Senador acusado de ser financiado por mineradoras barra CPMI de Brumadinho
Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do crime da Vale em Brumadinho (MG) é barrada por senador financiado por mineradoras. “Pizza de cromo e manganês não nos interessa”, denuncia deputado. Discussão quase acaba em agressão física
Os deputados mineiros Júlio Delgado (PSB) e André Janones (Avante) estão em rota de colisão com o senador Carlos Vianna (PSD), também representante de Minas Gerais, na leva de investigações sobre a responsabilidade de agentes públicos e privados na tragédia de Brumadinho.
Membros da comissão externa da Câmara criada para acompanhar e fiscalizar condições da mineração Brasil afora, com foco nas apurações sobre o rompimento da barragem no município mineiro, Júlio e Janones acusam o senador de barrar a instalação de uma comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) sobre o assunto.
E mais: segundo Janones, Carlos Viana é financiado pelo setor da mineração e atua em defesa de empresas mineradoras como a Vale, responsável por dois dos maiores crimes ambientais da história brasileira – além do desastre em Brumadinho, há três anos 19 morreram em rompimento de barragem sob responsabilidade da Samarco, que atua em conjunto com a Vale.
“O Senador Carlos Viana, que teve sua campanha financiada por um executivo da VALE, não aceitou a CPMI (onde deputados também podem participar). Ele exigiu ser o presidente de uma CPI (onde só senadores participam). Isso mesmo que você ouviu: O SENADOR FINANCIADO PELA VALE É QUEM VAI INVESTIGAR A VALE!”, escreveu Janones no Facebook.
Na postagem, o deputado diz ainda que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), “cede à pressão” de Carlos Viana e “barra CPMI de Brumadinho”. Davi já adiantou, em entrevista, que vai instalar a CPI de Brumadino no Senado no dia 12 de março, um mês após a leitura em plenário do pedido de criação do colegiado.
Bate-boca
Na terça-feira (26), Janones e Carlos Viana protagonizaram um bate-boca que, não fosse a intervenção de outros parlamentares, poderia ter resultado em agressão física.
Em um dos auditórios do Senado, deputados e senadores de Minas se reuniram para tratar do assunto e, em determinado instante, Janones disse para Viana se preparar para o “desgaste de sua imagem” por insistir em comandar uma CPI só com senadores, em vez de um colegiado misto.
Carlos Viana alega que uma comissão de inquérito mista pode embaralhar os trabalhos de investigação, pois Câmara e Senado têm ritos diferentes, mas disse ao interlocutor que conversaria com colegas senadores sobre a possibilidade.
“O Brasil vai saber disso”, protestou Janones, depois de dizer que o senador teve campanha eleitoral bancada por empresários da mineração. A advertência teve desdobramento, principalmente nas redes sociais, e o senador foi intensamente cobrado a dar explicações no transcorrer desta quarta-feira (27).
O senador Carlos Viana se defendeu. “Qual é a sua prova, sendo que eu nunca vi essa pessoa? Não me faça ameaças! Não aponte o dedo para mim!”, rebateu o senador, enquanto Janones vociferava reiterando as acusações.
Janones também comentou o episódio por meio de nota postada em suas redes sociais. “O Senador Carlos Viana insiste em ser presidente de uma CPI que vai investigar a VALE, tendo sido ele financiado pela própria VALE! Isso é um tapa na cara dos Brasileiros!”, diz trecho do comunicado.
Os deputados dizem que Carlos Viana usa o pretexto dos ritos diferentes da Câmara e do Senado para esconder o verdadeiro propósito de sua postura: ao defender apurações concentradas em um colegiado exclusivo de senadores, sob seu comando, o senador evita o risco de perder o posto de presidente em uma comissão de inquérito mista.
“A [expectativa de] CPI do Senado já está com um cheiro de pizza muito grande. Melhor não alimentar esperança”, disse Júlio Delgado à TV Câmara.
Para Júlio Delgado, os “indícios são muito fortes” de que o senador Carlos Viana atua para defender, no Congresso, empresas de mineração em detrimento das famílias de vítimas de Brumadinho.
A barragem da Vale que rompeu em Brumadinho em 25 de janeiro – até agora com 182 mortes confirmadas e 126 desaparecidos – já estava sob investigação preventiva em 2018. Mesmo assim não constava da lista de 50 estruturas em risco formulada pela Fundação Estadual de Meio Ambiente (MG).
Fábio Góis, Congresso em Foco