Visivelmente desconfortável, Sergio Moro abandona coletiva ao ser questionado sobre diálogos com Dallagnol. Ministro não queria tratar do escândalo, jornalistas insistiram e ele retirou-se do local
O ministro da Justiça, Sergio Moro, abandonou nesta segunda-feira (10) uma coletiva de imprensa em Manaus (AM) após ser questionado por jornalistas sobre as conversas que teve com o procurador Deltan Dallagnol.
Moro negou que tenha dado orientações aos procuradores que integram a Lava-Jato. “Não há orientação nenhuma”, disse, em referência a trocas de mensagens pelo celular divulgadas no domingo pelo site The Intercept Brasil.
As mensagens, porém, são claras e revelam que o então juiz da Lava Jato agiu em conjunto com a força-tarefa para incriminar seus desafetos políticos, sobretudo o ex-presidente Lula (veja a íntegra no fim do texto).
Em um dos trechos divulgados, os procuradores mostram-se preocupados com a possibilidade de Lula conceder uma entrevista antes do 1º turno da eleição presidencial. Os membros da Lava Jato temiam que a aparição do ex-presidente poderia fortalecer a candidatura de Fernando Haddad. Sergio Moro acabou nomeado ministro do governo Bolsonaro.
O Intercept ainda publica trechos em que Moro teria passado a Dallagnol o contato de possíveis testemunhas, sugerindo a torca de ordem nas operações que ainda seriam realizadas e até mesmo perguntado se a Lava-Jato não estava demorando muito para fazer uma nova operação.
Os diálogos também revelam que Moro deu acesso privilegiado à acusação e ajudou o Ministério Público a construir provas contra o investigado — no caso, o ex-presidente Lula. Juiz e acusação combinavam estratégias, trocavam informações dos bastidores dos processos e anunciavam decisões antes de serem julgadas.
“Não tem nenhuma orientação ali naquelas mensagens“, insistiu Moro, visivelmente desconfortável durante a coletiva em Manaus. “E eu nem posso dizer que são autênticas [as mensagens] porque, veja, são coisas que aconteceram, e se aconteceram, foram há anos. Eu não tenho mais essas mensagens. Eu não guardo, eu não tenho registro disso“, disse.
Incomodado com a continuidade das perguntas dos jornalistas, Moro decidiu abandonar a coletiva. “Senhores, eu vim aqui para falar do Amazonas e se não tem pergunta a esse respeito eu encerro“, concluiu.
“Na primeira entrevista em que não foi tratado como herói, Moro fugiu como o diabo foge da cruz“, avaliou o escritor e jornalista Pedro Zambarda de Araujo.
O que dizem juristas
Muitos juristas se manifestaram até agora sobre o conteúdo das mensagens reveladas. Os mais cautelosos afirmam que, no mínimo, os diálogos indicam um comportamento antiético.
Para Conrado Gontijo, criminalista e doutor em direito penal pela Universidade de São Paulo (USP), se for confirmada a autenticidade das mensagens, será um dos maiores escândalos da história do país. “Se houve este tipo de comunhão entre o Poder Judiciário e o Ministério Público é uma violência ao estado democrático de direito”, afirmou.
Segundo o professor e jurista Afrânio Jardim, a nulidade dos processos é uma realidade. “Foi claramente desrespeitada a regra cogente do Artigo 254, inciso IV do Código de Processo Penal. Juiz suspeito acarreta nulidade processual; nulidade absoluta”.
“É chocante tudo que foi feito, não dá para minimizar o fato. Houve um tipo de relação entre juiz e procuradores absolutamente antiética e fora de qualquer padrão de legalidade”, avalia o professor de Direito Constitucional da PUC-SP, Pedro Serrano.
Para Serrano, as conversas “mostram a adoção de atitudes judiciais ou pretensão de adotá-las com finalidade politica, para interferir em eleição inclusive, o que é gravíssimo”.
CONFIRA A ÍNTEGRA DO QUE FOI REVELADO ATÉ AGORA:
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