A esquerda não entendeu o recado de 2018 e caminha para o precipício
A caminho do precipício: é absolutamente realista considerar a hipótese de que os principais partidos de esquerda no Brasil não elejam nenhum prefeito nas capitais. No Sudeste, a esquerda pode não ir sequer ao segundo turno
Ricardo Cappelli
“Quando você olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você”. Nietzsche
Faltando poucos meses para as eleições municipais, o cenário é desolador para o campo progressista.
É absolutamente realista considerar a hipótese de que PT, PDT, PSB, PCdoB e PSOL não elejam nenhum prefeito nas capitais. É possivel vitórias em apenas duas ou três. Será motivo de grande comemoração.
No Sudeste, a esquerda pode não ir sequer ao segundo turno. No Sul, a única chance está em Porto Alegre. No Centro-Oeste, só uma “zebra”. No Norte, parece que só Belém ainda “respira”. No Nordeste, personagens de centro-direita ou bolsonaristas lideram as pesquisas em boa parte das capitais.
Perdida, dividida e envolvida numa guerra sangrenta pela hegemonia do campo, a esquerda parece não ter compreendido – ou se recusa a aceitar – o recado das urnas em 2018.
O eixo da política nacional foi empurrado para a extrema-direita, alterando o posicionamento de todas as peças no tabuleiro. De lá pra cá, o cenário mudou pouco.
Bolsonaro perdeu parte da classe média com sua postura diante da pandemia, mas tudo indica que trocou de base através do auxílio emergencial. Se vai durar ou não, ainda é uma incógnita.
Já passamos de 70 mil óbitos, alguém mais o deixará em função das mortes? A classe média que abandonou o barco vai pra onde? Marcha com Moro ou volta para os “vermelhos”?
Claro que o resultado da economia sempre pode desestabilizar o governo. Neste setor, os resultados de 2021 e 2022 serão piores ou melhores do que o desastre de 2020?
O capitão está reorganizando o seu governo. Trocou seus líderes na Câmara. Avançou no acordo com o Centrão. Está tentando estabilizar sua relação com o STF. Conseguiu calar por 20 dias seu principal opositor: ele mesmo. Arrefeceu a agenda ideológica e deu novamente centralidade à pauta econômica.
Não existe oposição com uma estratégia definida. Ainda estamos na fase de acordos pontuais em torno de questões específicas, importantes, mas insuficientes.
Com o risco de impeachment cada vez mais distante, quem será o principal adversário do capitão em 2022? A oposição liberal seguirá dividida entre Moro, Doria, Huck, Mandetta e outros? A convergência destes atores pode colocá-los no segundo turno contra o presidente?
A ressaca das eleições municipais será dura e educativa. Só uma reviravolta improvável, com a unificação das candidaturas progressistas, poderia mudar este quadro.
Tragédias têm o poder de provocar profundas reflexões. Costumam promover mudanças drásticas nas formas de ver e compreender o mundo.
Pelo amor ou pela dor, sua excelência, a realidade, sempre acaba se impondo. Nestas horas, nada fala mais alto que o instinto de sobrevivência. Ele vai gritar em 2021.