Se for hábil, Nicolás Maduro não prenderá Juan Guaidó
Ação irresponsável evidencia isolamento de Juan Guaidó. O oposicionista parece ter queimado a credibilidade que lhe restava, ao exibir ínfima legitimidade social. Trata-se de personalidade inflada a partir de fora
Gilberto Maringoni*, via facebook
Dois meses depois de fracassar na tentativa do “golpe humanitário” com apoio dos Estados Unidos e dos países do Grupo de Lima, o líder oposicionista venezuelano Juan Guaidó foi mais ousado. Tentou cavalgar um golpe militar. Se deu mal.
Não se sabe quem compõe o Estado maior da oposição venezuelana, ou se o jovem deputado age por impulsos próprios. O certo é que pela segunda vez mostra não ter a menor percepção do que significa correlação de forças. Além disso mostra ser pior de jogo do que o governo a quem acusa de incompetente.
O que pretendia Guaidó em 23 de fevereiro e agora, em 30 de abril?
Promover uma ação espetacular que serviria de gatilho para uma rebelião popular descentralizada. No primeiro caso, uma entrada triunfal de caminhões com supostos gêneros de primeira necessidade e neste, a tomada de uma guarnição armada.
O comburente seria o descontentamento popular com uma situação econômica gravíssima. Era incêndio certo, em seus planos.
Os revoltosos de agora teriam ao seu lado oficiais que tomariam a base militar Generalíssimo Francisco de Miranda, conhecida como La Carlota, nome do bairro em que está instalada.
Situada na região central de Caracas (zona leste), a guarnição 105 hectares compreende um aeroporto de pequeno porte e uma base de helicópteros. Abriga o Comando Geral da Aviação É estratégica para quem deseja dominar o espaço aéreo da capital.
Em 4 de fevereiro de 1992, quando tentou derrubar o governo de Carlos Andrés Pérez, o então coronel Hugo Chávez Frías buscou tática semelhante: tomaria La Carlota para, em seguida, avançar sobre o palácio de Miraflores, situado a dez quilômetros dali. O intento foi derrotado.
No caso de Guaidó, não apenas as dissensões nas forças armadas mostraram-se muito menores do que o calculado, como as massas resolveram ficar em casa ou ir trabalhar. O oposicionista parece ter queimado a credibilidade que lhe restava, ao exibir ínfima legitimidade social. Trata-se de personalidade inflada a partir de fora.
Os governos dos Estados Unidos, Colômbia e Brasil – entre outros – voltaram a passar um carão de alcance planetário. O tuiteiro oficial do Planalto, Jair Bolsonaro, excitou-se a ponto de vincular PT e PSOL ao governo de Nicolás Maduro, além de hipotecar solidariedade a Juán Guaidó.
O Brasil se solidariza com o sofrido povo venezuelano escravizado por um ditador apoiado pelo PT, PSOL e alinhados ideológicos. Apoiamos a liberdade desta nação irmã para que finalmente vivam uma verdadeira democracia.
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) April 30, 2019
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Nicolás Maduro aproveita a oportunidade de novamente mostrar força. A situação segue muito ruim na economia, mas a compra de milhões de cestas básicas no exterior e o fato de produtos iranianos e russos forrarem as gôndolas dos supermercados acalma as demandas mais prementes. Mas o bloqueio econômico e os problemas estruturais internos não garantem salário emprego e renda á população. O governo, porém, conseguiu adiar mais uma vez o ponto mais agudo da crise.
É plausível que Maduro desate uma caça às bruxas nas armas e puna os sublevados, como qualquer governo faria. Se for hábil, não prenderá Guaidó. Em lugar de um mártir, talvez seja melhor mantê-lo como um animador de auditórios cada vez mais reduzidos.
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*Gilberto Maringoni é professor de Relações Internacionais da UFABC