Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
Como só acontece todos os anos nessa época, não faltaram críticos ao Carnaval. A crítica, pra se legitimar, é dirigida aos gastos públicos direcionados às festas. Segundo os especialistas de ocasião, tais verbas deveriam ser empregadas nos serviços básicos, sempre insuficientes. É como se, pruma pessoa viver, basta ter saúde, educação e segurança. Cultura, lazer e outras subjetividades seriam dispensáveis.
Evidente que essa crítica à festa mais popular do País está relacionada justamente a isso, ao seu caráter popular. À sua ligação com a periferia e com os negros. Na escravidão, era facultado aos pretos cativos as suas festas e seus ritos religiosos. Isso, claro, nos arredores da senzala. No carnaval, no entanto, a festa sai da “senzala” e toma conta das avenidas, sagrado local dos sedãs luxuosos, pertencentes à classe média alta ou alvo de cobiça dos emergentes; assim como das SUVs, que servem pra reforçar a sensação de masculinidade dos tiozinhos de cinquenta.
Pros críticos, o Carnaval é um ajuntamento de ociosos que se encontram pra cometerem atos promíscuos e de beberagem. Ou seja, nada que não aconteça em outras festas, inclusive as ditas com caráter histórico-cultural, que também, em regra, recebem incentivos financeiros do poder público.
Mas nos desfiles das escolas do Rio de Janeiro, pelo menos três agremiações mostraram o quanto se pode usar o Carnaval como meio de se discutir problemas sociais.
A Beija-Flor, que venceu, escancarou a corrupção brasileira. A Mangueira criticou o Prefeito-Pastor que, por preceitos religiosos, não queria investir na maior festa da cidade.
Mas a que mais causou alvoroço foi a até então relativamente desconhecida Paraíso do Tuiuti.
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Ela não fez uma crítica genérica aos problemas sociais brasileiros ou mesmo à corrupção latente. Foi específica, objetiva. Acusou o Governo(?) que aí está de literalmente se vender ao sistema neoliberal; comparou a Reforma Trabalhista a uma volta ao Escravismo; sugeriu que os paneleiros que reverenciavam o Pato da Fiesp não eram nada mais do que marionetes guiadas por gigantescas mãos. Mãos brancas, claro.
Para aqueles que defendiam que todo o dinheiro do Carnaval devesse ser investido em Educação, por exemplo, a Paraíso de Tuiuti deu uma aula de sociologia atual brasileira. Eu torci pra que ela vencesse. Acabou, contudo e como simbologia maior, ficando de vice.
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Já tem jornalistas alertando pro fato da seletividade do tema, posto que deveriam falar também dos escândalos do Petrolão e do Mensalão, por exemplo. Ou seja, deveriam, direta ou pelo menos indiretamente, também falar mal do PT.
Ano que vem terá Carnaval novamente. Se alguma Escola quiser se aventurar, que maldiga o PT, já que no Carnaval é tudo liberado. Resta saber se o público da Sapucaí vibrará tanto como o fez ao final do desfile, entoando o clássico Fora Temer!
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*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha e colaborou para Pragmatismo Político
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