A eleição de Joaquim Barbosa seria uma vitória para os negros no Brasil? A provável entrada do ex-ministro do STF na disputa presidencial joga no ar a dúvida se a sua chegada ao poder implicaria em medidas efetivas pela igualdade racial
Marcos Sacramento, DCM
A provável entrada de Joaquim Barbosa na disputa presidencial joga no ar a dúvida se a sua vitória implicaria em medidas efetivas pela igualdade racial.
Tirando o fator simbólico de um negro ocupar pela primeira vez a presidência da República após a redemocratização – Nilo Peçanha, presidente de 1909 a 1910, foi o único negro a comandar o pais –, não há indícios de que Joaquim Barbosa faria um governo comprometido em diminuir os abismos sociais provocados pela estrutura racista que formou o Brasil.
Nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2003, pelo então presidente Lula, JB carrega algumas credenciais que o habilitam a encher de esperança os eleitores desavisados. De família pobre, fez carreira no Ministério Público e na área acadêmica antes de se tornar o primeiro presidente do Supremo negro.
É autor do livro “Ação afirmativa & princípio constitucional da igualdade”, no qual analisa aspectos jurídicos e filosóficos das ações afirmativas nos Estados Unidos. Em 2012, no STF, votou a favor da constitucionalidade das cotas raciais em uma ação do partido Democratas contra o mecanismo de inserção de negros no ensino universitário.
Durante uma entrevista ao risonho Roberto D’Avila, admitiu que quando criança chorou por sofrer racismo e refutou a insinuação do entrevistador de que no Brasil a discriminação social prevalece sobre a racial.
Um olhar mais acurado sobre essas questões revela que JB está longe de ser um defensor intransigente da causa negra. No episódio da votação da legalidade das cotas, seu voto foi igual ao dos companheiros do STF, todos brancos.
Embora tenha dissertado para Roberto D’Avila a respeito da existência do racismo estrutural, se esquivou da ideia de que sua nomeação no STF tenha sido uma forma de lutar contra o racismo.
“Não acho que eu tenha vindo pra cá (STF) para combater o racismo. Eu sempre achei que a minha presença aqui contribuiria para desracializar o Brasil, desracializar as relações, espero no dia em que sair daqui os presidentes saibam escolher bem as pessoas pra cá e escolham os negros com naturalidade”, disse JB na entrevista de 2014, assumindo um discurso que não soaria estranho na boca do Fernando Holiday, se o vereador anticotas fosse mais elegante com as palavras.
Frequentador do Twitter, JB andou dando umas alfinetadas em Michel Temer e pitacos sobre política internacional, mas não gastou caracteres para falar do extermínio de jovens negros.
Episódios recentes como a morte da vereadora Marielle Franco e o assassinato de cinco jovens em Maricá (RJ) passaram em branco.
A última coisa de que a causa negra precisa é do silêncio sobre esses casos. Silenciar-se tendo uma tribuna para se expressar, como JB tem, é tomar uma posição no debate político. Neste caso, a posição não suscita movimentos no sentido de conter a exclusão provocada pela cor.
Tão séria quanto o mutismo frente ao caso Marielle foi a afirmação do ex-ministro em relação à implantação de cotas no Judiciário.
“Não sei e estou de saída. Es ist mir ganz egal (em alemão, ‘para mim tanto faz’)”, disse a jornalistas nos tempos do STF, que o questionaram após o Censo do Judiciário revelar que apenas 1,4% dos magistrados do país se declara negro.
JB pode até usar as artimanhas do marketing político para minimizar esta afirmação e ganhar um verniz ativista que nunca teve, caso entre na disputa pela presidência. Mas o que disse ou deixou de dizer está lá, registrado para quem quiser ver.
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