Apuração revela que o governo que vinha para “mudar tudo isso daí” se tornou generoso para parentes e amigos, que passam a se dar bem em cargos públicos
Jair Bolsonaro, presidente do Brasil (Imagem: Sergio Moraes | Reuters)
André Barrocal, CartaCapital
O governo Bolsonaro é generoso com seus parentes e amigos. O filho do vice-presidente, Hamilton Mourão, triplicou o salário no Banco do Brasil (36 mil reais). A empresária Leticia Catelani, amiga de Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, descolou um empregão na Apex (43 mil reais). Agora quem sobe na vida é uma amiga do assessor internacional de Bolsonaro, Filipe G. Martins.
Bruna Luiza Becker tornou-se assessora especial do ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues. Sua nomeação foi publicada no Diário Oficial da União de 30 de janeiro. Vai ganhar 13 mil reais por mês.
É do curso superior de Relações Internacionais que vêm sua amizade com Martins, o redator do discurso feito por Bolsonaro no Fórum Econômico Mundial, em Davos. Um discurso de seis minutos, embora o presidente dispusesse de 45 minutos para falar à nata global dos endinheirados.
De 2011 a 2013, Martins estudou na Universidade Federal de Pelotas (Ufpel). Ali, ele e Bruna fizeram parte da mesma gestão do Centro Acadêmico do curso de Relações Internacionais, como se pode conferir aqui. Martins e Bruna estudaram depois na Universidade de Brasília (UnB), onde o assessor de Bolsonaro formou-se em 2015.
A dupla tem afinidade intelectual. Os dois são discípulos do “filósofo” Olavo de Carvalho e, a exemplo do guru bolsonarista, acreditam na existência de uma trama comunista por trás de tudo.
“O marxismo e sua aplicação não visam produzir uma sociedade justa e igualitária, mas sim, renegar a natureza humana na construção de um novo ser, destruindo todo o legado cultural, os povos e as nações que se colocarem no caminho”.
Palavras de Bruna em um artigo escrito em 2013, intitulado “Marxismo cultural: a raiz do problema moral em nossa sociedade”. Depois do texto, uma deferência ao amigo: “Meus agradecimentos especiais às dicas e auxílio de Filipe Martins”.
Com sua visão sobre “moral”, Bruna tem tudo para dar certo na equipe do ministro da Educação. Vélez Rodrigues defende a volta do ensino de “moral e cívica”, por exemplo.
Dias atrás, Rodrigues taxou um jornalista de O Globo, Ancelmo Gois, de agente da KGB, o finado serviço secreto da ex-União Soviética. Foi em uma nota em resposta a uma informação de Gois sobre o sumiço de programas com pensadores de esquerda, como Karl Marx, da grade da TV Ines, emissora online para surdos mantida com verba do MEC. Na ditadura militar, Gois refugiu-se na URSS.
Com a nomeação de Bruna, aumenta o número de amigos e parentes que são dão bem no governo.
Rossell Mourão arranjou um cargo de assessor especial do presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, no mesmo dia da posse de Novaes, vista da plateia pelo pai do promovido, o vice-presidente Mourão. Rossel ganhava 12 mil, agora embolsa 36 mil.
A empresária Leticia Catelani é amiga de Eduardo Bolsonaro, com quem divide a paixão por clubes de tiro. Tão amiga, que em setembro de 2018 foi expulsa do cargo de secretária-geral do PSL em São Paulo. A cúpula nacional do partido bolsonarista havia recebido queixas de que ela usava a amizade com Eduardo para passar por cima da direção paulista da sigla.
Na Apex, Leticia se desentendeu de cara com o então presidente do órgão, Alex Carreiro. Levou a melhor graças à amizade com Eduardo e, também, à proximidade que começou a construir com o chanceler Ernesto Araújo (na foto que ilustra essa reportagem), a quem a Apex se subordina. Carreiro perdeu o cargo, e Leticia salvou o salário de 43 mil reais mensais.
E assim vai o governo que vinha para “mudar isso daí”.
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