Racismo não

Gilberto Gil lembra o dia em que sentiu o racismo na pele

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Na mesma data em que um negro que desdenha do racismo assumiu o comando da Fundação Palmares, Gilberto Gil conta como sentiu o racismo pela primeira vez e se calou

Gilberto Gil (divulgação)

O músico e ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, foi às redes na última quarta-feira (27) para contar a história de quando começou a sentir o racismo na pele, ainda na infância.

A revelação de Gil acontece no mesmo dia em que o negro Sérgio Nascimento Camargo, que nega que exista racismo no Brasil, foi nomeado para comandar a Fundação Palmares.

“Só fui sentir o racismo quando comecei a ir ao Colégio Marista. Lembro-me que uma vez, quando pedi uma explicação, um professor simplesmente virou para mim e disse: ‘cale a boca, seu negro boçal’. E eu calei. Era uma época muito difícil”, contou Gil, em publicação no Twitter.

Diversos seguidores reagiram à publicação de Gilberto Gil para relatar casos de racismo dos quais também foram vítimas, inclusive na mesma instituição de ensino.

“Estudei no Marista em São Luís-Ma, veja só. Na minha turma só havia um negro (embora muitos, inclusive eu, não pudessem afirmar categoricamente não serem negros). Era nítida a inibição, o desconforto, o silêncio. Eu não sabia o nome, mas percebia o racismo”, escreveu o professor Jarbas Lima.

“Fiz a 5ª no Stella Maris em Fortaleza, gostava de lá, vieram as provas do 1º bim e minhas notas foram altas. A profª com o baixo rendimento da turma me usou disse “até essa menina” tirou nota. Era novata, tinha 11 anos e era a única com a pele morena, nunca achei que fosse elogio”, escreveu Tatiana Lobatto.

“Calou naquele momento. Agora o mundo inteiro te escuta. Fale mais, cante mais. Viva o Gil”, publicou Adriano d’Almeida.

Sérgio Nascimento de Camargo

Sérgio Nascimento de Camargo nega a existência de racismo no Brasil. Negro, militante de direita, ele é usuário frequente de redes sociais, onde critica manifestações culturais ligadas à população negra e ataca diversas personalidades negras, a quem sugere que sejam “mandadas para a África”.

Em 15 de setembro, o jornalista publicou que no Brasil existe um tipo de racismo “nutella”, ao contrário dos Estados Unidos, onde o racismo seria “real”. “A negrada daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”, disse.

Em 27 de agosto, escreveu que a escravidão foi “terrível, mas benéfica para os descendentes” porque negros viveriam em condições melhores no Brasil do que na África. Também já disse sentir “vergonha e asco da negrada militante”.

Camargo defendeu a extinção do feriado do Dia da Consciência Negra por decreto, porque, para ele, a data causa “incalculáveis perdas à economia do país” ao homenagear quem ele chamou de um “um falso herói dos negros”, Zumbi dos Palmares — que dá nome à fundação que ele agora preside.

Ele também afirmou que o feriado foi feito sob medida para o “preto babaca” que é um “idiota útil a serviço da pauta ideológica progressista”.

Em um dos posts, ele disse ser favorável a que “alguns pretos sejam levados à força para a África”, e cita Lázaro Ramos e Taís Araújo (classificada de “rainha do vitimismo”) como exemplo. “Sugiro o Congo como destino. E que fiquem por lá!”, disse.

O sambista Martinho da Vila é outro que, na visão de Camargo, deveria “ser mandado para o Congo”, por ser um “vagabundo”. Além disso, o jornalista considera que a vereadora Marielle Franco, assassinada a tiros, “não era negra” e era um “exemplo do que os negros não devem ser”.

Com o mesmo desprezo se refere a Angela Davis, uma das principais líderes do feminismo negro, a quem chamou de “baranga” e “mocreia”.

Camargo ainda dispara contra a cantora Preta Gil e a atriz Camila Pitanga: “ladras racistas”. Segundo ele, elas se dizerem negras “para faturar politicamente e fazer discurso vitimista”.

Nomes importantes da música brasileira, como Gilberto Gil, Leci Brandão, Mano Brown e Emicida, e políticos, como os deputados federais Talíria Petrone e David Miranda (ambos do PSOL-RJ), foram todos chamados de “parasitas da raça negra no Brasil”.

Numa declaração machista e carregada de preconceitos, Camargo afirma que uma mulher negra que seja “feminista, lulista e afromimizenta não pode reclamar da ‘solidão da mulher negra'”, porque “ninguém é louco de encarar”.

Sérgio Nascimento de Camargo também já fez piada com o Ato Institucional 5 (AI-5), medida tomada durante a ditadura militar. Em 1º de novembro, após o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) causar polêmica por levantar a possibilidade de um “novo AI-5”, publicou uma foto do presidente Jair Bolsonaro com os seus quatro filhos, acompanhada da legenda “Aí, cinco”.

Em agosto, sugeriu que membros do PT sejam usados como cobaias em testes, no lugar de animais.

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