História

O dia em que soube que o coração de LEM estava guardado em um pote de vidro

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"Em 1998, uma informação incrível caiu nas minhas mãos: o coração de Luís Eduardo Magalhães, 43 anos, possível sucessor de FHC, estava guardado em um pote de vidro, dentro de um armário de ferro, no Hospital de Base de Brasília [...]". O que essa lembrança tem a ver com o Brasil atual e o Reino Unido?

Luis Eduardo Magalhães (Imagens: Acervo Globo)

por Leandro Fortes, via Facebook

Em 1998, eu era repórter do Correio Braziliense e uma informação incrível caiu nas minhas mãos: o coração de Luís Eduardo Magalhães, deputado do antigo PFL, vítima de um infarto, aos 43 anos, estava guardado em um pote de vidro, dentro de um armário de ferro, no Hospital de Base de Brasília.

Luís Eduardo não era um deputado qualquer. Era filho do então todo poderoso Antonio Carlos Magalhães, o coronel baiano que mandava e desmandava no governo Fernando Henrique Cardoso e tinha no jovem deputado o herdeiro ideal para duas missões de vida: manter a hegemonia carlista, na Bahia, e ser sucessor de FHC, na Presidência da República, nas eleições de 2002.

Ao final da minha apuração, depois de ouvir médicos e enfermeiros, eu havia descoberto que ACM mandara arrancar o coração do próprio filho para evitar, na autopsia, que se constatasse a presença de cocaína no músculo cardíaco – o que, de fato, nunca pôde ser checado, graças à providência do pai, então presidente do Senado Federal.

Quando se deparou com a manchete do Correio com a minha história, ACM, com o auxílio de um dedicado lacaio, o jornalista Fernando César Mesquita, convocou uma entrevista coletiva para anunciar, às lágrimas, uma mentira colossal.

O coração de LEM, como o deputado era conhecido, havia sido tirado do corpo para ser enterrado sob uma estátua a ser colocada em homenagem ao parlamentar morto, em Salvador.

Assim, às custas do contribuinte, a capital baiana teve que abrigar, por muitos anos, na avenida Paralela, um mausoléu ridículo com uma estátua de bronze de Luís Eduardo aos pés da qual se lia, em letras douradas: “Aqui jaz o coração de Luís Eduardo Magalhães”. Tudo para levar uma mentira louca até às últimas consequências.

Na coletiva organizada por ACM, foi feita apenas uma exigência: eu, autor da reportagem, não poderia participar.

O que fizeram os coleguinhas, à época? Não só compareceram à coletiva como, no dia seguinte, reverberaram alegremente a versão de ACM sem uma única nota crítica a respeito. Aceitaram a mentira e o ridículo sem remorso algum.

Ao saber do boicote dos repórteres ingleses ao assessor de Boris Johnson, primeiro-ministro da Inglaterra, que vetou a participação de alguns jornalistas na coletiva sobre o Brexit, me veio à memória essa história.

Também me fez refletir sobre a posição humilhante desse grupo de repórteres que, diariamente, se submete ao escárnio de Jair Bolsonaro, na porta do Palácio da Alvorada, sob a histeria da claque de idiotas mantidos de plantão, para abanar o rabo para o presidente – bem ao lado do cercadinho montado para a imprensa.

Nos dois casos, mesmo com a diferença de mais de duas décadas, uma constatação triste: o ofício continua dominado por tarefeiros e serviçais. Um horror.

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