Anderson Pires
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Jair Bolsonaro 12/Mai/2020 às 17:07 COMENTÁRIOS
Jair Bolsonaro

Porque não falei de flores

Anderson Pires Anderson Pires
Publicado em 12 Mai, 2020 às 17h07

Tem um lado bom nessa história? Claro que sim. As pessoas com o mínimo de senso humanitário perceberam a aposta errada que fizeram.

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(Imagem: Júlio Nascimento | PR)

Anderson Pires*

Eu gostaria de falar de flores, poesia e sabores, mas Bolsonaro não deixa. Pois é, meus caros habitantes do Brasil, o nosso digníssimo aprontou mais uma das suas peripécias.

Ontem, alterou o decreto que estabelece quais são as atividades essenciais no período de quarentena e inseriu a barbearia, o salão de beleza e a academia na lista. Achei de uma coerência magnífica.

A justificativa de que são atividades complementares à promoção da saúde e higiene foi por demais apropriada. Não fosse pelo detalhe da sua definição vir do Palácio do Planalto e do Ministério da Economia, sem qualquer consulta ao Ministério da Saúde ou técnicos da área, seria perfeita.

Pelo jeito Bolsonaro resolveu testar o seu Ministro da Saúde. Fez a mudança no decreto sem avisar e deixou que a surpresa ficasse por conta dos jornalistas em uma entrevista coletiva.

Teich passou no teste com louvor. Escancarou o seu caráter meramente figurativo, deu sinais de demência explícita (ou desfaçatez), sem em momento algum elevar o tom ao ponto de parecer insubordinação ou ousadia. Comportou-se como os militares gostam. Fez as vezes do soldado subserviente e sem capacidade cognitiva para qualquer reação. Palmas para o Teich.

Voltando às novas atividades essenciais, reforço a coerência que vi nas escolhas feitas pelo presidente. Vamos pensar.

Quais os serviços realmente essenciais a oficiais reformados do Exército Brasileiro? Cortar os cabelos, aparar a barba e fazer alguma atividade física para manifestar uma certa altivez. Ora, temos um governo de militares, ou seja, trata-se de um país governado para quem tem como prioridade aquilo que na percepção deles é essencial. Seria estranho se lutassem pela reabertura de bibliotecas ou laboratórios de pesquisa.

Bolsonaro e sua turma têm essa qualidade inquestionável: a coerência.

O conjunto atende sempre aos preceitos que defendeu ao longo da vida: total falta de apreço à democracia (o autoritarismo é sempre o que conduz suas ações), negação a qualquer tipo de pensamento que seja amparado no saber científico (quanto mais a ciência for negada, melhor para esconder a sua incapacidade como gestor) e desprezo pelos seres humanos e pela vida (as Forças Armadas Brasileiras abriram mão do pensamento humanista na década de 30. Segundo os oficiais da época, “colocar gente como prioridade era um perigo à nação”).

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Ontem, tivemos mais um episódio que reafirma tudo isso. Por um lado, fico feliz, porque talvez Bolsonaro seja o primeiro exemplo de um político coerente com aquilo que sempre foi. Por outro, fico imensamente triste, o que me impede de falar de coisas boas, principalmente quando lembro que ele foi escolhido pelo voto da maioria de um povo (algo que além de legitimar o cargo que ocupa, evidencia que a maioria fez opção pelos os mesmos valores).

Antes que alguém diga que votou nele para combater a corrupção, aviso logo: conta outra. As milícias e os corruptos acompanham Bolsonaro ao longo da vida. Ainda pode ter quem diga: mas os militares estão com ele para conter a corrupção!

O melhor a fazer é revisitar a história. Foram esses militares que compraram oito usinas nucleares e só receberam uma, dos mesmos alemães que até outro dia desviavam recursos do metrô de São Paulo. Podemos contar também absurdos como a Transamazônica e milhares de exemplos de corrupção, sem que fosse permitida qualquer apuração. Bastava soletrar a primeira sílaba contestando para o pau cantar.

Tem um lado bom nessa história? Claro que sim. As pessoas com o mínimo de senso humanitário perceberam a aposta errada que fizeram.

O arrependimento é um sentimento nobre, melhor ainda se servir para provocar reações. Mostra ausência do orgulho e instinto de sobrevivência acima de tudo. Aos que continuam cultivando seu Genocida Favorito, resta fazer cara de paisagem como Teich, deixar o queixão cair, olhar para os lados e, se der de cara com um algum dos honestos integrantes do Centrão, seja gentil, dê um sorriso. Bolsonaro irá gostar.

*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário e cozinheiro.

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