Saúde

O ‘surto apocalíptico’ de coronavírus em um hospital de Nova York

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Em hospital de Nova York, as chamadas pelo alto-falante de “Equipe 700”, código usado para indicar que um paciente está à beira da morte, são ouvidas várias vezes em cada turno de trabalho. Do lado de fora, um caminhão refrigerado estacionado recebe os corpos

Imagem do Elmhurst Hospital, em Nova York (Eduardo Munoz Alvarez/Getty Images)

Reportagem do The New York Times
Tradução de Clara Allain

Ao longo de algumas horas na terça (24), Ashley Bray, no Elmhurst Hospital Center, fez compressões torácicas sobre uma mulher de mais de 80 anos, um homem na casa dos 60 e um rapaz de 38 que lembrava o médico de seu noivo.

Todos haviam recebido o diagnóstico de coronavírus e sofrido paradas cardíacas. Todos acabaram morrendo.

Elmhurst, hospital público com 545 leitos no distrito de Queens, em Nova York, começou a transferir pacientes com outros problemas médicos para outros hospitais, visando dedicar-se inteiramente à pandemia.

Médicos e enfermeiros estão lutando para trabalhar com apenas algumas dezenas de respiradores. As chamadas pelo alto-falante de “Equipe 700”, código usado para indicar que um paciente está à beira da morte, são ouvidas várias vezes em cada turno de trabalho.

Alguns pacientes já morreram no pronto-socorro enquanto ainda aguardavam um leito.

Um caminhão refrigerado estacionado diante do hospital recebe os corpos. O sistema de hospitais públicos de Nova York informou que 13 pessoas morreram no hospital Elmhurst nas últimas 24 horas.

“É apocalíptico”, disse Bray, 27, residente de medicina geral no hospital.

Hospitais de toda a cidade, que virou o epicentro da pandemia de coronavírus nos Estados Unidos, estão começando a enfrentar o tipo de aumento assustador de casos de Covid-19 que sobrecarregou completamente os hospitais da China, Itália e outros países.

Na noite de quarta-feira (25), Nova York contava 20.011 casos da doença e 280 mortes.

Mais de 2.800 pacientes com Covid-19 foram hospitalizados na cidade. Na quarta-feira, o governador Andrew Cuomo ofereceu um pequeno raio de esperança de que as medidas de distanciamento social estejam começando a desacelerar o aumento das internações hospitalares.

Mesmo assim, os hospitais se preparam para receber um influxo enorme de doentes.

Nesta semana, as estimativas de hospitalização na cidade apresentaram queda marcante: o número de casos está dobrando a cada quatro dias, em vez dos dois dias vistos antes.

“É quase bom demais para ser verdade”, disse o governador.

Trabalhando com autoridades estaduais e federais, os hospitais ampliaram diversas vezes as partes de suas instalações equipadas para receber pacientes que permaneceram em casa até a piora da febre e a dificuldade de respirar os terem obrigado a buscar pronto-socorros.

Mitchell Katz, diretor da Health and Hospitals Corp., que administra os hospitais públicos de Nova York, disse que há planos em andamento para transformar muitas áreas do hospital Elmhurst em UTIs para doentes em estado grave.

Mas os hospitais da cidade podem estar prestes a perder suas possibilidades de ser criativos na busca por novos espaços.

Está previsto que, até sexta-feira (27), todas as mais de 1.800 vagas em UTIs de Nova York estejam ocupadas, segundo documento da Agência Federal de Gestão de Emergências (Fema) ao qual o New York Times teve acesso. Os pacientes às vezes ficam semanas na UTI, limitando as vagas para novos pacientes.

Cuomo disse na quarta-feira que não havia visto o briefing. Afirmou que esperava que os hospitais pudessem criar novas vagas rapidamente, aproveitando o aumento no estoque de respiradores, as máquinas que alguns pacientes de coronavírus precisam para respirar.

O governo federal está enviando a Nova York um navio-hospital com mil leitos, mas sua chegada só está prevista para meados de abril.

Autoridades começaram a construir quatro hospitais de 250 leitos no Centro de Convenções Jacob K. Javits, em Manhattan, que podem ficar prontos em uma semana.

O presidente Donald Trump disse no Twitter na quarta-feira que os trabalhos estão adiantados, mas não foi possível obter confirmação independente disso.

Também está sendo discutida a possibilidade de converter hotéis e arenas culturais em instalações médicas temporárias.

Os necrotérios de pelo menos dois hospitais da cidade já estão cheios, e as autoridades preveem que os dos outros hospitais atinjam o máximo de sua capacidade até o final da semana, segundo o briefing.

A prefeitura teria pedido à Fema 85 caminhões refrigerados, com funcionários, para fazer as vezes de necrotérios.

Uma porta-voz do instituto médico legal de Nova York disse que o briefing está incorreto. “Temos uma capacidade importante nos nossos cinco necrotérios na cidade, e ela pode ser ampliada”, disse ela.

Médicos e enfermeiros entrevistados em hospitais da cidade relataram que estão sobrecarregados, chegando perto do limite.

Funcionários de vários hospitais, incluindo o Centro Médico Jacobi, no Bronx, disseram que profissionais como obstetras e radiologistas foram convocados para trabalhar nas salas de emergência.

Uma ou duas mortes por coronavírus, ou mais, têm ocorrido numa ala do Centro Médico Montefiore, também no Bronx, segundo a enfermeira Judy Sheridan-Gonzalez.

Nem sempre há macas em número suficiente, então alguns pacientes ficam sentados em cadeiras. A enfermeira disse que, no domingo, um paciente ficou 36 horas sem maca ou leito.

A médica Rikki Lane, que trabalha há mais de 20 anos no Elmhurst, disse que o hospital recebeu “a primeira onda deste tsunami”.

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Ela comparou o cenário no departamento de emergências com um estacionamento superlotado em que os médicos precisam transferir pacientes de uma vaga a outra para conseguir acessar outros pacientes bloqueados por macas.

Segundo Lane, os familiares dos pacientes não podem entrar no local.

Ela disse que atendeu recentemente um homem na casa dos 30 anos cuja respiração se deteriorou rapidamente, exigindo que ele fosse intubado.

“Ele estava angustiado e em pânico, eu podia ver o terror em seus olhos”, contou. “Ele estava sozinho.”

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