A solidão no tumulto
Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
Analisando comentários sobre textos/artigos políticos nas redes sociais, percebo que eles se dividem maniqueísta e invariavelmente em dois tipos: os elogiosos, que caracterizam o teor como fiel reflexo da realidade; e os críticos, que desqualificam totalmente o autor como o próprio texto. Na falta de argumentos, acham erros gramaticais para rebaixá-lo. Ou, dependendo do caso, como está mais amiúde hoje, acusa-se o texto de mimimi (sic).
Em ambas as situações, por estranho que pareça, conotam-se aspectos da solidão que vivemos nestes dias.
Aqueles que elogiam o texto não estão na verdade elogiando o texto, a ideia, o argumento ou o autor. Estão, isso sim, se autoelogiando. Eles se enxergam no texto. Identificam-se. O texto não os fez mudar de posição com a sua gramática rebuscada. Apenas ratificou, reforçando com argumentos provavelmente mais convincentes, sua crença. O leitor-concordante se sente certo, com a razão filosófica. Parabéns pra mim, pensa ele.
A outra face é a dos críticos ao texto. Esses, ao contrário dos acima, não se veem no que estão lendo. Excluídos, desesperam-se. Sentem-se sós. Percebem-se sós. E nessa ansiedade, se não conseguem rebater os argumentos, numa tentativa de trazer outros a si, desqualificam o autor. Ou evocam a gramática, apontando um imperdoável erro, o sujeito está separado do verbo por uma equivocada vírgula. Motivo pelo qual resta comprometido o argumento.
Somos egocêntricos, por isso, solitários. Não queremos estar com as pessoas. Queremos que elas estejam conosco.
A propagação de selfies e de momentos comercial-de-margarina em fotos com a família postadas nas redes sociais não são futilidades. São solidões compartilhadas. São pedidos para que as pessoas curtam, comentem, admirem ou, por que não?, invejem quem publicou. São clamores, enfim, para que os outros “estejam com”. Que não lhes deixem sozinhas num momento tão especial como o instante dum sorriso pra câmera.
Claro que isso não é completamente estanque. Humanos inteligentes, apesar de controvérsias (sobretudo no que tange a atitudes incondizentes com a minha concordância), somos capazes de mudar de opinião ao ponderar uma diferente da nossa. E podemos também compartilhar fotos de momentos família perfeita, despretensiosamente, sem esperar reações positivas, aproximações. Mas isso não é a regra. É a exceção que a confirma.
Desafio é, num momento de efervescência de ideias, de milhares de amigos virtuais, de momentos registrados (e publicados) em fotos, não nos sentirmos sós.
Não estar só é conseguir ter empatia (não é fácil) quando não nos enxergamos no outro; e também saber aproveitar, a nos bastar com a nossa melhor companhia. Nós mesmos.
*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”