Primeiro, secretário alegou "coincidência retórica" para justificar discurso nazista. Como a desculpa não colou, ele decidiu culpar assessores. Após pressão, Bolsonaro anuncia demissão de Roberto Alvim
O secretário da Cultura do governo Bolsonaro foi ao Facebook na manhã de hoje se explicar após copiar trechos de um discurso do líder nazista Joseph Goebbles em vídeo publicado ontem para anunciar o lançamento de um novo programa de incentivo à arte.
O que aconteceu, segundo afirmou o secretário, foi uma “coincidência retórica”. Ele disse que “não há nada de errado com a frase” e que a esquerda está “tentando desacreditar” a iniciativa.
“O que a esquerda está fazendo é uma falácia de associação remota”, escreveu. “Com uma coincidência retórica em uma frase sobre nacionalismo em arte estão tentando desacreditar todo o Prêmio Nacional das Artes [programa anunciado na ocasião], que vai redefinir a Cultura brasileira”.
No vídeo, Alvim afirmou que 2020 será um ano de “renascimento” para a cultura e defendeu o “conservadorismo em arte”.
“Eu não citei ninguém. O trecho fala de uma arte heroica e profundamente vinculada às aspirações do povo brasileiro. Não há nada de errado com a frase”, reformou Alvim. “Todo o discurso foi baseado num ideal nacionalista para a Arte brasileira. Não o citei e jamais o faria, mas a frase em si é perfeita”.
“Culpa da assessoria”
A desculpa da “coincidência retórica” não convenceu nem mesmo os apoiadores mais ingênuos. Horas mais tarde, com medo de ser demitido, Alvim apressou-se para lançar uma nova justificativa.
Alvim admitiu ter redigido 90% do pronunciamento veiculado ontem, mas não se responsabilizou pelas frases copiadas de um dos textos do ministro da Alemanha nazista.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, Alvim classificou o episódio como uma “casca de banana”, questionado se deveria ou não pedir desculpas, declarou: “Eu não posso me desculpar por uma coisa que eu não fiz deliberadamente”.
Na versão dele, as frases que remetem a Goebbels teriam sido colocadas em sua mesa pelos assessores que se dedicaram à pesquisa. A ideia original, segundo afirmou Alvim, era buscar no Google discursos sobre o tema “nacionalismo em arte”.
Compare o discurso de Alvim com o de Goebbels:
“A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes de nosso povo, ou então não será nada” (Alvim).
“A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e vinculante, ou então não será nada” (Goebbels).
Além dos trechos do pronunciamento, a estética do vídeo, a aparência do secretário, o vocabulário, o tom de voz e a trilha sonora escolhida fazem lembrar o nazismo.
Uma das referências no vídeo é a música de fundo, que veio da ópera “Lohengrin”, de Richard Wagner, uma obra que Hitler contou em sua autobiografia ter sido decisiva em sua vida.
Demitido
A Secretaria Especial da Cultura informou na tarde desta sexta-feira (17), por meio de sua assessoria de imprensa, que o secretário Roberto Alvim foi demitido do cargo.
Na manhã desta sexta (17), Planalto havia avisado o Congresso que secretário seria demitido após a repercussão do caso e a manifestação pública da classe política. Entre os que pediram a saída de Alvim está o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Ramos, telefonou para líderes do Congresso e avisou que o porta-voz da Presidência, general Rego Barros, deve anunciar a demissão.
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