Morreu na contramão atrapalhando o desfile da São Paulo Fashion Week
Seu nome era Tales Cotta Soares. A Morte não faz despencar bolsas. Nem a Bovespa dos quatrocentões nem a Prada das quatrocentonas. Estamos muito, muito doentes
No último domingo, 28 de Abril, o modelo Tales Cotta Soares, 26 anos de idade, teve um mal súbito enquanto desfilava para a marca Ocksa no evento de moda São Paulo Fashion Week.
Horas depois, mesmo com a confirmação do seu falecimento, a organização, as marcas e demais envolvidos decidiram pela continuidade do cronograma de desfiles, observando-se um minuto de silêncio na abertura de cada um.
A marca Cavalera encerrou o evento com um desfile que trouxe modelos trans e não binários. Estava escalada ainda uma performance do rapper Rico Dalasam. De posse do microfone, Rico fez um protesto contra a continuidade do evento a despeito da morte de Tales Cotta.
VÍDEO:
Em sua página no Facebook, o escritor Ricardo Domeneck escreveu o seguinte texto sobre o episódio:
Esta semana um rapaz de 26 anos, que trabalhava como modelo, despencou em si, de si, caiu em plena passarela da São Paulo Fashion Week. Foi sim prontamente socorrido, ainda que inutilmente.
Não era a velha Cacilda Becker tendo um derrame ainda vestida de Estragon em uma encenação de ‘Waiting for Godot’, não era Ayrton Senna esbugalhando-se em TV aberta contra um muro, era um rapaz que alugava de forma legítima seu corpo para as roupas da nova moda, dizia-se “manequim” antigamente, um manequim, nós manequins sobre os quais colocamos roupas, maquiagens, manequim: o rapaz despencou em si, caiu de si, morreu.
Está morto. Seu nome era Tales Soares. A Morte não faz despencar bolsas. Nem a Bovespa dos quatrocentões nem a Prada das quatrocentonas.
O desfile seguiu. Não. Não apenas seguiu. Foi reiniciado para que a plateia pudesse ter a experiência do desfile tal qual fora planejado, sem aquela interferência inoportuna da morte.
Estamos todos muito, muito doentes.