Redação Pragmatismo
Juristas 11/Abr/2018 às 16:41 COMENTÁRIOS
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Juiz bom não é aquele que parece um galã de televisão

Publicado em 11 Abr, 2018 às 16h41

O juiz, o circo e a circulação circular do Estado de Exceção: magistrado bom não é o galã de televisão ou o que joga para a plateia, mas aquele que distribui justiça de maneira recatada e sempre obedecendo os limites da legislação

Sérgio Moro Juiz bom não é aquele galã de televisão

Fábio de Oliveira Ribeiro, Jornal GGN

O ideal dos filósofos é fazer a justiça transcender os interesses dos cidadãos. O desejo do cidadão, contudo, é sempre mesquinho. O que ele quer é privatizar a decisão.

O meu juiz será melhor do que o seu Direito! – diz o poderoso ao seu adversário. E fica decepcionado e vingativo quando o juiz não lhe dá razão.

A justiça humana deveria se colocar entre estes dois extremos. O homem é um ser impedido de transcender a si mesmo, mas isso não quer dizer que ele tenha que se transformar num diábolo nas mãos de uma das partes.

Os irmãos Marinho queriam ver Lula preso e condenado. Os desejos deles foram integralmente satisfeitos pelo Judiciário, que não somente se recusou a dar valor às provas produzidas pelo réu como atribuiu valor de prova incontestável do crime a acusação sacada contra Lula pelos jornalistas do jornal O Globo.

A justiça diabológica, ou seja, que segue a lógica do diábolo jogado pelos barões da mídia, cumpriu sua função privada. Mas para fazer isso deixou de ser pública. Ingressamos, pois, numa era pré-hobbesiana, em que o Leviatã se transforma num lobo a serviço de alguns homens.

Eu sou o juiz que vai abolir qualquer Direito! Disse o pistoleito que matou Marielle Franco, provavelmente o mesmo que eliminou a prova testemunhal.

Nenhum juiz vai reprimir minha conduta! Disse o militar que queria jogar Lula pela janela do avião e o policial que agrediu a candidata a presidente Manuela d’Ávila.

O Estado moderno avocou para si o poder/dever público de distribuir justiça por uma razão muito simples: pacificar a sociedade. Uma sociedade em que os juízes se colocam a serviço de uns e se negam a reconhecer o direito de outros não será pacificada através da auto-tutela. De fato, o crescimento da vingança privada é uma evidência indiscutível da falência do Estado.

Porque sou obrigado a pagar o salário de um juiz que não pode ou não vai assegurar meu Direito! Uma decisão judicial não depende da credibilidade do juiz. Afinal, sempre que profere qualquer decisão o juiz ofende os interesses de uma das partes. Isso não cehga a ser um problema, desde que o Direito (legislação, doutrina e jurisprudência) tenha sido respeitado.

O que depende de credibilidade é a estrutura por traz do juiz. É essa estrutura que ele mesmo compromete quando age como o agente público de interesses privados não tutelados pelo Direito.

Os membros do clã Marinho tem interesse privado no resultado da eleição. Todos os brasileiros com direito a voto tem. Portanto, o que deve ser tutelado pelo Estado é o interesse público. Numa democracia os candidatos se apresentam, fazem campanha e disputam os votos. Os mais votados são empossados nos cargos que disputaram.

A justiça não pode definir o resultado da eleição antes do pleito, eliminando um dos candidatos só porque os adversários dele desejam assegurar o resultado da disputa. Lula não deveria ser impedido de concorrer à presidência, mas foi exatamente isso que ocorreu através de um processo claramente fraudulento que resultou numa prisão injusta.

Em sua última manifestação pública, o ministro Ricardo Lewandowski do STF clamou pelo retorno do Estado de Direito. Ele tem toda razão. O ato violento praticado pelo Estado para atender o clã Marinho certamente acarretará um ciclo vicioso de violência. E em algum momento os próprios juízes acabarão se tornando vítima da violência privada que eles mesmos estimularam ao privatizar a justiça por razões eleitoreiras.

O Estado de Direito é um bem público que atende os interesses de todos. O Estado de Exceção apenas e tão somente espalha a barbárie e, por via de consequência, obriga seus integrantes a colher a barbárie que plantaram.

O melhor juiz é aquele que atende o interesse público! Ele não pode ser o meu ou o seu juiz, pois ninguém deve ter seus Direitos menosprezados e qualquer um deve sofrer a repressão dentro dos limites da Lei quando se coloca acima dela. Pagar o salário do juiz não é só uma desagradável obrigação, pois a distribuição de justiça é um bem que atende os interesses de todos os cidadãos. De fato, pagar o salário do juiz pode ser um prazer. Mas para que isso ocorra o juiz deve ser imparcial, ou seja, deve rejeitar o ideal inatingível de justiça e firmemente se recusar a ser um brinquedo nas mãos de algumas pessoas ou de uma rede de televisão.

É aqui, onde o circo foi aberto que o circulo irá se fechar. É preciso imediatamente recuperar a autoridade, validade e eficácia da Lei Orgânica da Magistratura. Ela não proíbe expressamente a super-exposição midiática dos juízes porque é autoritária e sim porque o recato protege não só a dignidade do juiz como também a credibilidade da estrutura que está por traz dele.

Juiz bom não é aquele que parece um galã de televisão e sim aquele que distribui justiça de maneira recatada e sempre obedecendo os limites da legislação! A privatização da justiça só se tornou possível e aceitável porque alguns juízes se deixaram usar pelos menos de comunicação. Ao fazer isso eles transformaram a sociedade em refém do Estado de Exceção. Portanto, não será possível retornar ao Estado de Direito sem antes remover do circo os juízes que se colocaram deliberadamente como fontes da circulação circular da notícia.

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