Polícia Militar

PM dispara arma ao léu e debocha: “amanhã vou preso, para mim tanto faz”

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Como quem está profundamente entediado, PM fardado é flagrado dando tiro ao léu em São Paulo. Atingiu um cozinheiro no peito, internado em estado grave. “Amanhã vou preso, pra mim tanto faz”

Polícia Militar de São Paulo (Imagem: Reprodução Ponte)

Maria Teresa Cruz e Paloma Vasconcelos, Ponte

Na madrugada do último domingo (26/1), o cozinheiro Claudemir Cipriano da Silva, 32 anos, foi baleado no peito perto da casa dele, durante uma ação policial na rua Silva Ortiz, Jardim Nove de Julho, em São Mateus, periferia da zona leste da cidade de São Paulo.

Um vídeo mostra o momento em que um PM atira, com tranquilidade, para frente, no meio da rua. Ao perceber que estava sendo filmado, não demonstra preocupação e declara: “Amanhã vou preso (…) para mim tanto faz. Para mim tanto faz”.

No vídeo, é possível ver o número da viatura: M-38202, ou seja, o policial faz parte do 38º BPM/M (Batalhão da Polícia Militar Metropolitano).

O cabeleireiro David Pedro da Silva, 23, primo da vítima, afirma que no momento do disparo, Claudemir estava em um grupo de cerca de 15 pessoas, na frente da sede de um time de várzea local, onde tinha acontecido uma confraternização.

Estava tudo tranquilo, nem som tinha mais. Ele demorou para perceber que tinha sido atingido e, em um primeiro momento, pensou que era bala de borracha. Foi andando para a casa e aí sentiu fraqueza, constatando que foi baleado”, afirmou David à Ponte. “O policial atirou, sim, na direção do grupo que estava encostado na parede. Meu primo estava junto”.

Segundo o boletim de ocorrência registrado no 49º DP (São Mateus), a vítima está internada no Hospital Santa Marcelina, também na zona leste, aguardando para passar por uma cirurgia de retirada da bala que ficou alojada na região torácica, conforme mostra o raio-x.

De acordo com o registro da ocorrência, Claudemir informou que estava tendo um samba na rua, quase na frente da casa dele, e que, em determinado momento da madrugada, o som virou para funk. Ele afirmou aos investigadores, segundo o B.O., que notou quando uma viatura se aproximou e parecia que ia multar um veículo estacionado bem próximo do grupo onde estava e de onde vinha o som. O carro saiu e, minutos depois, Claudemir ouviu um barulho de tiro e notou que havia sido atingido.

Camisa perfurada pelo tiro e exame de raio-x com a bala alojada do cozinheiro Claudemir Cipriano da Silva (Imagem: Reprodução Ponte)

A vítima afirmou à Polícia Civil que não é possível dizer com precisão de onde veio o tiro e que foi socorrido por um amigo que o levou primeiro para o PS São Mateus e, na sequência, por não haver cirurgião de plantão, foi até o Hospital Santa Marcelina, referência na região. Ele também destaca que não estava sendo ameaçado, não tinha inimizades e, até ser atingido, não tinha visto ninguém com arma de fogo.

Na versão oficial, os PMs da viatura M-38209, que apresentaram a ocorrência, afirmam que a polícia foi acionada pelo hospital quando uma pessoa baleada – no caso, Claudemir – chegou até o local.

Os PMs que foram registrar o B.O. afirmaram que, inicialmente, quem cuidava da ocorrência eram os agentes da viatura M-28207 (do 28º BPM/M), mas que depois, “por questões internas pertinentes à Polícia Militar”, eles assumiram o caso sendo informados de que “uma pessoa havia sido atingida por uma bala perdida em um baile funk”.

Ao G1, um familiar do cozinheiro contou que a família está sofrendo pressão por parte dos PMs desde o ocorrido no domingo. “Alguns policiais foram ao hospital e falaram para a gente não registrar a ocorrência”, declarou.

A Ponte procurou o sociólogo Benedito Mariano, ouvidor das polícias de São Paulo, que informou que tomou providências nesta terça-feira (28/1). “Instaurei procedimentos na Ouvidoria da Polícia e solicitei que a Corregedoria da PM avocasse o caso e afastasse os PMs envolvidos”, afirma.

A reportagem questionou a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública), (Secretaria da Segurança Pública de São Paulo), liderada pelo general João Camilo de Campos neste governo de João Doria (PSDB), e a PM sobre o ocorrido.

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Em nota, a PM afirmou que o caso é investigado por IPM (Inquérito Policial Militar) instaurado pela Corregedoria da Polícia Militar. “Os policiais já foram identificados e ouvidos. Eles serão afastados da atividade operacional durante o período das investigações. A Instituição ressalta a importância do depoimento de testemunhas para o esclarecimento dos fatos, garantindo a elas total sigilo e proteção”, diz nota, que, contudo, não informa quais foram os policiais afastados.

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