O flerte de alguns de nós com Mourão pode nos afundar em um Governo que ao contrário do Bolsonaro, terá forças para desconstruir o Estado brasileiro, as garantias democráticas e os direitos da classe trabalhadora
Welitton Gerolane*, Pragmatismo Político
Desde a proclamação da República a presença militar na história política brasileira é muito forte, seja com Marechais e Generais que assumiram o poder, seja com os golpes patrocinados pelas forças armadas ou até pela tutela militar a governos civis.
A faceta atrás da qual se esconde o militarismo e até mesmo os seus interesses e objetivos podem não ter sido os mesmos em todas as vezes, mas se existe um ponto comum em todas essas vezes que o experimentamos é a ausência do povo na tomada das decisões.
Os militares agem pela força, foram treinados para ir a guerra e nela aniquilar os seus inimigos e quando tentam fazer política elegem como inimigos os setores da sociedade que pensam diferente deles e agressiva ou sorrateiramente tolhem a democracia e a possibilidade de expressão das suas oposições.
Outro dia, depois de um hiato temporal, um General assumiu a Presidência da República, dessa vez legitimado pelo sufrágio universal e como Vice Presidente eleito pelo voto direto exercendo a Presidência dentro das regras do regime democrático, começou a conquistar setores tanto dos radicais de direita que dão sustentação ao Governo Bolsonaro quanto de alguns setores da oposição, e pior, da própria esquerda.
Por óbvio que em contraste com o titular da Presidência que sequer consegue dar uma entrevista, discursar para lideres mundiais ou se afastar dos escândalos de corrupção que envolvem a sua família, o General Mourão se sobressai, comete menos gafes e parece saber onde quer chegar e quais estratégias seguir, faz com que pareça que ele é uma opção.
O General Mourão foi à imprensa se manifestar contra as ameaças que levaram Jean Wyllys a renunciar o seu mandato e dizer que tratava-se de um crime contra a democracia. Pouco mais de 50 anos antes, outro General assumia o poder e tranquilizava a nação dizendo que eleições livres seriam organizadas em seguida para restabelecer a democracia. Ambos enganaram muita gente, mas só um deles ainda pode ser impedido de liderar um Governo autoritário e impopular.
Mourão se quiser assumir o poder pode estar com a faca e o queijo na mão. Isso porque Bolsonaro parece saber lidar muito mal com a crise na qual esta envolvido e parece ter arrumado muito mais inimigos do que consegue enfrentar, aos poucos o êxtase dos seus eleitores com a sua vitória pode se transformar em decepção e rejeição. Novos capítulos no caso de corrupção de Flávio Bolsonaro ou a confirmação da ligação entre a família Bolsonaro e a morte de Marielle Franco podem ser letais ao seu Governo.
Por outro lado o General se decidir assumir o comando do país contará com a lealdade de seu escudeiro egocêntrico, Sérgio Moro, que convidado para ser Ministro pelo próprio Mourão e não por Bolsonaro pode se virar contra o Presidente da República, salvar a sua reputação e comandar uma investigação midiática capaz de transferir a faixa presidencial para o peito de Mourão. Poderá contar ainda com o STF que acovardado e tutelado pelos militares desde o golpe de 2016 deu sustentação ao Moro na prisão do Lula, ou poderá reatar uma aliança com a Rede Globo, que outrora deu sustentação a 21 anos de ditadura militar, e tem experiência em derrubar presidentes eleitos.
Nasceria desta articulação outro processo sem a participação do povo que subverteria a lógica do poder e daria inicio a um Governo também de extrema direita, muito mais forte que o Governo Bolsonaro e que depois de esgotada a sua popularidade ainda teria na força militar onde buscar a legitimação de suas atitudes.
Isso tudo pode acontecer, estar acontecendo ou até ser mera conjectura, mas a certeza que me parece óbvia a essa altura da história do Brasil é que este espectro do militarismo que nos ronda deve ser enfrentado, para a defesa da nossa democracia.
O flerte de alguns de nós com Mourão pode nos afundar em um Governo que ao contrário do Bolsonaro, terá forças para desconstruir o Estado brasileiro, as garantias democráticas e os direitos da classe trabalhadora.
Mourão e Bolsonaro precisam ser enfrentados e derrotados juntos.
*Welitton Gerolane é estudante do curso de Direito na UFPR e membro da executiva estadual da JPT-PR.
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