André Falcão*
“Só sei que nada sei”, já dizia Sócrates na Grécia Antiga, ensinando-nos a ser mais conscientes de nossa ignorância, ou de que não podemos saber tudo, muito menos tudo sobre tudo. Aliás, dizem que não foi bem assim que o velho filósofo falou (nem sei se era mesmo velho quando falou), mas que importa? E aí me lembrei de outra frase bem menos famosa, e bem mais atual, esta atribuída a Melânia Ludwig (digitei a frase e fui pescar no Google a autoria), que quem sabe em um belo dia, quem sabe até se ao pé de uma macieira como Newton (mas não há notícia de que nessa hora uma maçã tenha vindo ao solo), afirmou que “a gente está sempre aprendendo, porque viver é uma aprendizagem constante”. Interessante é que esta frase é tão comum, mas tão comum, que eu a conhecia, sabe-se lá como — talvez meio que por osmose —, o que significa que essa mulher né fraca, não. Ou é?
Ok, tudo bem, fui à Grécia e acabei na Melânia (se enxergarem algum duplo sentido, asseguro, não foi a minha intenção), passando por maçãs e aprendizagem por subconsciência, para constatar que ambos estão certos. Empiricamente certos! Experiências pessoais me deixam à vontade para assim asseverar (esta, reconheço, é feia; parece nome de um velho avarento e cruel: “seu” Assevero).
Venho aprendendo, pois. Aprendi, por exemplo, que um dos substantivos mais bonitos da nossa maltratada língua, e mais identificados com o objeto a que dá nome (bicicleta), fora irremediavelmente substituído por uma palavra estrangeira, pra variar inglesa: bike. Ora, a bicicleta, você há de concordar, não poderia mesmo ter outro nome que não bicicleta: magra, delicada, sinuosa. Mas se eu não aprender a dizer bike, daqui a algum tempo corro o risco do vendedor não me entender. Nem ninguém com menos de vinte e poucos anos.
Aprendi, também, que “pedalada fiscal”, expressão a que fui apresentado há pouco tempo pela grande imprensa nacional, não era uma reunião de bikers (ciclista igualmente vem caindo em desuso) que usavam bicicletas como meio de transporte enquanto exercitavam (sem trocadilho) seu mister fiscalizatório. Tipo os fiscais de renda, do trabalho, da alfândega, de jogo de roleta, ou mesmo os fiscais da vida alheia, conhecidos como fofoqueiros, o que me remete à fofoca, mais uma palavra perfeita que a minha fiscalização não pode deixar passar sem registro: fofoca é o melhor substantivo para designar a fofoca, né não? Tá, mexerico também é ótimo.
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“Pedalada fiscal” seria, na verdade (olha o Google, de novo), uma “operação orçamentária” não prevista na legislação do país, realizada por um governo, via da qual o repasse de dim-dim aos bancos públicos e privados eram adiados para aliviar a situação de caixa em determinada época. E aí de cara já senti que a velha bicicleta, não bastasse o assassínio sofrido pelos pés de seus próprios compatriotas (digo, pela boca), estava agora meio que sendo exumada para submissão a escracho público. Afinal, praticar pedaladas (fiscais) não seria legal, no sentido de massa, maneiro, bacana. E no outro sentido também, asseguravam alguns. E embora não se dê na magrela (as tais pedaladas) não dá pra desvincular pedalada, qualquer que seja, da magra. Mas isto foi só um tempo. Estranhamente logo deixou de ser ilegal, e agora até o termo já caiu em desuso. Vida brevíssima. Muito mais curta do que a crença de que ovo é ruim para o colesterol, margarina é melhor que manteiga, e sexo… Não, tá tudo certo com sexo. Ufa! Dar suas pedaladas também pode. Mas melhor que seja só na bicicleta ou no máximo nos pedalinhos. A não ser que você esteja recém-operado de hemorroida ou às vésperas do PSA.
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*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político
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