Ao condenar homem negro, juíza de Curitiba afirmou na decisão que o réu é "seguramente integrante de grupo criminoso, em razão de sua raça, e causava desassossego e a desesperança da população"
Igor de Carvalho, Brasil de Fato
Acusado de integrar uma organização criminosa e praticar furtos, Natan Vieira da Paz, 48 anos, foi condenado a 14 anos e 2 meses de prisão pela juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba (PR). A decisão foi proferida no dia 19 de junho e publicada na última terça-feira (11). No texto, a magistrada acusa o homem de praticar os crimes por ser negro.
“Sobre sua conduta social nada se sabe. Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente”, escreveu Zarpelon na página 107, de 115, de sua sentença condenatória.
Em outros dois trechos, na página 109 e 110, a magistrada repete a mesma afirmação ao citar o acusado. “Sobre sua conduta social nada se sabe. Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça.”
Além de Vieira da Paz, outras oito pessoas foram julgadas e condenadas na mesma ação pela juíza Zarpelon. De acordo com a decisão, o grupo formava uma organização criminosa que, entre os meses de janeiro de 2016 e julho de 2018, praticou furtos e saidinhas de banco nas praças Carlos Gomes, Rui Barbosa e Tiradentes, na região central de Curitiba. Eles teriam furtado mochilas, bolsas, carteiras e celulares.
A advogada de Vieira da Paz, Thayse Pozzobon, recorrerá da decisão de Inês Marchalek Zarpelon e acionará o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que o julgamento seja anulado, por conta do racismo praticado pela magistrada na sentença.
“Infelizmente, resta evidente o racismo nas palavras da juíza que entendeu que Natan é criminoso por ser negro e deve ser condenado. Essa prática é intolerável. Essa sentença deve ser anulada e proferida por uma juíza absolutamente imparcial. Eu já acionei a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] do Paraná e as comissões de igualdade e direitos humanos, também tomarei providência junto à corregedoria e ao CNJ”, afirma a advogada.
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Para Douglas Belchior, fundador da Uneafro, não há dúvida sobre racismo no episódio. “Essa juíza racista precisa perder o mandato e responder pelo crime que cometeu. O Ministério Público precisa se posicionar e abrir uma ação penal. É uma sentença e uma postura inadmissível. E isso joga luz a outro tema recorrente: o caráter estruturalmente racista do judiciário acarreta decisões seletivas todos os dias desde sempre. Até quando?”, pergunta o militante.