A “reforma” trabalhista de Michel Temer foi aprovada com o argumento de que faria o Brasil voltar a crescer e ter empregos. Dois anos depois, provou-se que não passava de uma falácia para o 1% mais rico ficar mais rico. A reforma da Previdência segue o mesmo caminho
Regina Camargos, RBA
Diariamente, a grande mídia e os analistas econômicos conservadores martelam nas nossas cabeças que sem a “reforma” da Previdência o país não voltará a crescer. A justificativa é que sem ela a situação financeira do governo entrará em colapso e não haverá recursos para investimentos em saúde, educação, segurança e infraestrutura. Como as opiniões contrárias praticamente não são veiculadas, a sociedade se torna refém dessa “verdade” e a aceita sem questionar.
Uma visão diferente sobre a questão entende que a retomada do crescimento é pré-condição para o equilíbrio financeiro da Previdência – e não o contrário. Quando a economia se recupera, o nível de emprego formal volta a crescer e com ele a arrecadação das contribuições para a previdência, proporcionando, gradativamente, seu equilíbrio. De acordo com essa visão, a piora nas contas da Previdência entre 2015 e 2018 se deve à recessão – a mais grave da história do país – ocasionada por uma política econômica ultraliberal que promoveu drásticos cortes nos investimentos e gastos públicos, elevou as taxas de juros e restringiu o crédito.
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A retomada do crescimento poderia ocorrer por meio de uma política de crédito adequada, principalmente via bancos públicos; de uma reforma tributária que reduza impostos sobre o consumo e aumente os que incidem sobre a riqueza; e da manutenção das políticas sociais para reduzir a pobreza e a desigualdade.
A reforma da Previdência que está sendo proposta pelo governo Bolsonaro não promoverá a retomada do crescimento com distribuição de renda. Ao rebaixar os valores dos benefícios e dificultar ainda mais o acesso a eles, essa reforma irá aumentar a desigualdade e a pobreza e resultará em menos consumo das famílias. Como se sabe, esse foi um dos principais propulsores da economia entre 2004 e 2014. Menos consumo significa menos demanda para as empresas, portanto, menos estímulo para que invistam, produzam e criem vagas de empregos.
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Mas se há menos empregos – algo que vem se agravando nos últimos três anos –, cai a arrecadação da Previdência e com isso produz-se um círculo vicioso agravado pela reforma trabalhista e pela terceirização sem limites que levam a condições de trabalho mais precárias e a empregos mal remunerados.
Na verdade, por trás do argumento de que sem a reforma da Previdência não haverá retomada do crescimento estão os interesses dos rentistas, que querem garantir para si os recursos do orçamento público na forma do pagamento de juros da dívida pública e dos banqueiros. Além de ganhar muito dinheiro com os juros pagos pelo governo, os banqueiros que vêm no sistema de capitalização – previdência privada – outro lucrativo filão de negócios.
O pano de fundo desse debate sobre crescimento e reforma da Previdência é uma acirrada disputa entre diferentes projetos de desenvolvimento para o país.
Um dos projetos, encarnado nos governos Temer e Bolsonaro, propõe uma “economia do 1%”, na qual os benefícios do crescimento se destinem a essa ínfima parcela da sociedade. Os motores desse projeto são o aprofundamento da dependência externa da economia, as privatizações, a precarização do trabalho e a drástica redução do papel do Estado, inclusive nas áreas sociais – saúde, educação, segurança e previdência.
O projeto oposto, que se tentou viabilizar entre 2004 e 2014, visava a conciliar crescimento econômico e distribuição de renda, tendo por base o desenvolvimento do mercado interno e das empresas nacionais, a expansão do crédito, a redução das desigualdades e a soberania internacional. Nesse projeto, a Previdência Social cumpriu um papel fundamental devido à sua importância para a redução da pobreza e a distribuição de renda.
Portanto, o que está em jogo no debate sobre a reforma da Previdência é uma visão de longo prazo sobre o modelo de crescimento econômico que o país adotará: se para a maioria ou para poucos.
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