Marque a opção pensar
Na sociedade tecnicista de produção, estamos nós, seres humanos, mecanizados. Tal softwares programados, não atentamos às possibilidades outras de resoluções de problemas
Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
Assinale a letra correta em menos de um minuto. Largue lápis e calculadora. Apenas analise a conta e as opções:
7/8 + 11/12 =
a) 0,
b) 1,8
c) 2,7
d) 10
e) 19,3
Esse desafio, sem as opções de resposta, foi proposto por uma educadora numa palestra a professores. O tempo já era exíguo. Mas nada mais parecido que um monte de alunos bagunceiros reunidos do que um monte de professores reunidos. Um zum-zum na sala, gargalhadas, todos querendo responder o desafio. Como alunos transgressores, meia-dúzia de professoras ignorando a regra fazendo conta no celular. A Diretora só não tomou uma atitude repreensiva porque o aparelho era o dela.
Dado o barulho e a iminência do fim da palestra, a oradora deu a resposta, criticando que os professores são bons nisso mesmo, dar respostas, e não em fazer os alunos chegarem nelas sozinhos. Criando possibilidades e hipóteses.
Como professor e fazendo uma autoanálise, digo que pode até ser. E, mais ainda, precisamos, nós professores, fazer os alunos pensar mais. E precisamos, nós sociedade, também pensar mais. Refletir sobre os vieses possíveis.
À resposta que a educadora deu ensinando:
Sete oitavos são quase oito oitavos, o que é um. Onze doze avos são quase doze doze avos, o que é um. Logo, explicou a palestrante, quase um mais quase um é quase dois. Na falta de alternativas pra assinalar, arredonda-se o resultado pra dois, ela disse e nos olhou buscando nossos ruídos de ahhh perplexos . Neste caso aqui, alternativa B, e não a D de Deus como finalmente se marca num chute desesperado.
Já tinha professora fazendo MMC pra chegar no resultado. Outras estavam perguntando como é que se faz o MMC, mesmo? Algumas, excitadas pela provocação, não prestaram mais atenção no restante da fala e estão até agora transformando a fração em números com vírgulas e, depois, na dúvida de como é a ordem das vírgulas na soma. As da Matemática não conseguiram disfarçar certo encabulamento.
Eu, que não sou de matemática e faço parte da turma que não se lembrava que nessas ocasiões deve-se aplicar o MMC – na verdade, também faço parte do grupo do fundão que sequer se recorda de como afinal se faz o MMC -, tentei fazer rapidamente uma conta de cabeça. Achei que tinha acertado: vinte e sete!
Na sociedade tecnicista de produção, estamos nós, seres humanos, mecanizados. Tal softwares programados, não atentamos às possibilidades outras de resoluções de problemas, sejam eles pessoais/subjetivos, sociais ou políticos, entre outros. É grave.
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A sociedade é complexa porque formada por pessoas complexas. Aos conflitos estabelecidos, não cabem somente uma forma de resolução. E nem há tão-somente uma opção em cinco.
No seu clássico filme Tempos Modernos, da década de trinta, Charles Chaplin insinuou que as máquinas estavam engolindo os homens. Talvez se filmasse hoje, ele sugeriria que os homens viraram máquinas (como tais, impensantes).
Humanos, é bom pensarmos antes de simplesmente aplicarmos o MMC, que eu ainda não lembrei como faz.
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*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”