No mês em que completam dois anos da atual gestão, estatísticas revelam como o programa anti-povo de Temer e Meirelles fez o Brasil retroceder quase duas décadas
Ana Luíza Matos de Oliveira*, INEEP
Nesse mês completam dois anos de afastamento de Dilma Rousseff da Presidência da República e da ascensão de Michel Temer ao (su)posto de Presidente, à época ainda como interino, mas já provocando intensos reordenamentos no governo (com g minúsculo). Esses dois anos, em tese, deveriam ser de continuidade em relação ao programa eleito em 2014 e de continuidade em relação às regras e institucionalidades estabelecidas, em respeito à Constituição e à estabilidade democrática. Ao contrário, esse tem sido um governo de grandes mudanças em um período que deveria realizar uma transição mais suave para o governo que (esperamos) assuma em 2019.
As mudanças ocorridas foram muito mais profundas, bruscas e com mínimo ou inexistente debate público consistente. A começar pela desaparição dos ministérios do Desenvolvimento Agrário e o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, voltados ao combate das desigualdades, mas passando pelas ampliação da influência de grupos poderosos dentro do governo, como mostram a aprovação da Medida Provisória da Grilagem ou a Medida Provisória do Trilhão, que libera petroleiras internacionais de impostos que podem somar R$ 1 trilhão nos próximos 22 anos. E claro não se pode esquecer das reformas aprovadas pelo governo, como a fiscal (com a Emenda Constitucional 95) e a trabalhista. Isso só pra falar de algumas poucas medidas… “O Brasil voltou, 20 anos em 2”, é o slogan comemorativo do governo para a data. É só tirar a vírgula que fica perfeito.
Para o povo, Temer e Meirelles assumiram com a proposta de fazer o Brasil voltar a crescer e moralizar a política. Para o mercado, Temer e Meirelles assumiram com a proposta de colocar em prática o Ponte para o Futuro, como discutimos aqui. Mas, dois anos depois, o Brasil apresenta crescimento fraco, com pouca sustentabilidade e, não menos importante, com muito pouco efeito para a população, que hoje conta com quase 27 milhões de pessoas classificadas como “subutilizadas” (dentre os quais quase 14 milhões de desocupados segundo a última medição da PNAD Contínua, mas também aqueles que desistiram de procurar emprego e os que trabalham menos horas do que gostariam). Isso as pessoas sentem em seu dia-a-dia. E sobre moralizar a política, creio não ser preciso nem comentar.
Mas, de fato, o governo conseguiu implementar grande parte da agenda proposta lá atrás no Ponte para o Futuro (exemplos) para atender aos interesses do mercado, notadamente com a Emenda Constitucional 95 (popularmente “teto de gastos”), que restringe em linhas gerais o gasto social mas não o pagamento de juros, e a Reforma Trabalhista, que reduz as travas para demissão, permite contratos mais variáveis (no caso do trabalho intermitente), entre outras diversas medidas. Essa reforma retira muitos direitos dos trabalhadores e não coloca nenhuma contrapartida para os empregadores, tornando o jogo mais desequilibrado, o que é completado pelo enfraquecimento dos sindicatos, que se tornam mais importantes na teoria com a reforma trabalhista, que traz a prerrogativa do negociado sobre o legislado mas perdem as fontes de financiamento. A prometida segurança jurídica que seria trazida pela reforma ainda não foi confirmada, dadas as diversas interpretações da mesma e a insegurança dos próprios empregadores em utilizar-se de práticas previstas pela nova regulamentação.
Em todo caso, nas eleições deste ano (caso ocorram), está em jogo a legitimação do projeto aplicado por Temer e Meirelles: querem que a população escolha para o cargo executivo máximo da nação um candidato chamado “reformista”, aqui entendido como um candidato comprometido com reformas que reduzem o papel do Estado de lutar contra as desigualdades, como as aplicadas pelo governo Temer. No entanto, esse projeto já se mostrou ser altamente impopular, vide a baixíssima aprovação do governo Temer e a alta rejeição às reformas computadas em pesquisas de opinião diversas (e no entanto essa política continua, pois ela não foi feita pra agradar o povo).
Querem também defender a necessidade de um “candidato de centro” como sinônimo de “candidato reformista”, tal como usamos o conceito nesse texto. No entanto, um candidato que defenda reformas liberalizantes e o “legado” do governo Temer nunca será um candidato de centro propriamente dito, pois essa agenda é uma agenda neoliberal e isso precisa ser dito claramente. Querem passar a impressão de que defender essas reformas é algo com que todos concordam (pois obviamente na mídia tradicional grande parte do espaço só é dado a especialistas que reforçam essa impressão), que elas estão “acima do bem e do mal” e que defendê-las é ser “de centro”, mas é preciso colocar os pingos nos is e reforçar para a população os efeitos deletérios da aplicação desse projeto na vida das brasileiras e dos brasileiros.
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*Ana Luíza Matos de Oliveira é Mestre em Desenvolvimento Econômico pela Unicamp e professora-visitante da Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales (Flacso).
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