Governo Bolsonaro atrasa mais uma vez divulgação do balanço da pandemia do coronavírus para evitar cobertura dos telejornais. Pelo terceiro dia consecutivo, Brasil bate recorde diário de mortos e ultrapassa a Itália em número total de óbitos
O Ministério da Saúde divulgou no final da noite de hoje que o Brasil teve 1.473 mortes decorrentes do coronavírus em apenas 24 horas. O País agora acumula 34.021 óbitos. Já são três dias consecutivos de recorde diário de mortos — ontem foram contabilizados 1.349.
Os números atualizados hoje fazem do Brasil o terceiro país que mais perdeu vidas para a covid-19 nesta pandemia. O País ultrapassou a Itália, que registra 33.689 mortes, e agora está atrás apenas de Reino Unido (39.904) e Estados Unidos (110.144), segundo os dados oficiais de cada país.
A Itália registrou seu primeiro caso de covid-19 em 31 de janeiro, portanto cerca de um mês antes do que o Brasil. A doença alcançou o pico de contaminação entre os italianos na segunda quinzena de março e desde então retraiu consideravelmente. Segundo dados do governo local, o número de novos casos registrados na Itália hoje foi de 177, o menor desde fevereiro.
Se a Itália está do lado de lá do pico da pandemia, o Brasil ainda vive a escalada da doença. O Ministério da Saúde contabilizou 30.925 diagnósticos hoje, portanto 174 vezes mais do que os italianos. A diferença é clara quanto aos números de casos ativos da covid-19 em cada país: são 38.429 na Itália e 325.984 no Brasil.
A diferença já fica clara nos dados oficiais, mas na vida real é ainda maior devido à taxa de testagem dos dois países. A Itália fez mais do que o dobro de exames do que o Brasil, mesmo não tendo nem sequer um terço da população brasileira. A taxa italiana é de 66,7 exames a cada 1.000 habitantes; a do Brasil é de apenas 8,7, segundo o Ministério da Saúde.
Cloroquina e Lockdown
Diferentemente do Brasil, a Itália começou a aderir ao lockdown apenas três semanas após registrar o primeiro caso. As restrições foram impostas a pequenas cidades da Lombardia em 22 de fevereiro, estendidas à região inteira 14 dias depois, e em 9 de março o país inteiro já estava em lockdown.
Foram dez semanas assim até o isolamento começar a ser flexibilizado, na metade de maio. Quando começou a reabrir, a Itália já registrava menos de 500 novos casos de covid-19 por dia, o que motivou o primeiro-ministro Giuseppe Conte a caracterizar a decisão como “risco calculado”. Desde então, os casos seguem diminuindo.
Os italianos também proibiram a cloroquina, que no Brasil é tratada como panaceia pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e parte de seus apoiadores.
Balanço atrasado
Os atrasos na divulgação do balanço do panorama da pandemia no Brasil preocupa médicos e cientistas.
“Não consigo avaliar a real intenção por trás disso, mas se a comunicação não se dá de forma ágil e transparente, isso com certeza atravanca ainda mais o debate sobre o assunto e a formação de políticas públicas. Se o Ministério pudesse atualizar os dados mais rapidamente e de forma mais transparente, traria uma dinâmica muito melhor. Isso [o atraso] pode nos dar uma falsa sensação do estado atual das coisas”, explicou Natanael Adiwardana, infectologista do Hospital Emílio Ribas.
Para Paulo Lotufo, epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), o atraso na divulgação visa conter a repercussão negativa que grandes aumentos nos números têm na cobertura da imprensa.
“Estão tirando para não sair no jornal. É de certa forma uma censura. Eles tentam segurar ao máximo; a saída para isso é basear [o noticiário] direto nos dados das secretarias”, denunciou.
“O Ministério da Saúde está sem ministro, com dois ministros que saíram em menos de um mês. Essa situação é complicada. O nosso risco agora é de um apagão técnico. E que eu acho que é isso que está acontecendo”, afirmou Bernadete Perez, vice-presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva).
Agência Estado
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