Eleições 2020

Em João Pessoa, caciques se unem em torno de candidato bolsonarista

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Apresentador de programa policialesco, Nilvan Ferreira ascendeu eleitoralmente com discursos moralistas e "apolíticos" e pautou sua campanha vendendo a si mesmo como um quadro de renovação, mas não se constrangeu em dar as mãos aos caciques que representam o que há de mais arcaico na política local

Cássio Cunha Lima, José Maranhão, Nilvan Ferreira e Major Milanez

Caciques da velha política paraibana decidiram entrar com vigor no segundo turno da disputa pela prefeitura municipal de João Pessoa (PB). O candidato abraçado pelas oligarquias locais é o bolsonarista Nilvan Ferreira (MDB), que terminou em segundo lugar no primeiro turno.

Apadrinhado pelo ex-governador José Maranhão, de 87 anos, Nilvan recebeu nesta semana o apoio do ex-senador Cássio Cunha Lima (PSDB), 57. Os dois são considerados os maiores coronéis do estado e seus grupos políticos se perpetuaram no poder por décadas.

Em Campina Grande, segunda maior cidade da Paraíba, Cássio viu no domingo passado o primo Bruno se eleger prefeito com folga no primeiro turno. Os Cunha Lima também elegeram aliados em diversos outros municípios paraibanos, em um claro indicativo de que a força do clã, embora sofra abalos ocasionais, segue perdurável.

Em 2008, no seu segundo mandato de governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima foi cassado por unanimidade pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por distribuir 35 mil cheques a cidadãos carentes na campanha eleitoral de reeleição em 2006. Os cheques totalizavam cerca de R$ 4 milhões.

O ex-governador tucano ainda é investigado no episódio que ficou nacionalmente caracterizado como o “escândalo do dinheiro voador”. O caso é conhecido por ter provocado, literalmente, uma chuva de dinheiro em João Pessoa. Isso porque para não ser pego em flagrante pela Polícia Federal, o braço-direito de Cássio, Olavo Lira, jogou R$ 400 mil em espécie do alto do edifício Concord, localizado na avenida mais movimentada da cidade.

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Nilvan com José Maranhão e Romero Rodrigues (PSD), atual prefeito de Campina Grande e apadrinhado de Cássio (divulgação)

Da TV para a política

Apresentador de programa policialesco, Nilvan Ferreira ascendeu eleitoralmente com discursos moralistas e “apolíticos” na televisão aberta.

Ancorados na defesa da violência praticada por policiais e o uso de cenas de assaltos, perseguições, troca de tiros e cadáveres, essas atrações garantem audiência às emissoras e moldam na cabeça de parte da opinião pública a imagem de seus apresentadores como paladinos da Justiça.

O uso das emissoras de rádio e televisão como trampolim para a política é prática frequente no país. Mesclando populismo exacerbado, conteúdos sensacionalistas e práticas assistencialistas, tais apresentadores se beneficiam do espaço privilegiado da radiodifusão para fins estritamente privados: sua ascensão política. Nilvan não é o primeiro a aproveitar este trampolim e não será o último.

No entanto, o candidato tem sido questionado após pautar sua campanha vendendo a si mesmo como um quadro de renovação e, agora, não demonstrar constrangimento em dar as mãos a figuras que representam o que há de mais arcaico na política da região.

Extrema-direita

No primeiro turno da eleição em João Pessoa, Nilvan disputou parcela do voto bolsonarista com o delegado Wallber Virgolino (Patriotas), que acabou em quarto colocado com 13,92%.

“Não tem como fazer qualquer tipo de observação que não seja de apontamento que a política de Bolsonaro está certa e vou procurá-lo quando eu for prefeito”, disse Nilvan em entrevista ainda no 1º turno.

O vice de Nilvan Ferreira é o major do Exército Eduardo Milanez. Nas redes sociais, o militar se declara “Bolsonarista, Cristão, Conservador, Casado e Pai de menino”.

Amigo pessoal de Wallber e denunciado por invadir hospitais na Paraíba durante a pandemia do coronavírus, o deputado Cabo Gilberto foi um dos primeiros a manifestar apoio a Nilvan. “Com muita alegria que recebi o anúncio do apoio de Cabo Gilberto. Estabelecemos uma aliança importante”, comemorou o candidato do MDB.

Leila Fonseca, vice de Wallber, foi anunciada pela campanha de Nilvan como uma ‘adesão de peso’ neste segundo turno. “Eu sou conservadora e de direita e vou lutar pela família, pelos valores cristãos e em defesa dos que precisam”, declarou ela.

Rayssa Fonseca, filha de Leila, foi além e chegou a cometer uma gafe em seu comunicado de apoio a Nilvan: “Em 2001, no atentado contra as torres gêmeas, um dos aviões não foi derrubado porque os passageiros decidiram intervir contra os terroristas. Moral da história: não fazer nada pode ser fatal. Contra comunistas e toda a esquerda, voto Nilvan Ferreira”. Na realidade, o quarto avião dos ataques de 11 de setembro caiu na Pensilvânia depois que os passageiros tentaram retomar o controle da aeronave. Não houve sobreviventes.

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Cabo Gilberto, Leila Fonseca e Wallber Virgolino. Apenas o último declarou ‘neutralidade’ no segundo turno (divulgação)

Nilvan conta ainda com o apoio de Valdiney Veloso Gouveia, recém-nomeado Reitor da Universidade Federal da Paraíba pelo presidente Jair Bolsonaro. Por ter ficado em último lugar na eleição da UFPB com apenas 5,35% dos votos, Valdiney é classificado como um ‘interventor’ pela comunidade acadêmica.

Missão 2022

A aglutinação das antigas oligarquias e da extrema-direita em torno do nome de Nilvan Ferreira tem o ano de 2022 como pano de fundo. No plano estadual, a eleição do apresentador em João Pessoa concluiria o arranjo que permitiria a Cássio Cunha Lima lançar-se governador ou indicar um candidato subordinado a ele.

Com as prefeituras de Campina Grande e João Pessoa, a família Cunha Lima sairia fortalecida para enfrentar em 2022 o atual governador João Azevedo (Cidadania). O candidato Cícero Lucena (PP), apoiado por João, foi o mais votado no primeiro turno da eleição de domingo na capital.

No plano nacional, estaria também consolidado o apoio à reeleição de Bolsonaro à Presidência da República e garantido o seu palanque em João Pessoa.

Apresentador Nilvan Ferreira é admirador do presidente Jair Bolsonaro

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