Por premissa já excluir os militares, me parece algo muito injusto com a já injusta “reforma” da previdência porvir e encomendada pelo mercado
Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
Embora uma CPI, auditores ficais e até acadêmicos já publicaram estudos apontando que a previdência do Brasil é superavitária – o que falta é melhor gestão e, principalmente, cobrar os grandes devedores -, a sua reforma, eufemismo para destruição, ao que parece, será mesmo feita.
E, mesmo que ela seja deficitária, contrariando estudos, fica a questão: a questão da seguridades social não devia ser uma garantia fundamental e com, se for o caso, previsão de receitas oriundas de outros impostos também?
Mas, para incondicionalmente tirar o PT do poder, mesmo parte dos trabalhadores votou neste governo, que fará o que sonha o deus mercado, diminuir custos. Custo com os empregados, claro, não com o lucro.
Embora o mercado se preocupe especificamente com o INSS, o governo vai aproveitar o ensejo e mexer também nas previdências públicas de todas as esferas e poder. Quer dizer, não sei se o fará com os magistrados e com os congressistas. Acho justo que, se for pra ceifar direitos, que se aplique a isonomia. Os funcionários públicos também devem contribuir com o mercado, digo, com a economia. Nem que seja como uma mudança de paradigma.
Mas, juntamente com a categoria dos magistrados e dos deputados e senadores, outro grupo que o governo de certa forma resiste a inserir na destruição é os militares.
Ocorre que, extasiados com o novo governo, que prometeu – e está cumprindo – que os militares teriam maior participação no mandato, alguns grupos são favoráveis à exclusão das Forças Armadas nas mudanças. A alegação é que a carreira militar impõe uma série de restrições e obrigações ao seu quadro.
Aí é que entra a isonomia, na qual os militares, penso, devem também estar inseridos. Os argumentos dos militares são vários e todos legítimos. Só que os das outras classes de trabalhadoras também são! Fosse seguir a lógica dos argumentos “pró Forças Armadas”, por assim dizer, ter-se-ia que fazer o justo, extinguir todas, ou a grande maioria, as categorias da porvir destruição previdenciária. A isso, o mercado precisaria de terapia pra curar seu desespero.
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O que quero dizer é que em todas as profissões existem peculiaridades. Ônus e bônus. Os magistrados, por exemplo, além do alto salário, têm direito a um auxílio-moradia cujo valor é o dobro da média salarial dos trabalhadores brasileiros. Por outro lado, eles têm que conviver com eventuais ameaças, por exemplo.
Mas, e os profissionais da área da saúde, que quantas vezes passaram datas comemorativas longe dos seus, porque estavam de plantão? E os carteiros, que faça chuva ou calor escaldante – que só tende a piorar, com o aquecimento global – têm que caminhar léguas pra entregar as cartas, sejam de amor ou do Serasa? E os que trabalham em bares, que justamente nos finais de semana é que lhes é o dia mais intenso de labuta? E os garis, responsáveis pela insalubre tarefa de recolher nosso lixo que, irresponsáveis, sequer separamos direito?
Não poderia faltar, nos exemplos, os trabalhadores de minas, que, se atingirem as várias condições pra se aposentar, serão mais que aposentados curtindo seus netos, serão literalmente sobreviventes? Situação essa que só tende a piorar, já que no pacote de “modernização do Brasil” está a flexibilização das leis ambientais.
Repito, as atividades laborais são várias. Cada uma com suas especificidades e obrigações. Há que se levar em conta isso, sem dúvida. Mas, por premissa já excluir os militares, me parece algo muito injusto com a já injusta “reforma” da previdência porvir e encomendada pelo mercado.
Se todos os trabalhadores forem afetados pelas mudanças, quem sabe não começa aí justamente uma resistência mais forte a ela.
Será que o governo teme isso?
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*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”
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