Você vai torcer para o Brasil na Copa do Mundo?
Brasil na Copa do Mundo: vale a torcida? Fato é que, toda vez que um tenaz brasileiro ergue uma taça, abre-se uma brecha na hegemonia. E essa fenda está pronta para ser arreganhada novamente
Álvaro Padilha*, Portal Disparada
Segundo Nelson Rodrigues, “o boteco é ressonante como uma concha marinha. Todas as vozes brasileiras passam por ele”. Por essa razão, pensar o Brasil através de suas espeluncas é quase ciência. Ou pelo menos é mais fácil que os inúmeros números, dados e estatísticas dos meus queridos companheiros de DISPARADA.
– Esses tempos, em ocasião do aniversário de uma amiga, estive num desses estabelecimentos, cada vez mais comuns, que têm cara de sujo, mas são limpos; grátis pra entrar e caro pra sair. Mais um dos redutos dos “meio intelectuais, meio de esquerda”, como diz Antônio Prata na sua antológica coluna.
Tocava samba num ambiente e choro no outro. Ironicamente, a casa estava cheia de brasileiros com cara de americano e, também – para gozo dos presentes -, de americanos com cara de americanos.
Amigo, já reparou no gringo quando viaja para o Brasil? Parece um monarca vaidoso, dando suas migalhas à parte mais “exótica” do reino. Muito por conta dessa força misteriosa que infunde na cabeça do nosso povo o anelo de ser um “vira-lata entre os homens”.
Entregamos, ao rei, o que for preciso: petróleo, minério e, se possível for, até nossos bens mais caros. Os culturais. Tudo pra mão do estrangeiro, que, “virtuoso e de moral inabalável”, administra nossa crônica mania de incapacidade. Bíblico: “tudo posso naquele que me fortalece”.
Penso o seguinte: – é compreensível que os descorados do primeiro mundo não se oponham a essa sentença que os exalta, mas é intragável ver-nos tolerando esse juízo vilipendiador do brasileiro.
Há esperança.
Em 1958, o Brasil comprovou a eficácia de um antídoto, que começara a ser testado anos antes, para a soberba do gringo e “viralatismo” nosso: a Seleção Brasileira de Futebol. Coincidentemente – e hoje já não se sabe quem puxou quem – o nosso futebol espigou junto do nosso Estado. Precisamos tanto de Getúlio Vargas quanto de Leônidas da Silva, Jair, Didi e Zizinho para construir nossa nação. Pelé, Tostão e Garrincha são tão valiosos quanto JK.
Fato é que, toda vez que um tenaz brasileiro ergue uma taça, abre-se uma brecha na hegemonia. A brecha que eleva um pobre mineiro de Três Corações ao posto de personalidade mais conhecida da Terra.
E essa fenda está pronta para ser arreganhada novamente.
Por isso, mais do que nunca, precisamos apoiar a seleção.
Eu sei que o 7×1 é uma doença incurável. Mas foi a torcida que transmitiu aos jogadores – já com a imunidade baixa – o mal de que padecemos. Não o contrário.
Não serve o apoio cínico e mentiroso de 2014, da mentalidade “viralatista” que capturei nos parvos frequentadores do bar. Isso pode contaminar de novo nosso plantel. Mentir para si mesmo é diferente de acreditar.
Adenor Leonardo Bachi, o Tite, parece ter criado novamente condições para nosso sucesso. Estamos diante de mais uma geração que tem talento, raça e magia de sobra. E tem Neymar. Mas ainda falta resgatar ao time a confiança de pertencer a um povo que sonha e vence, com a qual devemos contaminá-los.
O brio de ser quem se é deve habitar novamente a nossa cabeça, assim a bola entra e o País anda.
Estamos condenados à esperança: munam-se de cuecas e calcinhas da sorte. Vamos ostentar as cores da bandeira, pintar ruas, planar churrasco e comprar cerveja. – Rezem bastante a Deus, que também é brasileiro. Assim, no dia 15 de julho de 2018, nos embriagaremos adstritos nos botecos, falando bem de nós mesmos, fazendo ressoar o anti-destino do Brasil em nossas conchas marinhas.
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*Álvaro Padilha é músico, bacharel em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e editor do Portal Disparada.