O Brasil de Bolsonaro provoca vergonha internacional
Na cena internacional, a cada dia que passa, se acumulam vexames. O Brasil de Bolsonaro não é apenas um desastre geopolítico. É uma ameaça à humanidade
Flávio Aguiar, RBA — Nem mesmo a ditadura de 64 conseguiu romper a tradição positiva das relações exteriores do Brasil, apesar de suas arbitrariedades (cassação de diplomatas), atitudes servis vez por outra (como logo no início do governo de Castelo Branco, enviando tropas para apoiar o invasão da República Dominicana pelos Estados Unidos, depondo o presidente eleito, Juan Bosch) e perseguições contra inimigos políticos, como no caso da pressão sobre a Noruega para que Dom Helder Câmara não ganhasse o prêmio Nobel da Paz em 1971.
Ficou famosa a frase do então embaixador brasileiro em Washington, Juracy Magalhães, “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”, mas o fato é que foi uma nota fora de tom na diplomacia brasileira, consolidada desde os tempos do Segundo Império e alicerçada pelo desempenho do Barão do Rio Branco no começo da República Velha de 1902 a 1912 como ministro de Relações Exteriores.
Agora esta tradição da diplomacia brasileira vem sendo demolida a marretadas contra a inteligência desferidas pelo atual governo e seu chanceler, ambos motivos de chacotas e decepções internacionais. A política externa brasileira está alinhada não só com a dos Estados Unidos, mas com aquilo que este país tem de pior, o que inclui o fundamentalismo religioso de Trump, Bolton e Pompeo, e com o que vem produzindo de péssimo no mundo inteiro, como a exportação de Steve Bannon (depois de brigar com Trump) para a Europa. Sem falar na aproximação com gente como Matteo Salvini, Viktor Orban etc.
O governo Bolsonaro vive dentro de uma redoma mental que vai além do conceito de pós-verdade. É a redoma do pós-mentira, pois mente sem pejo com a empáfia de quem diz verdades absolutas, ou seja, somente o que os membros deste governo dizem é que são verdades, para eles e elas não existe o conceito de mentira.
Isso contamina todos e todas: de Damares a Ernesto Araújo, de Moro a Guedes, do general Heleno a Weintraub, e assim por diante. O próprio presidente afirma sua política de total submissão à linha mais retrógrada de um partido estrangeiro (o setor trumpista do Partido Republicano dos Estados Unidos) como uma afirmação da “soberania nacional”, levando muita gente, na esteira da semântica dominante na mídia mainstream, a chamar “entreguismo” de “nacionalismo”.
Na ONU, o Brasil já assumiu a linha de Trump, fazendo campanha contra a palavra “gênero” em documentos da entidade e a políticas que combatam a desigualdade ou que ameacem, mesmo que de longe, algo como descriminalização do aborto etc.
E agora a política externa brasileira, que já deu vários tiros nos próprios pés, prepara-se para dar um tiro no ouvido. Refiro-me ao comparecimento de diplomata brasileiro à 13ª Conferência Internacional sobre Mudança do Clima, promovida em Washington neste final de julho pelo Heartland Institute, fundado em 1984 e que tem sede em Arlington Heights, no estado de Illinois.
Desde 2000 esta associação abraçou a causa do negacionismo em relação à responsabilidade humana pelo aquecimento global. Além disto, é uma associação que se caracteriza por defender tudo aquilo que hoje tem fama de ruim: o uso de sacos plásticos e canudos da mesma matéria; a defesa da completa desregulamentação na aérea da saúde; a defesa do cigarro, do cigarro eletrônico, a condenação de quem afirme que a fumaça do cigarro prejudica não somente o fumante original, mas também as pessoas próximas; a defesa dos combustíveis fósseis, dentre outras causas igualmente fósseis. Entre outros feitos esta associação ataca o Papa Francisco e sua encíclica Laudato Si, aliando-se a Steve Bannon e ao Cardeal Raymond Burke.
Em 2012, um vazamento de documentos da associação revelou que ela recebe fundos generosos do grupo norte-americano Koch, associado ao que há de mais reacionário nos Estados Unidos, de empresas das áreas de comunicação (Microsoft e Comcast), da indústria automobilística (General Motors), de fabricantes de cigarro (Philip Morris e Reynolds American) de fármacos (Amgen, Bayer, GlaxoSmithKlim, Pfizer, Eli Lilly) e de fabricantes de bebidas alcólicas, dentre outras.
Tudo em nome do “livre mercado” e do direito à “liberdade de escolha” por parte dos consumidores, uma estrutura de pensamento repetida pelo governo de Bolsonaro, por exemplo, no caso dos radares controladores da velocidade nas estradas e da supressão da obrigatoriedade das cadeirinhas para crianças no banco de trás dos veículos.
Dize-me com quem andas e dir-te-ei quem és.
O Brasil está mal no filme. Enquanto isto, o presidente cancela encontro com o ministro francês de Relações Exteriores, Jean Yves Le Drian (que ele chamou de “premiê”), para ir cortar o cabelo à la Führer e fazer declarações absurdas sobre as esquerdas e a ditadura.