tudo, não temos nada contra os heterossexuais, e não queremos tornar gay todo o planeta.
Quantos membros tem o GASH?
É difícil dizer a quantidade exata, uma vez que um em cada 50 gays nacionalistas se inclina para o movimento. No grupo em que eu estou, há cerca de 1500 ou 1700 membros permanentes em Moscovo e e noutras áreas ao lado. Além disso, há outras comunidades de gays nacionalistas na cidade e há um grupo de GASH em cada cidade.
Há lésbicas no GASH?
Algumas lésbicas já nos contactaram, mas explicamos-lhes que não há lugar para elas no nosso grupo.
E para os nazis transgênero?
Não há transexuais entre nós e não acho que possam vir a estar.
Porquê?
Acreditamos que estamos em guerra e não há lugar para mulheres e homens que se consideram mulheres. O fato de que esta é uma luta apenas para homens é uma parte integral da nossa ideologia.
Pareces fazer questão de sublinhar a masculinidade. O que achas dos gays que são menos masculinas? Continuam a aceitá-los no grupo?
É uma pergunta complicada. Não posso dar-te uma resposta definitiva, uma vez que todos os membros são vistos como indivíduos. As pessoas devem ter certas qualidade e acreditar nas nossas ideias. Têm que entender que pode ser necessário dar a vida por uma ideia e pela comunidade.
Ok. Em termos sexuais, o que é que gostam de fazer?
A nossa vida sexual consiste genericamente em BDSM, especialmente o sadomasoquismo. Os nossos irmãos não estão interessados em ternura e lençóis de seda. Nós fazemos cenas realmente masculinas.
Significa isso que o BDSM está ligado à ideologia do GASH?
Sim, estão juntos como o fogo e o fumo. Quase todos os nacionalistas têm um piercing, botas de cabedal tradicionais e calças azuis, que se são desde há muito um dos nossos fetiches sexuais, bem como as cabeças rapadas. Por esta razão, vemos o sexo de uma forma mais agressiva. É parecida à paixão primitiva. Alguns skinheads têm escravos, mas normalmente não são nacionalistas. O sexo para nós é algo sagrado. É similar à forma como os crentes olham para Deus. O sexo é a transmissão da paixão, emoções, prazer e — por último mas não menos importante — esperma no corpo de um irmão. Damos parte de nós. É uma parte muito importante da nossa vida sexual. Visto de fora, pode parecer que não tratamos o sexo com cuidado, mas não é o caso, cada relação sexual entre irmãos é algo muito profundo. É uma cerimônia secreta entre fiéis.
Como respondes aos que dizem que o nazismo e a homossexualidade não são propriamente amantes?
A nossa orientação sexual não é uma barreira para sermos nacionalistas. O espírito do nacionalismo pode estar presente em cada um de nós. Na Rússia, os direitos dos gays estão muito restringidos e não podemos ficar sentados em silêncio enquanto matam uma pessoa só por ser gay. Muitas das pessoas do Cáucaso opõem-se aos direitos dos gays. Alguém tem que aliviar a pressão que eles praticam através da força física.
Ok, para terminar, o que dizes àquelas pessoas que dizem que o Hitler não gostava de gays?
Nessa altura foram tomadas medidas muito agressivas mas que funcionaram a larga escala. Não acho que o Hitler, pessoalmente, quisesse matar os gays, mas a ideologia assim o exigia.
Leia também:
Neonazistas que atacaram jovem gay em Fortaleza são convocados para depor
Neonazista agride jovens em São Paulo e recebe apoio nas redes sociais
Neonazistas cortam orelha, queimam e marcam garoto homossexual com suástica
Conheça o ‘mapa neonazista’ no Brasil
Neonazistas do séc. XXI promovem ataques contra deficientes e homossexuais