Monitorei grupos pró-Bolsonaro durante uma semana. Veja as conclusões
Eu passei a última semana monitorando grupos pró-Bolsonaro no WhatsApp para um projeto. Estou escrevendo algumas conclusões e queria dividir com vocês as 3 coisas mais importantes que aprendi
Eduardo Noronha, via Facebook
Eu passei a última semana monitorando grupos pró-bolsonaro no WhatsApp pra um projeto. Estou escrevendo algumas conclusões e queria dividir com vocês as top 3 coisas que aprendi:
1- Não é sobre política. É sobre egoísmo.
Existe uma incapacidade funcional de perceber a sociedade como um todo. “Não me importa a ditadura porque EU não vou fazer nada errado. Não me importa a bandidagem ter armas porque EU vou estar armado. Não me importa ele fazer caixa 2 porque EU não quero o PT de volta“.
Aliás, o PT não é um partido de esquerda. O PT é tudo aquilo que desagrada ou vai contra meus valores: sistema de cotas? PT. Correios? PT. Tráfico de drogas? PT. Pedofilia? PT. Pink Floyd? PT. Partido democrata americano? PT. João Dória? PT. General Mourão falando merda? Petista infiltrado querendo minar a eleição do Bolsonaro.
2- É sobre machos fragilizados e pessoas frustradas profissionalmente.
Esse egoísmo que faz personalizar a política apenas a partir da própria experiência e culpabilizar a esquerda por tudo, até pelo que obviamente não é esquerda, extrapola a política. Se eu não consigo trabalhar direito, meus colegas são esquerdistas. Se eu não estou ganhando dinheiro, o governo do PT está me quebrando. Se tenho feedbacks negativos, meu chefe é mortadela.
Ficar rico é objetivo geral e a única coisa no caminho disso parece ser um governo de esquerda. A segunda atividade nos grupos é sempre a mesma: organização de reuniões de esquema de pirâmide e marketing multinível, principalmente Hinode. Existe uma dobradinha entre essa atividade e a militância pró-Bolsonaro nos encontros.
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Um pensamento semelhante permeia as relações pessoais. Mulheres estão mais feministas, então mais frescas e cheias de mimimi. Fotos de axilas peludas (masculinas) são enviadas diariamente e o feminismo é reduzido à falta de higiene. Inclusive pelas mulheres.
Questionamentos e debates são repelidos com um discurso de força: “Eu não fiz nove anos de muay thai para conversar. Dialoga ano que vem com minha Glock. Eu tenho um bastão chamado direitos humanos“.
3- É sobre escolher conscientemente a mentira.
Não se enganem. No núcleo duro da militância pró-Bolsonaro não há manipulados nem ingênuos. As pessoas compartilham fake news sabendo que é fake news e confirmando que fazem conscientemente quando questionadas. No jogo contra a esquerda, é preciso usar todas as armas.
Existe uma negação da racionalidade e uma aversão ao conhecimento em geral e às competências técnicas. A palavra do advogado sobre as decisões do STF não tem peso maior que as outras. A do jornalista sobre a reportagem da Folha também não. Tudo é reduzido à questão de opinião.
“Não adianta vir com palavras difíceis que a gente está fechado com o mito e não vai se confundir“.
Esse pensamento está relacionado com o que o Nobel de Economia Daniel Kahneman descreve em seu trabalho com WYSIATI (o que você vê é tudo que há). As pessoas estão em uma situação de conforto cognitivo em que não vão mudar de ideia mesmo confrontadas com fatos.
Mais do que entender a eleição, essa foi uma experiência que me fez entender as pessoas.
Essa é uma conclusão baseada em método de pesquisa, bibliografia e dez dias de estudo incessante em 06 grupos pró-Bolsonaro, dos quais tenho os prints.
Se você está considerando votar nesse candidato, é bom saber que está se colocando ao lado desse tipo de pessoa, com esse tipo de pensamento e comportamento.
E cuidado. Amanhã eles podem decidir que o PT é você.
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