Anderson Pires*
O assunto mais discutido da semana é o vídeo da reunião ministerial, no qual supostamente o Presidente da República teria feito declarações que comprovariam sua tentativa de influenciar politicamente à Polícia Federal.
Quem divulgou a existência desse vídeo foi o ex-ministro Sérgio Moro, no momento em que anunciava a sua saída do Ministério da Justiça.
Todos sabemos que Moro é fanático por vazamentos de vídeos, áudios e documentos que, de alguma maneira, permitam alcançar seus objetivos, seja por vias legais ou não. É quase um fetiche, visto que Bolsonaro foi o quarto presidente do Brasil alvo dessa prática.
Apesar de cenas de pornografia política não serem novidade no Brasil, sempre que Moro está envolvido querem transformá-lo num mero observador passivo. O seu papel de voyeur recebe a complacência de quem, por alguma questão moral ou de interesse pessoal, vê nele um álibi para dizer que não participou da orgia.
O inocente Sérgio Moro seria uma espécie de enviado divino para fiscalizar os malfeitos que os políticos cometem e, de forma heroica, avisar a legião de bons cidadãos. Para isso vale tudo, inclusive a divulgação de cenas picantes de uma reunião que não tem absolutamente nada de conclusiva. Porém, como passou a ser conveniente para os apoiadores arrependidos de Bolsonaro tirá-lo do poder, interpretam o que foi dito como algo aberrante, inaceitável, quase pornográfico.
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Esse roteiro está cansativo. A narrativa Global onde Moro é o paladino da moral e os presidentes de plantão são destituídos ficou repetitiva. Lembra as novelas, sempre permeadas por um mesmo fio condutor, que se adequa à expectativa do público, mas o final será sempre feliz para a Globo e os seus.
O episódio envolvendo Bolsonaro parece até piada. Tem algo mais óbvio que o presidente influenciar um órgão de Estado? Quando foi que cargos de confiança não estiveram sujeitos à influência política? Alguém tem dúvida de que Sérgio Moro indicou Maurício Valeixo por atender as suas orientações e conveniências? Ou tem quem arrisque dizer que os motivos foram estritamente técnicos?
O mesmo Valeixo, que estava na Direção Geral da PF, fez dobradinha com Moro na operação Lava Jato e por diversas vezes ambos passaram dos limites da lei, sem que isso gerasse qualquer constrangimento. Trabalharam guiados pelos interesses políticos que defendiam. Em momento algum, vimos Moro ter um rompante em defesa da preservação das instituições e do papel da PF como órgão de Estado.
A Polícia Federal de Valeixo e Moro foi um agente político quando realizaram conduções coercitivas espetaculares, promoveram acordos de delação com presos sob coação, vazaram conteúdo às vésperas das eleições e montaram inquéritos baseados em convicções.
Não bastassem todas essas evidências, Moro construiu a prova irrefutável que faltava: assumiu o Ministério da Justiça e Segurança no Governo Bolsonaro, com direito a status de superministro, espaço na mídia equiparado a um pop star, promessa de indicação para o Supremo e a liberdade para montar seu comitê político, no qual Valeixo era homem de confiança.
Mas como a especialidade de Moro é vazamento, ele armou mais uma trama condenatória com base na divulgação de conversas que teve com Bolsonaro por mensagens. Sobrou até para sua afilhada de casamento, a Deputada Carla Zambelli, que também teve uma conversa vazada. Mais uma vez, a base de provas ficou no campo das suposições. Rapidamente, os amigos globais de Moro entraram em cena para que as mais diversas hipóteses fossem construídas sobre os motivos que levariam o presidente a exigir a mudança na Direção da Polícia Federal.
A versão do Sérgio Moro indignado com a ingerência política não casa com sua trajetória. A biografia que ele diz ter a preservar está eivada de episódios de uso político da Polícia Federal.
Se fizermos um resgate mais profundo da vida profissional do Juiz Sérgio Moro, teremos desde de acordos anteriores com o doleiro Alberto Youssef, participação de advogados próximos na intermediação de delações que renderam milhões em honorários até ligações suspeitas da sua mulher com escritórios de advocacia e políticos. Em tudo isso caberia muita suposição.
Sérgio Moro acredita que poderá passar ileso, sem que mele pelo menos as barras da calça com a lama que ajudou a tanger.
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Nesse episódio, a única certeza que se pode tirar: Moro é um aliado desleal, capaz de tramar, trair e delatar seus parceiros. Caso lhe renda alguma vantagem, publiciza até aquilo que é dito por amigos íntimos de forma pessoal e privada. O ex-juiz, ex-ministro e sempre político mostrou que pouco importa quem irá atingir com seus vazamentos cheios de insinuações. Seu caráter fica cada dia mais evidente. Só falta vazar fotos íntimas.
*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário e cozinheiro.
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