Bolsonaro nos Estados Unidos: carnaval de boçalidades
De todas as bizarrices vistas nos últimos dais, nada supera a notícia de que, apesar da forte segurança no Palácio do Alvorada, o presidente dorme com um revólver na cabeceira da cama. Nenhum problema nisso, até porque Getúlio Vargas também dormia e sabemos no que deu.
Luis Gustavo Reis*, Pragmatismo Político
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, parecia um fã do Justin Bieber (como todo respeito aos devotos do cantor) no encontro com Donald Trump. Eufórico, histriônico e abobado – perdoem a redundância-, só faltou o mandatário tupiniquim puxar a caneta, estender o paletó e pedir ao norte-americano uma rubrica. Guardaria o autógrafo com o mesmo esmero que devota à defesa de milicianos ou que zela pelo livro de seu torturador de estimação: Carlos Brilhante Ustra.
Isso pressupondo que o presidente tenha lido o livro, porque considerando seu português capenga e sua sôfrega interpretação de texto, não espanta que as páginas escritas pelo famigerado torturador sejam apenas objeto decorativo, sem nunca terem sido manuseadas. Não que o livro possa ensinar algo além de sadismo, mas espera-se que tenha sido minimamente revisado gramaticalmente antes de ser publicado.
A comitiva presidencial relevou outras excentricidades, algo comum no desgoverno da República. Chamado de “Posto Ipiranga” pelo chefe, o ministro da economia, Paulo Guedes, soltou a pérola: “O presidente ama os americanos (sic), eu também. Adoro jeans, Coca-Cola, Disneylândia…”. Nada contra, mas o magano não citou o Pateta, personagem que inspira alas significativas do atual governo. Faltou gasolina no posto, aí o frentista falou meias verdades.
Na santa ceia conservadora oferecida na Casa Branca, não poderia faltar Olavinho youtuber. Como de hábito, o falastrão disparou: “Só vim para comer”. Não surpreende, sobretudo vindo de alguém que têm “milhares” de seguidores e alunos nas redes sociais, mas que precisa fazer vaquinha para bancar os processos que perde por difamação, bem como para pagar os impostos devidos ao fisco norte-americano. Ainda durante o jantar, o lunático de Richmond prossegue: “Eu quero mudar o destino da cultura brasileira por décadas ou séculos à frente. Estou tentando formar uma geração de intelectuais sérios”. O astrólogo não comentou que seus cursos e livros são motivos de piadas, descartados por todas as universidades públicas brasileiras.
Estarrecido com o carnaval de boçalidades, um ex-subsecretário dos Estados Unidos destaca: “Nunca havia visto uma visita presidencial começar com um filósofo.” O youtuber deve ter ficado satisfeito com a deferência, já que pelo menos alguém fora de seu curral se referiu a ele como “filósofo”.
Na véspera da chegada de Bolsonaro, Olavinho youtuber havia jogado algumas pás de terra num governo que, segundo seus conhecimentos em astrologia, está fadado a desparecer: “Se tudo continuar como está, já está mal. Não precisa mudar nada para ficar mal. É só continuar assim. Mais seis meses, acabou.” Se acertar na previsão, o astromante será ovacionado por parcelas consideráveis da população, deixando seus detratores envergonhados.
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Os acordos comerciais firmados por Bolsonaro foram tímidos para o Brasil, já que o mandatário ofereceu vantagens concretas em troca de promessas vagas. Para alegria de Trump, Bolsonaro descartou vantagens na OMC, retirou os impostos da importação de trigo estadunidense e liberou o lançamento de foguetes na Base de Alcântara. De quebra, dispensou visto para turistas norte-americanos e congratulou seu filho, Eduardo Bolsonaro, por ter declarado que brasileiros em situação migratória irregular fora do Brasil é “vergonha nossa”.
No regresso ao Brasil, o presidente vai se deparar novamente com um Congresso Nacional recordista em fragmentação partidária; com ministros especialistas em afagar a plateia ideológica, mas altamente incompetentes tecnicamente no exercício de seus cargos; investigações sobre candidaturas laranjas do partido que é filiado; calafrios com as eventuais revelações citadas pelos milicianos responsáveis pela morte de Marielle Franco e Anderson Gomes entre outros assuntos.
De todas as bizarrices vistas nos últimos dais, nada supera a notícia de que, apesar da forte segurança no Palácio do Alvorada, o presidente dorme com um revólver na cabeceira da cama. Nenhum problema nisso, até porque Getúlio Vargas também dormia e sabemos no que deu.
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*Luis Gustavo Reis é professor e editor de livros didáticos.