Estamos vivendo uma "amostra grátis" do que seria um governo Bolsonaro
O discurso violento de Jair Bolsonaro saiu do campo simbólico e passou a se materializar diariamente pelas mãos de seus seguidores. A manifestação divergente não será tolerada sequer ao nível do indivíduo, quiçá da coletividade
Daniel Melo, Jornal GGN
Após o resultado do primeiro turno, os bolsonaristas estão se sentindo livres para se expressarem e agirem sem freios. Há do lado de lá uma certeza de vitória esmagadora no segundo turno e de que agora “quem manda são eles“.
Assim, ouvimos a falas preconceituosas e presenciamos violências físicas e psíquicas contra aqueles que se posicionam contrariamente, seja ativamente ou passivamente. Usar uma camiseta vermelha com a estampa de Lula é suficiente para atropelamento, dizer que votou em Haddad pode levar à morte.
Logo, o discurso violento do seu candidato saiu do campo simbólico e passa a se materializar diariamente pelas mãos de seus seguidores, com a anuência, pela omissão, de seu líder que “lava as mãos” dizendo: “não posso ser responsabilizado pelos atos de terceiros” e que “quem levou facada fui eu“. Sequer uma condenação, mesmo que hipócrita, ocorre.
Vivemos uma “amostra grátis” do que seria um governo Bolsonaro. Um governo onde o pensamento progressista , a manifestação de minorias, não será tolerado sequer ao nível do indivíduo, quiçá da coletividade.
A pacificação social defendida pelo candidato e seus seguidores é aquela da eliminação dos diferentes e não a da superação das diferenças.
Diante de tantos boquirrotos e trogloditas o discurso amenizador adotado por alguns se desfaz. Não, não! As palavras de Bolsonaro não são figura de linguagem, expressão sincera de um homem simples e logo inconsequentes. Não! Elas têm efeitos reais e têm significado e sentidos bem concretos.
O autoritarismo acompanha a violência física, a exemplo do candidato Bolsonarista ao governo do Rio que ameaçou prender o seu concorrente. Dias antes o candidato Bolsonarista havia participado de ato de depredação de placa simbólica a Marielle ao lado de dois brutamontes (ambos eleitos deputados estaduais).
Diante dessa amostra grátis, há a possibilidade do crescimento de um sentimento latente de vergonha por ser Bolsonarista, ao menos daqueles eleitores médio-classistas não fascistas.
Além disso, há eleitores de Lula que votaram Bolsonaro no primeiro turno, em especial em regiões pobres e nas periferias das cidades, os quais podem se identificar com as vítimas das agressões Bolsonaristas, num processo de empatia por já ter sofrido violências físicas da polícia ou simbólicas pela classe média e ricos (humilhação).
Soma-se ao efeito da amostra grátis o do tradicional “já ganhou“, o qual desmobiliza a militância. Assim, arrisco dizer que Bolsonaro terá menos votos no segundo turno que no primeiro, um esvaziamento eleitoral por aumento da abstenção e anulação de votos na sua base, o que pode lhe render a derrota.
Não quero dizer que venceremos, isso seria incongruente, a batalha é dura. Assim, continuemos sem otimismos tolos, porém não sejamos derrotistas, continuemos nosso trabalho de formiguinha.
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