Jovem vítima de homofobia permanece acamado; mãe perdeu 25 quilos
Jovem estuprado e espancado por ser homossexual permanece em estado crítico após um ano. Aos 23 anos, ele perdeu a fala, os movimentos e as expressões. Mãe abandonou o emprego para cuidar do filho. Sem comer ou dormir, ela passou a tomar remédios e vive rotina de sofrimento eterno
Aos 23 anos, Jefferson Anderson Feijó da Cruz foi brutalmente espancado com um pedaço de pau e estuprado na cidade de Moreno, em Pernambuco, em dezembro de 2018. O motivo do crime: ser homossexual.
Mais de um ano depois do ocorrido, Jefferson perdeu completamente a fala, as expressões e os movimentos. Ele ficou internado durante 6 meses e, neste período, permaneceu um mês em coma. Agora, o jovem recebe tratamento em casa, numa “enfermaria” improvisada em seu quarto.
O nome do autor da tentativa de homicídio é Robson da Silva Alexandre, de 25 anos. Ele foi preso em maio de 2019 e denunciado pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE) pelos crimes de roubo qualificado e estupro.
Etiene Feijó de Melo, 51, mãe de Jefferson, diz que se sentiu aliviada após a prisão do agressor. No entanto, seu drama cotidiano parece não ter data para acabar.
“Quando meu filho dá uma respiração mais forte, eu corro para ele e digo ‘mamãe está aqui, meu amor’. Ele se acostumou tanto com o meu jeito que até a enfermeira diz ‘mamãe está aqui, meu amor’, e ele se acalma. Mas estou mal. Já não consigo dormir, tomo remédio para a ansiedade e já perdi 25 quilos”, revelou a mulher, em recente entrevista ao portal UOL.
Marcos Cícero da Cruz, pai de Jefferson, conta detalhes do que ocorreu na noite do crime: “Eu tinha chegado de viagem à 1h da madrugada. Descarreguei o caminhão e fui para a enseada, onde minha esposa me esperava com uma amiga. Etiene não se sentia bem, falava em pressentimento.”
“Às 5h, recebi uma ligação”, lembra a mãe. “Disseram que ele tinha caído de moto, estava em estado grave no hospital. Eu desconfiei porque era muito raro ele andar de moto.”
Os dois foram para o hospital, mas não tiveram notícias até o começo da tarde. Etiene começou a se desesperar quando, finalmente, deixaram o pai entrar:
“O rosto estava irreconhecível. Os golpes foram quase todos na cabeça”, diz Marcos Cícero. “O couro cabeludo tem vários afundamentos de crânio. Ele teve uma orelha cortada e um braço quebrado, mas os médicos se preocuparam primeiro com uma cirurgia de urgência para salvar a vida dele. Deu certo, graças a Deus.”
“A nossa vida mudou da água para o vinho. Saímos da nossa casa em Moreno porque ela não oferecia condições para montar uma enfermaria no quarto, e por ser longe do hospital de Olinda”, diz o pai. “Como perdi o emprego, passei o fim do ano ajudando minha esposa, que deixou o trabalho para cuidar exclusivamente do Jefferson.”
O trabalho pesado, admite Marcos, fica com dona Etiene. O monitoramento é 24 horas. O remédio contra convulsão é dado de seis em seis horas; a dieta é a cada três, com a primeira às 6h e a última, às 21h.
É ela quem limpa o quarto, cuida do almoço e ajuda a enfermeira com o banho. Pelo menos três vezes ao dia, ela retira a secreção acumulada e umedece as narinas do filho. “A gente não pode deixar ele sozinho por nenhum minuto”, diz Marcos.
Dez fraldas por dia
O casal gastava R$ 8.690 ao mês para cuidar de Jefferson. Hoje, esse gasto gira em torno de R$ 5.500, dinheiro fruto de doação. Com o valor, o casal paga o aluguel da casa, os médicos, enfermeira e os insumos para cuidar do filho. “O mingau que ele toma pela sonda custa R$ 575 ao mês”, diz a mãe. “Fralda, ele usa dez por dia.”
Como Jefferson não consegue mastigar, ele precisa ingerir os alimentos por sonda. Uma lata de 240 gramas de suplementação de proteína custa até R$ 90 enquanto o litro de suplemento de fibras não sai por menos de R$ 25.
A enfermaria no quarto foi montada com dinheiro doado: “Ganhamos uma cadeira de rodas preparada para ele e o movimento “Lute Como Ele” conseguiu uma maca ortostática para ele ficar em pé e melhorar a oxigenação motora. Só ela custa R$ 6.900″, afirma o pai.
Remédios e perda de peso
“Hoje é mais difícil para mim do que no começo”, diz Etiene. “Antes, estava no hospital e voltava para casa para descansar. Agora não tem descanso. Hoje eu fico toda tremendo, mas a gente vai cuidado. Até a educação de comer eu perdi. É uma coisa feia porque agora eu como ligeiro. Aprendi lá no hospital: comer e correr para ficar com o Jefferson.”
“Ele se acostumou muito com meu jeito, se apegou a mim. Quando ele passa muito mal, eu chego perto e digo: ‘mamãe não te deixa’, e ele volta. Eu peço para ele rir, e ele ri. Ele atende a minha voz”, diz, emocionada.
Mas a rotina adoeceu Etiene. “Procurei um médico e agora tomo remédio para ansiedade e para dormir. Se acordo na madrugada, não durmo mais. Eu amo cuidar do meu filho, mas estou cansada, sabe? Perdi mais de 25 quilos, minhas roupas eu dei tudo.”
“Ele [Robson] é um monstro. Tem de ficar em uma jaula. Quando meu filho piora, fico revoltada com aquele monstro. Eu nem sei o nome dele”, diz a mãe. “Eu peço para Deus tirar o que eu sinto do meu coração, mas eu não consigo. Agora há pouco eu tive pena, depois eu tive ira. As pessoas não me entendem.”
Evolução do quadro
Apesar de ainda não se movimentar, os médicos estão otimistas com a evolução de Jefferson. Ele é cuidado por um fisioterapeuta motor, outro respiratório e uma fonoaudióloga, “para que ele volte a falar e a deglutir”.
Os médicos, diz o pai, estão otimistas. “Há duas semanas, ele emitiu o som de ‘mamãe’. Não foi nítido, foi como uma criança aprendendo a falar.”
O avanço é tamanho que os médicos se preparam para um teste de 48 horas: “Vão vedar 50% do tubo [para respiração]. Se tudo der certo, vão tirar o tubo para ele respirar pelo nariz e boca”, espera Marcos.
Quem deseja ajudar Jefferson e a sua família, é possível contribuir com uma arrecadação virtual no http://vaka.me/598112