O cinema político feito por paixão e o feito por encomenda
Eisenstein, Leni Riefenstahl, José Padilha e as diversas formas do cinema político
Rogerio Maestri, Jornal GGN
Mais ou menos como o cinema erótico e pornô há uma tênue distância entre os graus do cinema político, há o cinema político feito por paixão e há o cinema político feito sobre encomenda.
Não há diretor de cinema que não tenha suas convicções políticas, logo qualquer filme pode ser classificado de acordo com uma linha política e não dizer que um filme é engajado ou não. Porém o que pode distinguir os cineastas entre si, ou mesmo em fases de sua carreira, é possível uma divisão da ação por convicção e a ação sobre encomenda.
Para não ficarmos estigmatizando diretores de direita podemos separar muito bem dois filmes do grande Sergueï Eisenstein, o Encoraçado Potemkin (1925) e o Alexandre Nevski (1938), o primeiro, que os apressados diriam ser um filme mais político do que o segundo, na realidade poderíamos classifica-los como o primeiro feito por convicção e o segundo por encomenda. De 1924 a 1927, Eisenstein produziu três filmes, que apesar de já serem subsidiados pelo governo Bolchevique, eram filmes que representavam a suas convicções do diretor, já em 1938 ele faz um filme sobre um herói russo do passado que representaria a Mãe Rússia, foi um filme sobre encomenda que fica claro pela perda de qualidade em relação aos anteriores que andou parelho pela perda de convicções pelo regime stalinista da época.
Por outro lado, temos Leni Riefenstahl que em 1932 fica fascinada pela teatralidade do Führer nos seus discursos e filma voluntariamente um curta metragem sobre a 5ª convenção do partido Nazista, este filme foi banido posteriormente da Alemanha pois nele aparecia Ernst Röhm, líder da SA, que foi assassinato a mando de Hitler em junho de 1934 no episódio (pode até ser considerado um episódio de uma série!) da Noite das Facas Longas. Posteriormente, Leni realizou mais um dos seus filmes, considerado o melhor de todos tanto em termo de qualidade como em termo de propaganda política, o filme Triumph des Willens (1935) (O Triunfo da Vontade), em que mostra o triunfante Adolf Hitler como um produto da sua vontade individual e do seus coadjuvantes (o povo alemão e o partido nazista). De novo aqui tem-se um filme em que Leni Riefenstahl, mostra a sua convicção através da fantástica peça de propaganda nazista produzida.
É interessante mostrar que nos filmes de Eisenstein feitos por convicção, o artista principal era o povo, já tanto no filme Alexandre Nevski como nos filmes de Leni sempre há um personagem principal que configura a imagem de poder e bravura.
O nosso cineasta de direita, José Padilha, criou primeiro um personagem nos seus filmes Tropa de Elite, configurando o heroísmo e a bravura na figura do Capitão Nascimento, que com o seu novo personagem da série de TV procura em parte reproduzir o capitão. Porém agora com maior envolvimento político mais claro e evidente ele não consegue achar um personagem real, no caso o povo nos filmes de Eisenstein e de Hitler no caso dos filmes de Leni Riefenstahl, que possam retratar as suas tendências direitistas. Por exemplo, o ideal seria um Jair Bolsonaro, que além de direita é também capitão, entretanto devido as inexistentes capacidades dramáticas que este capitão apresenta e a sua turba não é nada organizada e cinematograficamente consistente. Para realizar os seus sonhos ocultos de Padilha (atenção isto já é uma mera especulação!) ainda não nasceu alguém a direita para o grande papel, e pior os personagens da história do Brasil dos quais se pode tentar criar uma história convincente, são de esquerda. Um Getúlio Vargas, um Leonel Brizola ou um Lula, não tem um currículo que se preste a colocar posições de direita ao longo de sua vida, e pior uma direita entreguista.
Em resumo, por melhor que seja José Padilha como um diretor politizado, quando lhe fazem uma encomenda, falta para ele o artista principal, e recriar o Capitão Nascimento só mesmo numa série de segunda para a TV.
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