Aborto

Mãe irlandesa explicou por que vai votar ‘sim’ para o direito ao aborto

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Referendo na Irlanda pode mudar a lei e autorizar as mulheres do país a abortar legalmente nas primeiras 12 semanas de gestação. Mãe de duas filhas explica por que vai votar 'sim'

Oonagh McDermott diz que sua primeira gravidez foi “uma brutalidade“.

Com 14 semanas de gestação, ela descobriu que o feto apresentava uma anormalidade fatal. O problema era anencefalia, uma condição em que os ossos do crânio não se formam corretamente, resultando em lesões graves ao cérebro do bebê.

O médico informou Oonagh que seu bebê quase certamente morreria ainda no útero, mas que eles não poderiam interromper a gravidez. O médico lhe disse: “Não há nada a fazer. Volte para casa e veja como você fica.”

Oonagh, que vive em Edenderry, na Irlanda, disse ao HuffPost: “Dava para ver a cabeça malformada na tela. Todos os sinais vitais estavam muito fracos, e não havia função cerebral.”

Mas os médicos não puderam abortar o feto, porque a interrupção da gravidez é ilegal na República da Irlanda se tiver sido registrado um batimento cardíaco fetal, a não ser que a vida da mãe esteja em risco, inclusive de suicídio.

Me mandaram para casa e me disseram: ‘Quando você achar que tiver saído tudo, volte ao hospital’. Estavam esperando eu sofrer um aborto espontâneo em minha própria casa“, disse Oonagh.

Hoje mãe de duas filhas, na sexta-feira Oonagh vai votar “sim” à revogação da oitava emenda à Constituição. Se a medida for aprovada, o governo poderá mudar a lei e autorizar as mulheres na Irlanda a abortar legalmente nas primeiras 12 semanas de gestação. Se, após 12 semanas, a vida da gestante correr risco ou houver a possibilidade de dano grave à saúde dela, dois médicos poderão analisar se autorizam o procedimento.

A pena máxima para quem se submete a um aborto ilegal no país hoje é de 14 anos de prisão.

Oonagh McDermott, que tem 54 anos, vai fazer campanha e solicitar votos a favor do “sim” na sexta-feira, na esperança de que outras mulheres sejam poupadas de passar pela experiência devastadora que ela sofreu, que ela descreveu como “alguma coisa saída de um filme de terror“.

Em 2001, os médicos a mandaram para casa dizendo que não havia esperança para seu bebê, mas sem lhe dar qualquer conselho ou orientação sobre o trauma que estava por vir. Oonagh recordou: “No dia seguinte eu estava péssima. Pedi para tirarem o feto de mim, e eles se recusaram. Telefonei de novo no dia seguinte e expliquei que estava muito mal emocionalmente, mas eles disseram ‘sentimos muito, não há nada que possamos fazer’. Foram essas as palavras exatas. Disseram que teria que acontecer naturalmente.

Ela estava sofrendo dores fortes e sofrendo hemorragia intensa. Acabou abortando espontaneamente em casa. “Foi uma brutalidade, uma desgraça total. E o que aconteceu comigo não foi tão medonho quanto alguns outros casos. Sem entrar em maiores detalhes, ninguém me avisou que eu veria um feto sair inteiro, mas foi o que aconteceu. Nunca vou me esquecer daquilo – de ficar olhando para aquilo nas minhas mãos e ficar gritando sem parar.”

Oonagh acredita que o feto deve ter morrido pouco após a ecografia que revelou sua condição e que ela foi obrigada a continuar com o feto no ventre até sofrer o aborto espontâneo. Ela voltou ao hospital, onde foi confirmado que a gestação tinha terminado. Uma semana depois de ser mandada para casa, começou a sofrer hemorragia devida a uma infecção. Seguiu-se uma cirurgia de emergência.

Para Oonagh, hoje secretária de uma escola, uma mudança na lei lhe teria permitido uma experiência crucialmente diferente. “Eu queria que, quando fiz aquela ecografia, alguém tivesse me explicado: ‘Você tem uma opção: pode tirar o feto agora ou pode esperar. Se você esperar, o que vai acontecer é o seguinte. Se interromper a gravidez agora, será desse jeito.'”

Assim, se revogarem a oitava emenda, se isso abrir caminho para uma legislação que autorize o aborto por qualquer conjunto dado de motivos, não vai mais ser preciso esperar até um bebê com anencefalia morrer no útero. A mulher poderá participar dessa decisão, sendo que eu não pude, em momento algum.”

Oonagh recorreu a assistência médica particular em sua segunda gravidez, mas, infelizmente, sofreu novo aborto espontâneo. Como o feto havia morrido e não foi registrado nenhum batimento cardíaco, os médicos lhe perguntaram o que ela queria fazer.

Nunca vou me esquecer dessas palavras, foram tão poderosas. Minha obstetra me perguntou o que eu queria fazer, e eu falei que queria realmente tirar o bebê. Ela falou ‘sem problemas, volte amanhã.’

Em sua gravidez seguinte, de gêmeas, Oonagh abortou espontaneamente uma das bebês. Mas sua filha mais velha, Ellen, está com 16 anos hoje. Sua filha menor, Tara, nasceu há 14 anos com síndrome de Down.

Devido à condição de Tara, Oonagh também ficou fortemente afetada pela alegação feita pela campanha pelo “não“, dizendo que a revogação da oitava emenda levaria ao aborto de mais fetos com síndrome de Down – apesar de o governo ter garantido que deficiências físicas ou mentais não serão aceitas como motivos para justificar a interrupção de uma gravidez.

A campanha Love Both (Ame os Dois, que afirma promover a proteção da mãe e do bebê) lançou recentemente um vídeo protagonizado por Conor O’Dowd, 23 anos, que tem síndrome de Down e diz: “Amo minha vida. Por favor salvem os bebês com síndrome de Down.” O vídeo foi lançado depois de o primeiro-ministro Leo Varadkar ter dito que é errado a campanha utilizar pessoas com síndrome de Down em seus cartazes de campanha.

Oonagh diz que, como mãe de uma filha com síndrome de Down, sente-se ofendida com a utilização da síndrome para defender a manutenção da proibição do aborto. “Já ouvi gente dizendo que ‘se a emenda for revogada, não teremos mais pessoas com síndrome de Down, como na Islândia’. Refuto isso completamente, porque após 12 semanas de gestação ainda será contra a lei abortar pelo fato de o bebê ter uma deficiência“.

Acho muito sinistro, porque a organização Down’s Syndrome Ireland veio a público há cinco semanas para declarar especificamente que não quer que a síndrome de Down seja usada como argumento por nenhum dos dois lados neste referendo.”

Oonagh quer absolutamente que suas duas filhas tenham o direito de escolha quanto a levar uma gestação a termo. “Queremos que nossas filhas tenham o direito de optar. Elas podem muito bem vir a escolher manter a gravidez. Mas precisamos que elas saibam que terão o direito de escolher e que nós as apoiaremos, seja qual for sua opção.”

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Sara C Nelson, HuffPost

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