Política Externa

A repercussão internacional do discurso de Bolsonaro na ONU

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Discurso de Jair Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU causa perplexidade internacional. Avaliação é a de que atual presidente brasileiro perdeu a sua última chance de ser respeitado

O discurso do presidente Jair Bolsonaro (PSL) na Assembleia Geral da ONU causou perplexidade internacional por conta de sua agressividade sem precedentes, visão de mundo retrógrada e disseminação de informações inverídicas.

Um dos mais experientes correspondentes internacionais do país, Jamil Chade, resumiu assim a repercussão global: “Jair Bolsonaro não tinha chegado sequer à metade de seu discurso e meu whatsapp, Signal e email já estavam sendo bombardeados por mensagens de diplomatas e representantes de entidades internacionais. Todos chocados com o que estavam ouvindo. Mas uma das mensagens particularmente dura veio de um representante que faz parte da cúpula das Nações Unidas: ‘Ele (Bolsonaro) acabou de perder a última chance de ser respeitado’. Em outra mensagem, um mediador perguntava: ‘há algo mais extremo que essa visão de mundo?'”.

Se na diplomacia internacional a condenação é unânime, o ambiente no Itamaraty não é diferente. Sob a condição do anonimato, diversos diplomatas conversaram com a jornalista Bela Megale e avaliaram o discurso como sendo o mais agressivo já feito por um presidente brasileiro desde 1949, ano em que o Brasil começou a abrir a cerimônia. Para os diplomatas, o teor do discurso proferido por Bolsonaro deverá ampliar a tendência de isolamento internacional do Brasil.

A imprensa internacional também reagiu de forma crítica. Em seu site, a rede britânica BBC deu uma manchete em separado para Bolsonaro e sua afirmação de que a Amazônia pertence ao Brasil. Segundo a BBC, o presidente brasileiro assumiu um tom “desafiador” ao abordar a questão, criticando o sensacionalismo da mídia. Em contraponto, a rede acrescenta no mesmo link reportagem de seu correspondente na América Latina, Will Grant, no Pará, em que o repórter relata a destruição da floresta do “epicentro da crise”.

O também britânico Guardian , por sua vez, colocou seu correspondente para a América Latina, Tom Phillips, para acompanhar e comentar a participação de Bolsonaro em sua cobertura ao vivo da Assembleia Geral. Segundo Phillips, com um discurso “aparentemente escrito por seus assessores mais radicais de extrema direita”, Bolsonaro ofereceu ao mundo um vislumbre de “um governo introvertido, obcecado por conspirações e profundamente arrogante” que agora está à frente do país.

“Alguns tinham esperança de que Bolsonaro adotasse um tom mais conciliador ao se dirigir aos líderes mundiais na ONU pela primeira vez, mas em segundos ficou claro que eles iriam se decepcionar”, escreveu o jornalista do Guardian, dando como exemplos seu “ataque trumpiano” ao socialismo, as indiretas ao presidente francês, Emmanuel Macron, sobre a Amazônia, e as críticas ao politicamente correto e aos “progressistas ateus”, para “deleite de seus apoiadores pentecostais”. Concluindo, Phillps afirmou que os aplausos protocolares “não deixaram dúvidas de que muitos delegados não podiam esperar para se verem livres do líder do Brasil”.

O ataque de Bolsonaro ao socialismo também ganhou destaque na avaliação do discurso pela Bloomberg. Segundo a agência, o presidente “cimentou a ruptura da tradição de multilateralismo do país” com sua agressiva defesa da soberania na Amazônia. Focada em economia, a agência também lembrou o esforço mencionado pelo brasileiro para a abertura do país antes de voltar a atacar a “ideologia de esquerda” por trás da facada que sofreu durante a campanha eleitoral no ano passado.

Já a rede americana CNN só menciona o discurso de Bolsonaro brevemente na sua cobertura ao vivo da Assembleia em seu site. Em sua página, a CNN se limita a reproduzir a frase do presidente de que “a Amazôna não está sendo devastada nem consumida pelo fogo como a mídia mentirosamente diz” para logo, a espelho da BBC, oferecer um contexto da reportagem que fez sobre aumento de 85% nas queimadas na região em agosto.

O jornal espanhol El País ressaltou o “discurso ultranacionalista de extrema-direita” de Bolsonaro. O diário francês Le Monde destacou o ataque dele ao líder indígena Raoni, acusado de ser “manipulado por estrangeiros”. Washington Post abriu matéria pelas negativas dele sobre os incêndios na Amazônia, apesar das evidências que levaram à sua “condenação internacional” no mês passado.

O jornalista Vincent Beavis, correspondente do Washington Post na Ásia e que atuou no Brasil pelo jornal americano Los Angeles Times, também acompanhou o pronunciamento do presidente. E escreveu no Twitter: “Agora, o mundo certamente está prestando atenção ao Brasil como um país, talvez mais do que nunca. Mas acho que poucos membros importantes das comunidades liberais e pró-democráticas globais gostarão de Bolsonaro menos hoje do que ontem. Já estava muito claro quem ele é”.

O influente site americano The Huffington Post apontou que Bolsonaro defendeu o desmatamento ao declarar que “a Amazônia não está sendo devastada”. A reportagem destaca que “o presidente de extrema-direita do Brasil (…) culpou as organizações internacionais de mídia e ambientais por espalharem “mentiras” sobre os incêndios que assolam a floresta amazônica durante um discurso nacionalista que abriu a Assembléia Geral das Nações Unidas na manhã desta terça-feira”.

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