Um dia após fugir do script e citar Jair Bolsonaro quando confrontado por um jornalista que apresentou uma informação indigesta, delegado do caso Marielle Franco será afastado
Uma declaração que fugiu do script no fim da entrevista coletiva sobre a morte de Marielle Franco (PSOL) pode ter motivado o afastamento do delegado Giniton Lages, responsável pelo caso.
Ao apresentar o policial militar Ronnie Lessa e o ex-PM do Bope Élcio Queiroz, apontados pela investigação como os autores do assassinato da vereadora, o delegado seguia um roteiro previamente combinado para expor os detalhes do crime.
Giniton Lages chegou a afirmar que Marielle Franco poderia ter sido morta em um “crime de ódio” porque Ronnie Lessa seria obsessivo por “figuras de esquerda” e tinha aversão às suas causas.
Ronnie Lessa é vizinho do presidente Jair Bolsonaro em um condomínio de luxo na Barra da Tijuca e foi exatamente lá que a polícia o prendeu.
Questionado, Giniton Lages afirmou que essa informação não era “relevante neste momento das investigações” e que não havia relação direta entre Lessa e a família Bolsonaro.
Mas o jornalista, bem preparado, insistiu e confrontou o delegado com uma informação que, certamente, não seria revelada ao público e deixou Giniton Lages atônito. “E o filho mais novo do Bolsonaro, ele namora a filha de Ronnie Lessa?”.
Imediatamente, Giniton Lages mostra-se desconfortável e é obrigado a admitir: “Bom, isso [o namoro] tem. Isso, tem. Mas para nós isso não importou na motivação delitiva e será enfrentado no momento oportuno”, respondeu o delegado, para logo em seguida ser arrastado para fora da entrevista.
O afastamento do delegado Giniton Lages foi revelado pelo jornal O Globo na manhã desta quarta-feira (13). O motivo oficial é que ele já “teria cumprido a sua missão”.
Nos bastidores da Polícia Civil e do Ministério Público do Rio de Janeiro comenta-se que, apesar de ser considerado uma figura controlável e obediente a cumprir os roteiros determinados por seus superiores, o delegado mostrou-se incapacitado durante a coletiva de imprensa e não soube lidar com os questionamentos dos repórteres que mencionaram o presidente Jair Bolsonaro.
Delegado Giniton Lages
No ano passado, o miliciano Orlando de Curicica afirmou que foi ameaçado pelo delegado Giniton Lages para assumir a autoria do assassinato de Marielle Franco.
No depoimento, Orlando de Curicica contou que Giniton Lages esteve no presídio de Bangu em maio de 2018. O delegado queria ouvi-lo confessar que matou Marielle a mando do Siciliano. Ele se referia ao vereador Marcelo Siciliano, do PHS.
Orlando disse ter respondido ao delegado Giniton Lages que não tinha envolvimento com o caso e que o delegado teria pedido então para ele acusar o vereador Marcelo Siciliano:
“Fala que o cara te procurou, pediu para você matar ela, você não quis, e o cara arrumou outra pessoa. Mas que o cara que pediu para matar ela”.
Giniton Lages teria oferecido perdão judicial a Orlando de Curicica caso ele assumisse a autoria do assassinato de Marielle Franco. Do contrário, o delegado disse que iria transferir Orlando para um presídio federal.
Orlando entrou para lista de suspeitos do crime depois que uma testemunha contou à polícia ter visto ele e Marcelo Siciliano num restaurante tramando a morte da vereadora.
Uma investigação paralela da Polícia Federal revelou, posteriormente, que essa testemunha havia sido plantada para prejudicar as investigações e acobertar os verdadeiros culpados pela morte de Marielle. A PF concluiu que nem Orlando nem o vereador Siliciano tinham participação no assassinato da vereadora.
Orlando acabou transferido para a Penitenciária Federal de Mossoró (RN) semanas depois do encontro com o delegado Giniton Lages. O depoimento de Orlando de Curicica foi dado ao Ministério Público Federal e os principais detalhes podem ser vistos aqui.
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