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Por que a Pepsi anunciou o fechamento de sua fábrica no Brasil?

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Entenda a disputa que levou a Pepsi a fechar sua fábrica no Brasil e saiba o que está em jogo

A semana começou com a notícia de que a PepsiCo vai fechar sua fábrica de concentrado de refrigerante na Zona Franca de Manaus. A decisão da multinacional é mais um capítulo de uma disputa antiga entre o governo federal e grandes fabricantes de bebidas, a saber: Pepsi, Coca-Cola, Ambev e Heineken.

A disputa envolve denúncias de concorrência desigual, arrecadação de impostos, interesses de pequenos produtores de refrigerantes e o formato de funcionamento da Zona Franca de Manaus. Veja a seguir o que está em jogo:

A Zona Franca de Manaus

Parte dos fabricantes de bebidas, em especial grandes empresas, produz seu xarope de refrigerante na Zona Franca de Manaus. A decisão de instalar a produção ali se deve aos incentivos do governo com o objetivo de levar empresas para lá e desenvolver a economia local.

O principal incentivo é a isenção de impostos. No caso do xarope de refrigerante, o item pagava uma alíquota de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de 20%. Como as fabricantes produzem em Manaus, elas estão isentas dessa taxa. Além disso, os 20% se transformam em crédito tributário, recebido por quem compra o xarope das fábricas em Manaus. As empresas então ganham duas vezes, pois produzem em Manaus sem imposto e depois recebem créditos tributários através de suas engarrafadoras, que compram o xarope vindo da Amazônia.

As empresas que produzem na região estão reunidas sob o guarda-chuva da Abir (Associação (Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não Alcoólicas), entidade que reúne 60 empresas no total. Segundo a entidade, a produção gera 15 mil postos de trabalho na região de Manaus, contando empregos diretos e indiretos. O incentivo fiscal do governo para os produtores de refrigerantes envolve a produção local de insumos, o que em tese obriga essas fabricantes a comprarem matéria prima na região amazônica.

Qual a crítica?

Pequenos fabricantes locais de refrigerantes criticam há tempos o formato de incentivo da Zona Franca de Manaus ao setor. Reunidos na Afrebras (Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil) – associação representa pelo menos 132 companhias de refrigerantes, dentre elas o Guaranita Cibal, de Passa Quatro (MG), o Devito, de Catanduva (SP), e o Guaraná Pureza, de Riacho Queimado (SC) – eles afirmam que o modelo gera concorrência desigual, já que além de não pagar imposto sobre o xarope, as fabricantes recebem crédito através das engarrafadoras.

A Afrebras acusa ainda grandes empresas do setor de superfaturarem o xarope produzido em Manaus, aumentando ainda mais a distorção em relação a produtores que não estão na região. O assunto é alvo de uma investigação da Receita Federal. A Abir nega que haja superfaturamento.

Material divulgado pela Afrebras afirma que o preço do concentrado produzido em Manaus “chega a ser 20 vezes maior que o insumo produzido nos demais estados”. A lógica, segundo a Afrebras, é aumentar artificialmente o preço para assim ganhar mais nos créditos de IPI. A renúncia fiscal das multinacionais de concentrado localizadas na Zona Franca de Manaus foi de 9,1 bilhões de reais em 2016, diz a entidade. Isso tem levado à morte de diversas pequenas fabricantes de refrigerantes. Em 1960 eram 892 empresas no setor; em 2015 ficaram 235, diz a entidade.

O que mudou?

Em maio de 2018, o presidente Michel Temer decidiu reduzir a alíquota de IPI que incide sobre o xarope de refrigerante de 20% para 4%. O dinheiro seria usado para ajudar a pagar a conta bilionária do desconto no preço do diesel, criado após a greve dos caminhoneiros. Aparentemente, seria uma redução no imposto. Mas, com a isenção do tributo na Zona Franca de Manaus, a decisão na verdade reduziu o incentivo para quem tem fábrica na região. Com a nova regra, o desconto passou a ser de 4%.

A mudança gerou pressão das grandes produtoras sobre o governo. Chegou a circular a notícia de que a Coca-Cola deixaria o país, a companhia negou. A pressão das empresas era para que o governo Temer aumentasse o IPI para pelo menos 15%. Caso contrário, as companhias ameaçavam fechar 15 mil postos de trabalho na Zona Franca de Manaus.

Temer volta atrás

Em setembro, Temer voltou atrás e aumentou a alíquota do IPI para 12%, no primeiro semestre de 2019. Na decisão, a taxa cai para 8% no segundo semestre de 2019. Em 2020, o percentual volta a ser 4%. Dessa forma, a redução do incentivo para quem está instalado em Manaus ficou mais gradual, atendendo a uma das demandas dos fabricantes insatisfeitos, que criticavam a mudança de 20% para 4% como sendo muito brusca.

O decreto foi uma vitória das companhias de refrigerantes, mas não foi suficiente. A média da alíquota em 2019 ficou em 10%, abaixo dos 15% reivindicados pela Abir. Além disso, em 2020 o imposto volta aos 4%, valor inviabiliza a manutenção das fábricas em Manaus, de acordo com a entidade.

A Pepsi

Nesse contexto a PepsiCo anunciou essa semana o fechamento de sua fábrica de concentrado de refrigerante em Manaus. A PepsiCo afirma que a decisão de sair da região “foi tomada com o objetivo de administrar eficientemente nossas operações em todo o Brasil e posicionar a empresa para um crescimento de longo prazo, independente da recente mudança no regime tributário”. Segundo a Afrebras, a PepsiCo empregava 88 funcionários nesta fábrica, para um faturamento de 500 milhões de reais ao ano. A Pepsi não divulga informações sobre faturamento.

A empresa afirma que produção será redistribuída para outras plantas de concentrados da companhia, mas essa era a única fábrica de concentrados da Pepsi no Brasil; o produto pode ser importado do Uruguai. O fim da fábrica, inaugurada em 1998, levou ao fechamento e 51 postos de trabalho. A empresa diz que tem mais de 10 mil funcionários no Brasil e que continua comprometida com o país.

A Abir afirma que há o risco de outras companhias seguirem o movimento da Pepsi e deixarem a Zona Franca de Manaus.

E agora?

O tema tem sido debatido no Congresso Nacional. Um projeto de lei aprovado no Senado susta o decreto presidencial que reduziu o IPI de 20% para 4%. O projeto é de autoria de dois senadores do Amazonas: Vanessa Grazziotin (PC do B) e Omar Aziz (PSD). O texto alega que a medida é inconstitucional porque desrespeita o princípio da noventena – pela lei o aumento de impostos não pode ocorrer imediatamente, é preciso esperar um prazo mínimo de 90 dias.

O texto ainda precisa passar pela Câmara. No final de novembro, uma audiência pública sobre o assunto reuniu parlamentares e representantes do setor. “Não vamos aceitar chantagem ou blefe da Coca-Cola e da Ambev, que ameaçam sair da Zona Franca de Manaus”, disse o deputado Fausto Pinato (PP-SP) na ocasião. “A zona franca não produz laranja, limão, uva, erva-mate e [produz] muito pouco açúcar. O Amazonas só produz guaraná e açaí”, disse o presidente do Sindicato Nacional das Indústrias de Refrigerantes, Jairo Zandoná presente na audiência.

Com a mudança de governo, também cabe ao novo presidente Jair Bolsonaro decidir sobre a questão. No entanto parte da equipe econômica de Bolsonaro tem pouca simpatia à ideia de aumentar o incentivo. Como se vê, a guerra dos refrigerantes está longe de terminar.

Mariana Desidério, Exame

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